Jornal de Angola

Jimmy Rufino in memorian

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O poeta Jimmy Rufino sucumbiu, na última terça-feira, em Luanda, a um cancro que o apoquentav­a há alguns anos. No final do ano passado chegou a registar melhorias no seu estado de saúde, depois da ajuda solidária dos seus colegas da União dos Escritores Angolanos, que lhe permitiu ser evacuado para assistênci­a médica no exterior do país. Mas nos últimos meses, já em Luanda, o seu estado de saúde piorou inesperada­mente. Foi a enterrar na sextafeira, no cemitério da Sant’Ana. Jimmy Rufino deixa uma obra diversific­ada, a maior parte inédita. Publicou dois livros de poesia: “Kianda Kiá Ngola” (Chá de Caxinde, 2006) e “Egos da Karne” (UEA, 2014). Publicamos a seguir alguns poemas, colhidos de ambos os poemários, em jeito de homenagem à memória do poeta que tão prematuram­ente nos deixou

MENHA

Água...

Orgasma a húmida sede Do sol como nós

Molha o lábio da voz Bebe o pão da paz

Água...

Na água da poesia

Sem voz na foz igual

Vive o leito das fomes Fecunda a sede do grito Suculento da mão suada.

Água...

Sai pelo dia desaguado De santas águas bentas Benzendo as mães santas Dum luto assim. Líquido.

Água...

Rega a semente da terra Como o hálito ancião De um dia despido Da chuva que de sábia luz

Amores floriu...

MAIADO

Tenho cincostões pedrados

No apito bazeza do kangundo

Invento kimbembas de madiabos Xinguiland­o na esteira do monangambé Viro bucho virado. Sonho a Rebita De entreluada­s madrugas

A acoitar kuêrras e kikemas Se bangando nos mujimbos da zula Onde se lanchonam sarrabulho­s

Que o Závua ingredient­ou

De xapangas muzukazuka­s.

Tenho cincostões carecas

No debaixo da ponda do mar a bugiar Kapretetes da banga paiada

Nas papaias do pão kamabuim

E as sereia da kunhunga

Se boatar antigos pai das mentira Praguejoso­s na diguêza banal

Das nossas fomes kamabuins.

O RIO DA SAUDADE

Ao

Ti Raúl David.

Do vento da ganda

Ao tambor do chongorói

A kapunda grande do sonho Irmanizou a promessa do kurikutela­s Que canoniza a jura da mãe

Irrigando cavacos de sóbrias luas Ente pai nossos de chuvados

Dias d’ocultas mentiras

Seduzindo a anhara ingénua Ajoelhada na paz madrasta

Dos anjos da aldeia órfã

Que te guarda o lugar

De pai guardião dos cânticos Sapientes do dia que alimenta A anhara do teu olhar solene

Ao pôr do sol sorrindo

O olhar daquela saudade ombaka Que o rio nos espelha

As mãos da dor em vigília

FALSETE DE BAMBU

Kimbando Da Mutamba Despida Mukôko de Palmeira Anciã

Assina a Sina da Esteira Adia a Mutamba da Kalema Saboreia a Muamba e o Maruvo Do Sonho Banhando de Ecos Nganza o Ngando do Dia Adia a Tarimba da Mão Nina a Menina Luanda

E o Kazumbi da Lua se Foi Com o Kitombe da Manhã Apaixonand­o Tetêmbuas

Com Bué De Verdade Nos Dikanus à Nduta Dos kibeus De verona...

SEM RAÇA

Este dia Sem Lógica Na Periferia Deste Sorriso Está Na misoginia de Paz Lacrada pela Mão do Beijo Divagando-se Honrados Enganos

Absolvidos Por Uma Razão Xinguilada No Secreto Arco-Íris De Um Mar Com a Bensanta Miragem Da Nudez Amando

A Sua Sombra Sem Raças Entre Os Ecuménicos Sorrisos Eróticos Dibabelos

Duma Noite Adúltera Afagando-se

Com A Morte

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