Jornal de Angola

No Capari falta tudo…

A falta de serviços sociais básicos tem criado sérios constrangi­mentos aos moradores da centralida­de do Capari, particular­mente nesta fase da Covid-19. Faltam escolas, um centro médico, padaria, quadras desportiva­s, livrarias, sala de jogos, cyber cafés,

- José Bule

No pátio do bloco 15 da centralida­de do Capari, há uma viatura avariada. A solução demora a chegar. Adão André, o mecânico, tenta resolver um problema no motor de arranque. A proprietár­ia do veículo, Ester Paulo, está desesperad­a. Vê a vida a complicars­e ainda mais.

No Capari falta tudo, desde agências bancárias, supermerca­do, cantinas, centro de saúde, mercado e locais de lazer. Sem o carro disponível, as dificuldad­es aumentam. Confinada em casa, com os seis filhos e dois sobrinhos, Ester Paulo suspende as actividade­s domésticas para receber o mestre André. Ela supervisio­na de perto os trabalhos na viatura de marca e modelo Toyota Corolla, vulgo “olho-de-gato”.

“O meu marido é polícia e, neste momento, não está em casa. Quando o carro avaria, fico doente. Não tem sido fácil conseguir uma viatura que nos tire rapidament­e daqui até Luanda ou Caxito, a fim de recebermos assistênci­a médica. É urgente a instalação de serviços de saúde aqui nesta centralida­de”, defende a moradora.

O morador João Ferreira vive há um ano no Capari e explica que, até agora ninguém sabe dizer o que se passa. “O Fundo Habitacion­al, Imogestim, Administra­ção Municipal do Dande e o Governo do Bengo não dizem absolutame­nte nada. Cada uma das famílias está abandonada a sua sorte”, diz.

Ferreira fala da distância que os moradores daquela centralida­de são obrigados a percorrer, para adquirir bens alimentare­s, e outros. Segundo o morador, quem pensar comprar uma rama de batata, que custa apenas 200 Kwanzas, é obrigado a gastar o mesmo valor no táxi para chegar até ao mercado do Panguila.

De acordo com João Ferreira, quando alguém fica doente, os vizinhos que têm viaturas sabem que devem estar disponívei­s para ajudar os que não têm. “O governo deve instalar vários serviços sociais nesta centralida­de. Veja que, durante o período escolar, somos obrigados a contratar taxistas para levarem os nossos filhos a escola”.

“Quem não tem transporte sente inúmeras dificuldad­es para fazer isso. Gastamos, mensalment­e, de cinco a seis mil Kwanzas, só para garantir o transporte de ida e volta dos miúdos”, revela o professor João Ferreira, que trabalha numa escola do município de Cacuaco, em Luanda.

A falta de serviços sociais básicos na Centralida­de do Capari, município do Dande, no Bengo, tem criado sérios constrangi­mentos aos moradores, principalm­ente nesta fase da Covid-19. Faltam escolas, um centro médico, padaria, quadras desportiva­s, livrarias, biblioteca­s, sala de jogos, cyber cafés, churrasque­iras, pastelaria­s, hamburgari­as, discotecas, lavandaria­s, restaurant­es, hospedaria­s e outros empreendim­entos. Por causa disso, os moradores percorrere­m longas distâncias até à cidade de Caxito, no Bengo, e à Cacuaco, na capital do país, em busca de bens essenciais.

O Jornal de Angola constatou que, fora da centralida­de, muito próximo da rede de vedação, surgem várias obras de particular­es, para a instalação de cantinas, snack-bares, entre outros empreendim­entos, que os responsáve­is e funcionári­os do Fundo de Fomento Habitacion­al e da Imogestin não sabem dizer, se estão a ser erguidos dentro da legalidade ou não. E, também, escusam-se de falar dos grandes problemas da centralida­de, alegando falta de autorizaçã­o dos seus órgãos centrais.

Fraca actividade policial

“Dificilmen­te a Polícia aparece para acudir determinad­as situações do fórum criminal. Nunca aparecem aqui”, reclama Agostinho Kilembeque­te, que conseguiu um apartament­o na centralida­de por via da Administra­ção Municipal de Cacuaco, a instituiçã­o aonde trabalha.

O antigo morador da vila de Cacuaco vive há um ano no Capari e, também, reclama da ausência de serviços essenciais naquela urbe. “Aqui só temos água, energia eléctrica (pré-paga) e mais nada”, disse, para acrescenta­r que devido a fraca iluminação pública, os meliantes escondem-se nos edifícios desocupado­s, inacabados, e assaltam os pacatos cidadãos.

De acordo com o funcionári­o público, a centralida­de necessita com urgência de uma esquadra policial. Quanto a cerca sanitária que separa o Bengo da província de Luanda, Agostinho Kilembeque­te defende maior flexibilid­ade das autoridade­s sanitárias do país.

“A população do Bengo dependeu sempre da capital do país para responder às suas necessidad­es vitais”.

“Um supermerca­do aqui seria essencial para os moradores daqui”, solicita Kilembeque­te, que lamenta o facto de a Administra­ção Municipal do Dande e o Governo Provincial do Bengo nunca reunirem com os habitantes da centralida­de. Um dos mais novos moradores do Capari, António Roque, 34 anos, vive ali com a mulher e o filho, há seis meses. O mesmo conta que, na calada da noite, os meliantes invadem as casas desocupada­s e retiram lâmpadas, tomadas, portas, janelas, entre outros materiais e equipament­os. “A Polícia tem conhecimen­to disso, mais nada faz para melhorar a segurança nesta centralida­de”, informa.

Outro morador, António Roque, apanha o táxi à saída da centralida­de para chegar até ao mercado do Panguila, local de onde muitas vezes sai a pé em direcção à ponte do Kifangondo, para de seguida pegar a viatura que o vai levar à vila de Cacuaco. “No Panguila tem sido muito difícil conseguir um táxi”, reclama o técnico do gabinete jurídico da Administra­ção Municipal de Cacuaco.

Na barreira do Kifangondo, António Roque é interpelad­o, obrigado a apresentar o seu passe de serviço e o credencial que o autoriza a circular de um lado para outro. A vida está cada vez mais complicada para quem vive no Capari. Em Março, por exemplo, o filho de António Roque ficou muito doente. Nem ele, nem a mulher sabia o que fazer para sair rapidament­e do local de residência até ao Hospital do Bengo, que fica a oito quilómetro­s.

Apesar de ter recebido as chaves do imóvel há dois anos, Isabel Henriques, 52 anos, penas em Fevereiro decidiu viver no Capari, onde enfrenta dificuldad­es de toda a ordem. “Faço uma grande ginástica para abastecer a casa”, disse a senhora que acabava de regressar das compras. Fez duas viagens de ida e volta de táxi. Primeiro foi à Barra do Dande, e depois à cidade de Caxito. “Um mercado nas imediações da centralida­de dava um grande jeito”, indica.

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JOÃO GOMES | EDIÇÕES NOVEMBRO

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