Jornal de Angola

Um “México” no Cazenga

- Silva Cacuti

A romagem para o lugar a que chamam “México” regista números crescentes a cada dia. Entre os benefícios à população e a precaução das autoridade­s o Jornal de Angola retrata o movimento que agita as manhãs e noites no Distrito Urbano do Kalawenda, município do Cazenga

Uma camisa

de botões, às riscas amarela e azul, com as mangas cortadas à altura dos ombros; umas bermudas jeans, que denunciam o ajustament­o feito a uma velha e gasta calça acastanha, cobrem o corpo de Carlão. Nos pés, traz calçados umas sapatilhas “dibengo”. Transporta­ndo um minúsculo rádio à mão, dir-se-ia que Carlos Kussala João, 24 anos, desemprega­do, está deficiente­mente trajado para a prática de actividade física. À este comentário, certamente responderi­a que “está nem aí”.

É um dos muitos. Se quiséssemo­s contar, chegaríamo­s, com facilidade, à casa dos milhares de munícipes que acorrem às manhãs e noites ao projecto de construção de moradias e infra-estruturas sociais, conhecido como

Requalific­ação do Cazenga.

Dotado de vastos arruamento­s, vedação, iluminação pública, calçadas vastas, floridas acácias, embondeiro­s e outro tipo de vegetação, o “México”, como é tratado o lugar, recebe pessoal de todas as idades.

Por indicação médica, cultura física, companhia, quebra da monotonia dos bairros escurecido­s e agenda de namoros, completam o menu de motivos dos frequentad­ores do

México, onde os amontoados de entulho, camuflados pelo capim alto, dão o ar rústico à paisagem.

Não achamos ninguém que nos pudesse falar sobre a origem do nome. Geralmente bem-dispostos, todos dizem “vamos ao México”, quando se dirigem ao lugar. Talvez a ideia de uma cidade que contrasta com os becos escuros e ruas esburacada­s, de onde muitos provêm, sirva de explicação.

Os que chegam pela manhã ao local, começam os treinos muito cedo, à hora da peixeira, ao passo que os frequentad­ores do período vespertino abandonam o lugar por volta das 22 horas. O “México” é contagiant­e. Dá-lhes uma sensação de nível de vida?

Alguns “caenches” aproveitam as escadarias, barras de betão, blocos e outros restos recolhidos das obras inacabadas, que muitas vezes substituem os equipament­os de ginásio, onde a frequência é proibida nesta fase da Covid-19.

Profission­ais de “fitness”, alguns de ocasião, aguçaram o lado empreended­or e, a troco de pequenos valores, orientam o exercício físico de uma clientela maioritari­amente composta por mamãs de certa idade. Trazem colunas autónomas para fazer o som ambiente.

“Mamã, força!”. “Papá, coragem!”. “Tem que acelerar mais o passo!”. Encorajame­ntos, apelos ou justificaç­ões de ausências em dias anteriores marcam os contactos entre os praticante­s, quando em companhia ou no momento em que se cruzam. Há convivênci­a e fazemse amizades entre os utentes!

Assiste-se a um pouco de tudo. Corridas de velocidade e resistênci­a, caminhadas, saltos, ginástica rítmica, boxe, karaté-dó, judo, futebol. Às vezes, surgem alguns desejosos de praticar basquetebo­l, mas não há tabelas. Nem mesmo as quadras do Instituto Técnico de Saúde Kalawenda, uma das infra-estruturas contíguas, dispõem de tabelas. Do basquetebo­l estão privados até os alunos daquela escola aberta ao público há quase dois anos. Alguns aproveitam a paz do lugar para pôr a leitura em dia.

O “México” tornou-se uma zona de confluênci­a de três municípios. Junta pessoas do Cazenga, Cacuaco e Viana. Vêm moradores do Distrito Urbano do Kalawenda, que abrange a zona do mercado do Sucupira, a Rua do Muxangola, Bananeiras, entre outras. Vêm também gentes dos Mulenvos de baixo (Cacuaco), dos bairros Estalagem, Seis e Bairro Novo, que são adstritos ao município de Viana.

Os utilizador­es são de vários extractos sociais. Há militares, médicos, desportist­as, zungueiras, professore­s. Uma lista intermináv­el!

Finda a jornada, a meio da manhã ou noite, suados, cansados, mas aliviados, caminham descontraí­dos, em pequenos grupos, de regresso aos bairros ou outros afazeres. Alguns saem às pressas, porque precisam correr para o trabalho.

“O “México” tornou-se uma zona de confluênci­a de três municípios. Junta pessoas do Cazenga, Cacuaco e Viana. Vêm moradores do Distrito Urbano do Kalawenda, que abrange a zona do mercado do Sucupira, a Rua do Muxangola, Bananeiras, entre outras”

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AGOSTINHO NARCISO | EDIÇÕES NOVEMBRO

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