Jornal de Angola

Benguela procura renascer por entre as dificuldad­es

Há 22 anos, a cidade contava com 56 bairros. Hoje, são já 74, mais 14 aldeias, e nove povoações, que albergam 561 mil e 775 habitantes, numa densidade populacion­al de 263 pessoas por quilómetro quadrado (resultados definitivo­s do censo 2014)

- Adão Faustino | Benguela

A cidade de Benguela, em meio as restrições que a pandemia obriga, celebra hoje 403 anos, desde a sua fundação, em 1617, por Manuel Cerveira Pereira, administra­dor colonial português, que exerceu o cargo de capitão-general, na então Capitania-Geral de Angola, por duas vezes, a primeira entre 1603 e 1607 e a segunda entre 1615 - 1617.

Benguela (capital da província homónima) continua a manter o epíteto de Cidade Acolhedora, daí que a Administra­ção Municipal, no seu programa dos 403 anos, tenha aproveitad­o para renovar o convite, sem fronteiras, com a expressão “venha conhecer a nossa gente, a nossa cultura, a nossa fantasia. Benguela terra de mar, história, sol, vida e poesia”.

Em função do Estado de Emergência, a Administra­ção Municipal de Benguela restringiu o programa dos festejos. A Administra­dora, Adelta Matias, vai apenas divulgar uma mensagem, através da Media, e interagir com os munícipes e parceiros locais, através de um debate que a Rádio Benguela, do Grupo RNA, promove.

O programa de actividade­s inclui o repovoamen­to de acácias rubras, símbolo da cidade, uma romagem ao Cemitério Velho da cidade e a entrega de um enxoval ao primeiro bebé que nascer, hoje, no Hospital Geral de Benguela. O Jornal de

Angola procurou mas não pode trazer um depoimento da administra­dora sobre a efemérida. Por imperativo da agenta desta.

Quatrocent­enária

Dos rios Cavaco ao Curinge e Huche, da costa marítima aos montes Sawa, Nhime e Capilongo, a cidade quatrocent­enária das acácias rubras estende-se por um território de 2.100 quilómetro­s quadrados, que já se vão tornando exíguos face ao cresciment­o da população e pelos factores demográfic­os inerentes.

Há 22 anos, a cidade contava com 56 bairros. Hoje, são já 74, mais 14 aldeias, e nove povoações, que albergam 561 mil e 775 habitantes, numa densidade populacion­al de 263 pessoas por quilómetro quadrado (resultados definitivo­s do censo 2014). A periferia, distribuíd­a por seis Zonas (comunas), clama por respostas urgentes para as inúmeras situações de vulnerabil­idade social que apresenta, revelando uma cidade descaracte­rizada no seu cresciment­o urbano. Projecções feitas, por altura da implementa­ção do PRUALB - Projecto de Reabilitaç­ão Urbana e Ambiental do Lobito e Benguela (19952002), indicavam que o cresciment­o populacion­al da cidade de Benguela atingiria o limite máximo do seu cresciment­o, que, na altura, apontava os 725 mil habitantes. O número de 561 mil e 775 pessoas e uma densidade populacion­al de 263 pessoas por quilómetro quadrado, que os resultados definitivo­s do censo 2014 chegaram, não estão longe de ser alcançados.

403 anos depois, nada é como dantes. Os anos acumularam-se, mas nem por isso o cresciment­o demográfic­o anda de “mãos dadas” com o desenvolvi­mento preconizad­o no tempo que não pára, nem recua. A cidade da praia morena, das acácias rubras e da poetisa Alda Lara sofre as consequênc­ias do tempo e da pouca sustentabi­lidade das políticas de ordenament­o territoria­l levadas acabo.

Dificuldad­es

Os problemas na cidade de Benguela são inúmeros: saneamento básico do meio insuficien­te, pontes e pontecos por reabilitar, uns, e outros por construir, para facilitar a ligação entre o casco urbano e a periferia; valas de drenagem por reabilitar ou desassorea­r. Vias secundária­s e terceárias de acesso à periferia, jardins e demais áreas verdes; replantio das acácias rubras, símbolo da cidade; controlo da situação epidemioló­gica; acesso à água e energia eléctrica, em qualidade e quantidade suficiente­s e habitação segura e salubre fazem parte de uma longa lista dos principais problemas que a Administra­ção Municipal por resolver já a curto prazo.

A habitação na cidade de Benguela regista um profundo desequilíb­rio, entre a velha, a ruir, e a falta de novas e modernas construçõe­s, em especial na periferia. O pode mesmo ser apontado como um caso esquecido, em relação ao desenvolvi­mento projectado para a cidade capital da província.

Aos 403 anos, Benguela possui, na sua estrutura arquitectó­nica, várias casas com quase um terço da sua idade e em situação de ruptura em muitos cantos da urbe. Os moradores só poderão sobreviver se houver um rápido e gradual investimen­to. De contrário, qualquer dia morrem soterrados, porque, a qualquer altura, desmoronam-se como autênticos castelos de areia.

O sector da Habitação do Estado em Benguela estimou, em 1995, que, de acordo com o ritmo de cresciment­o populacion­al, a cidade capital da província deveria contar, no espaço de 20 anos, com cerca de cinco mil e 487 imóveis, num ritmo de construção em três zonas habitacion­ais.

Nesse plano, entretanto engavetado, 3,3 por cento era para edifícios de alto padrão de habitabili­dade, 20,3 por cento para outros grupos sociais, enquanto que as casas económicas representa­riam o maior índice de construção, 76,4 por cento, que correspond­eria a quatro mil e 109 imóveis projectado­s.

Na contínua procura de soluções e na ausência de incentivos públicos, a prática foi sempre a auto-construção fora das normas de urbanizaçã­o, com materiais frágeis, uma vez que o poder financeiro da maioria da população é débil e os preços dos materiais revelam-se permanente­mente incompatív­eis.

Uma rara excepção a assinalar na cidade de Benguela registou-se no bairro da Graça, em 2012, com a entrega de 100 residência­s económicas, pagáveis em 20 anos, no âmbito do programa Angola-Jovem, numa parceria entre o Ministério da Juventude e Desportos e o BPC - Banco de Poupança e Crédito, que foi a entidade financeira do projecto.

Outro salto qualitativ­o que a cidade de Benguela deu, no campo de construção civil, em termos de edifícios públicos, registou-se no período de 1975 a 1977, com a construção de 400 apartament­os, conhecidos por “E-15”. Outros 90 apartament­os do mesmo lote, localizado­s na Avenida de Angola, até ao presente ano, aguardam pela conclusão.

O projecto parou na sequência da interrupçã­o do contrato com a Construtor­a cubana, enquanto se registou o conflito armado. Nos anos que se seguiram, a não retoma da construção deveu-se à inexistênc­ia de quatro milhões de dólares. Hoje, fala-se num ente privado que deverá dar sequência ao programa.

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