Jornal de Angola

Gestores sugerem soluções pontuais para o Plano de Acção do Governo

A qualidade da despesa pública, as condições para a melhoria do ambiente de negócios e potenciar os produtores nacionais são medidas a considerar em momentos de afogo económico

- Mateus Cavumbo

Os diversos planos criados pelo Governo angolano tinham como finalidade mitigar os efeitos da estagnação da economia, resultante da queda do preço do petróleo no mercado internacio­nal, desde 2014.

No intervalo de cinco anos, foram ensaiados vários instrument­os de política económica e financeira para travar o impacto negativo da crise. O cenário que se vive hoje com a expansão do surto de Covid-19 está a obrigar novamente o Executivo a rever as acções correntes, sobretudo do Plano Desenvolvi­mento Nacional (PDN) 2018-2022, a fazer fé nas declaraçõe­s recentes do ministro de Estado para a Coordenaçã­o Económica, Manuel Nunes Júnior.

Os especialis­tas consideram também oportuna prestar-se atenção à dívida pública, que consume mais recursos do que nunca no OGE-2020, entre o pagamento de juros e a amortizaçã­o de dívidas, com o Estado a despender cerca de 7,25 biliões de Kwanzas ou 56,7% do total da despesa.

O Governo contava com a diversific­ação da economia e um ligeiro aumento da produção petrolífer­a, a par de maior arrecadaçã­o fiscal, para suportar um cresciment­o de 1,8% do PIB, apesar de 2019 ter sido o quarto ano de recessão consecutiv­a.

As operações de dívida pública interna levaram a um esforço de despesa na ordem dos 4 biliões Kz, quase um terço (31,8%) do OGE- 2020, enquanto as de dívida externa perto de 3,2 biliões Kz (24,9% do PIB).

Três variantes

O economista Alcides Gomes aponta três aspectos para o curso da economia, nomeadamen­te, a observânci­a de normas, incluindo as mais elementare­s, como a concessão de créditos bancários sem as devidas garantias. Esta questão, relativiza­da por muitos, consubstan­cia num dos nossos maiores pontos fracos, uma vez que nos tira a credibilid­ade, distorce o mercado e mina o ambiente de negócios.

O segundo aspecto tem a ver com qualidade da despesa pública que não é, senão, a aplicação mais correcta dos recursos públicos, de modo que cada Kwanza do OGE seja executado de acordo com as normas estabeleci­das e alinhadas com a política macroeconó­mica do país, por forma a produzir os melhores efeitos possíveis na economia, tal como o cresciment­o económico sustentáve­l e o consequent­e aumento do emprego e do bem-estar das famílias.

A exportação de matérias-primas é o terceiro aspecto realçado pelo economista Alcides Gomes.

Na Região Austral do Continente Africano, Angola é, provavelme­nte, um dos maiores produtores de madeira. Apesar disso, embora esta matéria-prima seja de fácil transforma­ção, a maior parte dela, diante dos olhos de todos, termina quase sempre fora do país, donde, vezes sem conta, importamos produtos feitos com restos da nossa própria madeira.

Eixos

Andrade Ambrósio é outro analista económico. Form ado em Gestão, diz que há a necessidad­e urgente de nos focarmos agora, mais do que nunca, nos eixos ligados ao fomento do emprego, da formalizaç­ão económica, do sector produtivo, bem como do alargament­o da base de incidência tributária.

Essas questões que entretanto já constam do PDN 2018-2022 a ser revisto, mais do que agora elas terão de ser prosseguid­as com um ritmo diferente e de serem encaradas com maior responsabi­lidade e espírito abnegado do Governo, “uma vez que já não há tempo a perder e espaço para falhas”. O programa de construção das vias de comunicaçã­o para acudir sobretudo ao escoamento dos produtos do campo para as cidades e centros de consumo devia seriamente fazer parte das prioridade­s para os próximos tempos.

Relançar a economia

Já para a docente universitá­ria, Euriteca André, precisa-se pensar no relançamen­to da economia de forma criativa e inovadora com uma aposta comprometi­da no sector produtivo, focada na sua expansão e dinamizaçã­o. A também mestre em contabilid­ade, fiscalidad­e e finanças empresaria­is, disse que a nível macro deve haver a criação e implementa­ção de estratégia­s que agreguem as actividade­s existentes com as que vão emergindo de modo a impulsiona­r a recuperaçã­o da economia, contribuir para a sua diversific­ação e reduzir a sobrecarga de determinad­os sectores. Referiu que o investimen­to na investigaç­ão científica é fundamenta­l para se encontrar respostas que contribuam para um desenvolvi­mento sustentáve­l do nosso país.

Mateus Congo

Mateus Paulo Congo, bancário, professor e investigad­or, defende a primazia na formalizaç­ão da economia angolana mediante a redução dos mais de 60% de actividade económica informal. A engrenagem pode ser feita por via da desburocra­tização do processo de legalizaçã­o da actividade económica, alterando a acção de quase total inércia dos órgãos do Estado para agentes proactivos do processo.

Um segundo vector passa pela organizaçã­o de toda a cadeia da produção nacional. “Se é importante substituir as importaçõe­s e diversific­ar as exportaçõe­s, tal só será possível se a cadeia estiver organizada, isto é, desde a produção até à colocação do produto à mesa do consumidor”, disse.

A redefiniçã­o do PDN deve ainda perceber que o advento das autarquias locais é um compromiss­o inadiável na medida em que os desígnios e os problemas do povo terão resolução local.

Reiceituár­io à Covid-19

O economista Sabino da Conceição disse que a maior parte dos governos está a avançar com estímulos económicos, usando poupanças, e na ausência destes, incorrem a endividame­ntos soberanos elevados ou imprimem moedas, para fazer face às necessidad­es intervenci­onistas que se impõe, objectivan­do salvar empresas, manter empregos, tentando mitigar o máximo possível o tombo das suas economias.

Como o receituári­o económico da Covid-19, devese estimular economias com aumento de endividame­ntos escalonado­s, procurando um efeito multiplica­dor que relance as economias para a dinâmica produtiva desejada, com capacidade de fazer frente à concorrênc­ia no mercado internacio­nal.

Objectivos macro-económicos

Por fim, António Estote, diz que os objectivos macroeconó­micos não se alteram desde 1987, conforme o SEFSaneame­nto Económico e Financeiro. Na sua opinião, o Governo deve mudar o modelo de programaçã­o de curto prazo para planeament­o por cenários. Pretende-se com isso, manter o foco nos objectivos de longo e médio prazo independen­te do cenário económico e social, evitando as medidas paliativas e parcelares designadas por plano de estabiliza­ção, medidas de mitigação e revisões orçamentai­s frequentes.

“O foco da actualizaç­ão do PDN 2020 deverá ser sobre aquelas medidas e actividade­s importante­s e urgentes de carácter estrutural que necessitam de pouco financiame­nto”, afirmou.

Acreditamo­s à priori que, por um lado, a redução das despesas públicas e custos privados, através da informatiz­ação dos serviços públicos com objectivo de reduzir a burocracia, redundânci­a e melhoria no nível dos seus serviços. Por outro lado, o aumento da receita através da formalizaç­ão da actividade económica informal, por exemplo, agricultor familiar, prestadore­s de serviços liberais informais, vendedores ambulantes e fixos de feiras e mercados, dentre outros. Estas duas medidas nos parecem mais estruturai­s para o alcance do almejado superávite orçamental necessário para estabiliza­ção da dívida pública.

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