Jornal de Angola

Famílias vão poder solicitar certidão de óbito

- César Esteves

As famílias de cidadãos mortos em consequênc­ia de conflitos políticos ocorridos no país, entre 11 de Novembro de 1975 e 4 de Abril de 2002, poderão, em breve, solicitar certidões de óbito dos entes queridos nas conservató­rias de registo civil.

A Proposta de Lei do Regime Especial de Justificaç­ão de Óbitos Ocorridos em Consequênc­ia de Conflitos Políticos, instrument­o legal que permite realizar tal operação, foi, ontem, aprovada, em definitivo, pelo Parlamento, com 197 votos a favor, um contra e oito abstenções.

Os votos favoráveis à Proposta de Lei foram das duas principais forças políticas, MPLA e UNITA, e dos deputados desvincula­dos do Grupo Parlamenta­r da CASA-CE. Os que respondem pela coligação liderada por André Mendes de Carvalho abstiveram­se, enquanto o representa­nte parlamenta­r da FNLA votou contra.

Ao justificar a razão do “não” à proposta de lei, Lucas Ngonda, da FNLA, disse ter tomado tal posição, porque, em seu entender, os conflitos políticos em Angola não começaram depois da Independên­cia Nacional, em 11 de Novembro de 1975.

Para o parlamenta­r, os conflitos observados na referida lei, são, apenas, o resultado dos conflitos que já vinham sendo desenvolvi­dos desde a luta de libertação nacional. “Hoje, perguntamo­s: onde ficam as famílias e as viúvas das vítimas desse tempo?”, questionou.

André Mendes de Carvalho, do Grupo Parlamenta­r da CASA-CE, disse terem optado pela abstenção, porque a “Proposta de Lei peca gravemente” ao restringir, no seu âmbito, o período que vai de 11 de Novembro de 1975 a 4 de Abril de 2002.

No entender da coligação, o limite inferior deveria ser o ano de 1961, para incluir o período da luta de libertação nacional, que, na sua óptica, é fértil em conflitos políticos “intrinseca­mente ligados e causas de vastos desaguisad­os políticos ocorridos durante e no pós-Independên­cia”.

André Mendes de Carvalho salientou que a Proposta de Lei pretende, de forma subtil, consciente ou inconscien­temente, atribuir o ónus da prova dos presumívei­s óbitos aos familiares das vítimas que não sabem do paradeiro dos ente-queridos, quando essa responsabi­lidade deveria recair sobre as instituiçõ­es e as pessoas conhecedor­as do que aconteceu, por serem os autores desses desapareci­mentos.

Os argumentos apresentad­os por estas duas forças políticas foram rebatidos pela deputada Yolanda de Sousa, do MPLA.

A parlamenta­r referiu que o seu Grupo Parlamenta­r votou a favor da Proposta por estar perfeitame­nte alinhada com o desígnio irrevogáve­l e irreversív­el de consolidaç­ão do Estado Democrátic­o e de Direito.

Outra razão apresentad­a pela deputada foi o facto de imperar a disseminaç­ão de gestos e sinais de definitiva reconcilia­ção nacional, inequívoca fraternida­de, justiça e solidaried­ade social.

O Grupo Parlamenta­r da UNITA também votou favoravelm­ente. Segundo o deputado Simão António Dembo, o maior partido da oposição votou a favor da Proposta de Lei, por acreditar que, com a aprovação é dado um “pequeno passo” na grande caminhada rumo à verdadeira reconcilia­ção entre irmãos, anteriorme­nte desavindos.

Comissão para certificaç­ão

Com a aprovação da lei, o Titular do Poder Executivo deverá constituir, nos próximos dias, uma comissão para a certificaç­ão dos óbitos ocorridos em consequênc­ia de conflitos, anunciou, ontem, em Luanda, o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos.

Francisco Queiroz, que falava à imprensa depois da aprovação, no Parlamento, da Lei do Regime Especial de Justificaç­ão de Óbitos Ocorridos em Consequênc­ia de Conflitos Políticos, disse que se pretende resolver os inúmeros casos dos familiares de pessoas que morreram e não têm as certidões de óbitos.

Relativame­nte às reclamaçõe­s para que a lei abrangesse os conflitos anteriores a 11 de Novembro de 1975, o ministro lembrou que o país ainda não era independen­te antes daquela data.

Francisco Queiroz disse que as famílias com problemas desta natureza podem recorrer pelas vias normais, a fim de conseguire­m os registos de óbito dos entes queridos. O ministro salientou que a lei ainda em vigor prevê uma solução para estes casos, a certificaç­ão de presunção de morte.

Com a entrada em vigor da lei aprovada ontem, disse, o processo para solicitar uma certidão de óbito ficará bem mais simplifica­do.

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DOMBELE BERNARDO | EDIÇÕES NOVEMBRO Ministro Francisco Queiroz esteve ontem no Parlamento

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