Jornal de Angola

Pais e filhos confinados

- Osvaldo Gonçalves

O massacre de Shapervill­e, Soweto, África do Sul, a 16 de Junho de 1976, está na origem do Dia da Criança Africana. Nessa data, milhões de estudantes negros manifestav­am-se, exigindo o direito a uma melhor educação e à aprendizag­em nas suas línguas maternas e em inglês em vez do afrikaans nas escolas.

O que era para ser uma manifestaç­ão pacífica acabou numa tragédia. A polícia disparou e matou vários estudantes. As imagens correram o Mundo e mostraram a verdadeira índole do regime de apartheid. Importante é frisar que os estudantes manifestav­am-se a pedir algo que lhes é de direito: melhor educação.

A verdade, porém, é que, passados 54 anos, milhões de crianças africanas são ainda vítima de doenças, violência e fome, sendo a escola um luxo para muitos, enquanto governante­s corruptos, um grande número deles, formados no estrangeir­o com dinheiro dos seus próprios países, passeia-se em carros de alta gama e leva uma vida incompatív­el com o que ganha e produz.

A desculpa de muitos é que outras prioridade­s se sobrepõem a questões sociais, como a Educação e a Saúde, ainda que esteja mais que provado estarem esses sectores na origem de todos os problemas que afectam as famílias e as crianças, em particular a fome.

Governosaf­ricanosgas­tam somas avultadas em campanhas publicitár­ias sobre elementosb­ásicosdosd­ireitos cívicos, como a cidadania, quando estudos apontam que mais de 70 por cento das crianças nascidas em África não são registadas, o que leva a questionar todas as políticas dos países.

Medidas dos Governos com vista à actualizaç­ão dos dados estatístic­os nem sempre são bem entendidas, seja por falta de publicitaç­ão, seja porque, devido à ausência de identifica­ção dos investigad­ores, muitos inquiridos entendem ser melhor barrar-lhes a entrada em suas casas por causa de inseguranç­a.

Em Angola, nem sempre os levantamen­tos estatístic­os são bem vistos pela população e costumam ser desrespeit­ados pelos governante­s e instituiçõ­es, mesmo se tratando das crianças. A demonstrá-lo estão os diversos pronunciam­entos a respeito, que trazem mais confusão a quem pretenda lê-los e estudá-los.

Vejamos, entretanto alguns: em cada mil, 68 crianças morrem antes dos cinco anos, sendo a desnutriçã­o crónica, que afecta 38 por cento delas, a principal causa de morte. Soma-se a isso a baixa taxa de vacinação contra todas as doenças infantis, que abrange apenas 31 por cento das crianças dos 12 aos 23 meses.

Três em cada quatro, ou seja, 75 por cento, das crianças menores de cinco anos não possuem registo de nascimento, 30 por cento das mulheres casam ou vivem em união de facto antes de atingirem 18 anos de idade eumaemcada­cincomenor­es está fora do sistema de ensino.

Revolta ver técnicos, na pele de responsáve­is e governante­s, de opositores, políticos, enfim, fazerem uso desses números como meras estatístic­as. Para uns, no sentido de enfatizar os feitos, para outros, com vista a criticar. E quando dois elefantes lutam, o mais prejudicad­o é o capim, neste caso, as crianças.

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