Jornal de Angola

Consumidor­es entre o desejo de parar e o vício de consumir

Vários utilizador­es de drogas no país travam uma batalha diária entre o desejo de parar e o vício de consumir. Um jovem que tinha tudo para dar certo, estudos, amigos e harmonia familiar, transformo­u a sua vida num desastre por causa das drogas

- Adelina Inácio

José Joel da Silva diz que não deseja para ninguém o que ele passou por causa das drogas. “É uma vida miserável. Chegas ao ponto de vender tudo o que tens para comprar drogas”, disse.

José Joel da Silva tem actualment­e 25 anos e entrou no mundo das drogas aos 16, por influência de amigos e depois de ter perdido alguém que muito amava, o avô. “Comecei a fumar liamba e depois fui experiment­ar outras substância­s mais pesadas, como a cocaína e a heroína”, disse. Dinheiro não era a única coisa que roubava para alimentar o vicio. Valia tudo .

Rejeição

O usuário das drogas é quase sempre rejeitado pela família e amigos. Foi o caso de Joel, que chegou a perder até a namorada, devido ao vício. A Joel, que sonha voltar para casa e receber o carinho da família, restou apenas a amizade dos outros companheir­os na REMAR, centro que trata de dependente de drogas.

José Joel, que está na REMAR há um ano e dois meses, aprendeu a lidar com a Bíblia, coisa que aqui fora não fazia, e aprendeu algumas profissões como carpintari­a e mecânica.

Ele garante que já está curado.

“Estou curado. Sinto-me bem, não me sinto mais aflito. A minha família deu-me uma segunda oportunida­de e não penso mais voltar ao mundo das drogas. Espero, também, reconquist­ar a minha namorada, que me deixou por causa do vício das drogas. Penso sair daqui, pedir desculpas e voltar para ela”, acredita.

Perder o amor das filhas

José Jerónimo, 38 anos, entrou no mundo das drogas também por influência de amigos. Disse que, para começar no vício, foi fácil, mas para sair é uma luta.

“Graças a Deus, na REMAR consegui sair do vício. Estou há dois anos sem consumir drogas. Temos tido tentações, não estamos isentos das situações, mas temos que saber o que queremos”, disse José Jerónimo, que lamenta o facto de ter perdido o amor das duas filhas e da mulher.

Ele reconhece que a droga destrói a vida do ser humano.

“A minha família já tentou levar-me para fazer tratamento tradiciona­l, mas, como cresci numa família cristã, não aceitei. Procurei o centro da REMAR voluntaria­mente. Na vida, temos que tomar decisões e, quando não tomamos, não conseguimo­s sair do mundo”, desabafou, destacando ter aprendido muita coisa durante o tempo em que está no centro.

José usava a erva, álcool e o combustíve­l de avião. “Voulhe contar algo em que não vai acreditar: cheguei a usar combustíve­l de avião. Combustíve­l de avião bebe-se e embriaga. Os usurários fazem uma mistura no combustíve­l de avião, com a famosa bebida capuca (bebida espirituos­a, caseira) e dá uma grande adrenalina”, revelou.

Usuário desde os 11 anos

Inocêncio Isata, 50 anos, outro usuário de drogas, começou a beber álcool e a usar drogas quando tinha apenas 11 anos.

“Comecei a fumar e a drogar-me aos 11 anos, depois de ter perdido o meu pai. Decidi ir viver na rua e comecei a fumar liamba. Vivi na rua durante um ano. Fui preso. Parei de beber depois de entrar na REMAR, há 10 meses”, conta.

Ele foi para lá por influência da irmã mais velha. “Na REMAR, encontrei a palavra de Deus e quero prender-me nela. Ainda sonho com o vício das drogas; ainda estou com os pensamento­s na vida que levava.”. Inocêncio Isata tem vontade de voltar para casa, rever as

filhas e recuperar o emprego.

Perder a família

“Quero a minha vida de volta”, disse Maria Gouveia, que vive em Malanje e começou a beber quando tinha apenas 16 anos. Hoje tem 30. “Eu bebia e esquecia-me dos meus filhos e do meu marido e fica na rua três, quatro meses”, confessa Maria, que está na REMAR há cinco meses. “Eu fumava, bebia e me prostituía. Deus está comigo. Estou a ver brilho na minha mudança”, afirmou.

Já Ester Tamarjanga perdeu o emprego, marido e as filhas, devido ao vício das drogas.

“Pensei que era algo passageiro, mas, com o tempo, percebi que estava a me afundar no álcool”, disse. Já passaram cinco anos desde que se envolveu no mundo do álcool. Está na REMAR há sete meses e o seu maior sonho é rever as filhas gémeas.

Ester Tamarjanga trabalhava como enfermeira no Hospital Provincial do Bengo, na área de análises clínicas.

“O álcool só destruiu a minha vida”, lamentou a enfermeira, que aconselhou as pessoas que estão no mundo do álcool a acreditare­m e permitirem ser ajudadas.

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