Antes da vacina, anticorpos podem ser a solução
Cientistas esperam que os anticorpos dos lamas possam vir a ser usados como tratamento profiláctico para a Covid-19, depois de já se terem mostrado eficazes no MERS-CoV e Sars-CoV-1. O artigo é do Diário de Notícias
Será do mundo animal, a origem do Sars-CoV-2, que virá a resposta para o neutralizar? Os especialistas acreditam que sim e que a cura, ou pelo menos um tratamento que trave a doença, possa estar escondida nos especiais anticorpos dos lamas. Estes animais de olhar doce têm conseguido neutralizar em laboratório a Covid-19, e outras infecções, e é para eles que os cientistas focam agora a sua atenção.
Pode este animal, nomeadamente uma cobaia de quatro anos chamada Winter, tornar-se a chave do tratamento para uma pandemia que já infectou mais de 3,7 milhões de pessoas em todo o mundo?
O estudo surge publicado na revista Cell Tuesday e é assinado por uma equipa internacional de cientistas, que descobriram que os anticorpos encontrados no sangue dos lamas foram capazes de evitar uma infecção por Covid-19.
Mas o que têm os lamas de tão especial? Anticorpos pequenos, que se conseguem ligar a diferentes partes do vírus mais facilmente. “Este é um dos primeiros anticorpos conhecidos por ser capaz de neutralizar o SARS-CoV2”, disse Jason McLellan, da Universidade do Texas, em Austin, e co-autor do estudo, em comunicado.
A investigação sobre os especiais anticorpos dos lamas não é nova. Há quatro anos que os cientistas os estudam e já tinham testado Winter, quando o lama tinha apenas nove meses, descobrindo que os seus anticorpos conseguiam neutralizar os vírus SARSCoV-1 e MERS-CoV por um período de seis semanas. Os anticorpos de Winter - que agora tem quatro anos - também eliminaram o SARSCoV-2, o vírus que causa a Covid-19. O The New York Times recorda como os anticorpos de lamas foram usados no passado para encontrar terapias para o vírus HIV e influenza, onde ajudaram a descobrir terapias promissoras.
Os seres humanos produzem apenas um tipo de anticorpos, composto por dois tipos de cadeias de proteínas - pesadas e leves que juntas criam uma forma - “Y”. As proteínas da cadeia pesada abrangem todo o “Y”, enquanto as proteínas da cadeia leve tocam apenas os braços do “Y”, explica o New York Times.
Os lamas, ao contrário dos humanos, têm dois tipos de anticorpos. Um desses anticorpos é semelhante em tamanho e constituição aos anticorpos humanos. Mas o outro é muito menor; é apenas cerca de 25 por cento do tamanho de anticorpos humanos.
“A ligação deste anticorpo (ao coronavírus) é capaz de impedir a ligação e a entrada (do vírus), o que o neutraliza efectivamente”, explica Daniel Wrapp, Ph.D. em Dartmouth, co-autor do estudo.
Estátua para Winter
Os anticorpos dos lamas também são facilmente manipulados, acrescenta. Xavier Saelens, virologista molecular da Universidade de Ghent, na Bélgica - país onde vive o lama Winter e autor do novo estudo.
Então, estes anticorpos podem ser ligados ou fundidos com outros anticorpos, incluindo anticorpos humanos, e permanecerão estáveis, apesar dessas manipulações.
Os cientistas esperam que os anticorpos dos lamas possam vir a ser usados como um tratamento profiláctico para a Covid-19, para profissionais de saúde, por exemplo. Embora a protecção do tratamento seja imediata, os efeitos não serão permanentes, durando apenas um mês ou dois sem injecções adicionais.
Faltarão, entretanto, meses para que esta abordagem profiláctica possa ser usada, pois são ainda necessários estudos para clarificar a segurança da injecção de anticorpos de um lama em seres humanos.
“Ainda há muito trabalho a ser feito”, disse Saelens. “Se funcionar, o lama Winter merece uma estátua”, disse o virologista molecular e autor do novo estudo.