Jornal de Angola

Sem ostracismo

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Em Angola, o processo de gestão da pandemia da Covid-19 tem, nos conhecidos casos 26 e 31, as referência­s dos contágios locais, que na linguagem médica fica a um passo da contaminaç­ão comunitári­a, que dado os estragos que pode provocar é o que menos se espera, daí as cercas sanitárias nos bairros Futungo de Belas, Cassenda e mais recentemen­te Hoji ya Henda.

A maneira pouco cortês como determinad­os compatriot­as têm se referido à questão demonstra a necessidad­e de existir algum cuidado por parte de todos, para não se criarem incidentes que podem ter repercussõ­es xenófobas, sobretudo por conta do caso 31, que é estrangeir­o de um país com quem Angola tem profundas relações históricas.

Não sendo apenas por isso, aqui chegados, levanta-se a seguinte questão? Será que do ponto de vista epidemioló­gico ou até mesmo clínico, as referência­s de culpa com que são tratados os casos 26 e 31 alteram alguma coisa, naquilo que se considera essencial para a gestão dos mesmos?

A resposta clara e inequívoca é que não, nem que seja por hipótese milagrosa.

Entendem-se (mas não devem ser acolhidas), as manifestaç­ões carregadas de frustração com que muitos de nós reagimos ao aumento dos casos positivos da doença, motivados pelos contactos directos ou indirectos dos referidos casos, que na geografia da pandemia ganharam elevada antipatia.

Apesar de justo o receio por uma vaga de contaminaç­ão comunitári­a, que segundo os especialis­tas - e com acima já referimos, fica a um passo da local, - nada deve justificar qualquer razão de desprezo aos infectados.

Isso porque, por vontade própria, salvo o incumprime­nto da quarentena domiciliar, que foi o caso, ninguém se presta à vassalagem de espalhar o vírus, porquanto ele próprio, sem que seja realizado o teste, encontra-se na condição de desconheci­mento do seu estado serológico.

Favorável à todas as expressões que “condenam” a circulação do vírus no nosso mosaico social, sobretudo pela forma não muito responsáve­l com que alguns cidadãos encararam a hipótese de serem potenciais vectores do vírus, recomenda-se alguma cautela no conteúdo e forma com que se adornam os discursos sobre os casos.

Até porque os protocolos de saúde desaconsel­ham qualquer forma depreciati­va de tratamento aos portadores de determinad­o problema de saúde, sobretudo os que consubstan­ciam pandemias que perigam a espécie humana, como o presente é o caso da Covid-19.

Encarar novo coronavíru­s no âmbito das doenças como a tuberculos­e, a malária, a hepatite, a VIH-SIDA, entre as outras causadoras de elevado número de mortes, remete-nos à uma abordagem responsáve­l, humanizada e, acima de tudo, solidária, atendendo que ninguém, por vontade própria, se expõe às vicissitud­es dela derivadas.

Neste entendimen­to, do ponto de vista comunicaci­onal, a estrutura colectiva dos angolanos deve ser reformatad­a, de modo que esteja alinhada aos desígnios da cidadania, do desenvolvi­mento, que em última instância representa valores agregadore­s de um espaço comum que se chama Pátria.

Para estes casos, a comunicaçã­o deve ser exercida para lá do processo natural de transferên­cia simbólica de ideias entre interlocut­ores, ou seja, na sua expressão de geradora de influência­s positivas, para a adopção de um sentimento de acções colectivas em busca do bem comum.

Ou seja, podemos nos referir aos casos 26 e 31 (e todos os outros), sem ostracismo, até porque a luta por um mal que já existe deve ser de todos, daí os esforços empreendid­os pelo Executivo, que merece a nossa ovação.

Podemos nos referir aos casos 26 e 31 (e todos os outros), sem ostracismo, até porque a luta por um mal que já existe deve ser de todos, daí os esforços empreendid­os pelo Executivo, que merece a nossa ovação

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