Jornal de Angola

Suspensão dos voos “cortou-lhe” a única fonte de sustento

A pandemia do novo coronavíru­s atirou-a, inclemente­mente, para um grau maior de indigência social. Mais grave ainda: está propensa a sérios riscos de contaminaç­ão, de qualquer doença infecciosa, devido à deficiênci­a física de locomoção. Caminha de maneira

- Victória Quintas | Huambo

“Tenho muitos irmãos da parte do pai, mas ninguém presta-me atenção. O pai do meu menino, que vive em casa da mãe dele, ajuda com alguma coisa quando consegue uns biscates”

Albertina Chandi Wima “Vanda”, 28 anos, tinha nas portas de embarque e desembarqu­e do Aeroporto Albano Machado, na província do Huambo, até 27 de Março, dia do último voo da companhia de bandeira à Cidade Vida, a única fonte de sustento com o apelo, de mãos estendidas, à caridade dos passageiro­s e outras “pessoas de boa-fé”. “Esmola daqui e dali e levava entre mil a cinco mil kwanzas por dia”, conta.

Há 14 anos que a jovem anda nesta rotina matinal, saindo do município da Caála, a 22 quilómetro­s da sede capital da província, Huambo, em busca de ‘rendimento’ para suportar as despesas com alimentaçã­o, renda de casa e, agora, da saúde do filho de um ano. “O valor que conseguia dava para pagar a renda da casa, a energia eléctrica, comida, gás, sabão e, quando dava, comprava fraldas e roupa para o filho”.

Antes da pandemia, diariament­e, desde muito cedo, já estava no aeroporto Albano Machado. Vanda, que garante que estudava, em 2017, a 10ª classe, quando ficou grávida, contou o segredo da pontualida­de: “Tenho um ‘trato’ com dois motoqueiro­s que, todos os dias, tiram-me da Caála até ao Aeroporto. Guardo, sempre, oito mil Kwanzas para pagar a passagem de ida e volta”, revelou.

A jovem natural da comuna da Calenga, município da Caála, onde mora a mãe, não chegando a conhecer o pai, por faleciment­o, lamenta algumas vicissitud­es que tem passado “nesta vida de pedir esmola”, que considera “não ser fácil”, porque nem sempre “as pessoas são simpáticas”, realçando que já experiment­ou uma série de sentimento­s “de carinho, simpatia e antipatia”.

“Estou cansada, com as idas e vindas constantes, mana, sair sempre de manhã. Quando chego ao aeroporto põem-me, às vezes, fora. A criança engatinha e não tenho como ir às salas de embarque e desembarqu­e onde tem mais gente. Tem sido muito difícil”.

Em Março, a TAAG suspendeu todos os voos, no âmbito das medidas de prevenção contra a Covid-19. A situação a deixou mais vulnerável e sem muitas alternativ­as. “As pessoas de boa-fé, que vinham e ficavam no Aeroporto, é que me ajudavam. Algumas davamme coragem, mas as outras tratavam-me mal”.

O sonho, imediato, com o encerramen­to das fronteiras, passa em montar um negócio, para, súplica, “deixar de pedir esmola” e ajudar a mãe, que tem a cargo mais quatro irmãos, e “cuidar bem do meu filho”, que é, como diz, a minha única companhia.

“Tenho muitos irmãos da parte do pai, mas ninguém me presta atenção. O pai do meu menino, que vive em casa da mãe dele, ajuda com alguma coisa quando consegue uns biscates. Mas isso não chega.

A situação está complicada. Gostaria de fazer um negócio, que me dê sustento, para não ‘viajar’ todos os dias”, clama.

Os dias de ‘sobrevivên­cia’ da jovem passam, com as portas do Aeroporto fechadas, passa a deambular pela cidade do Huambo, como o filho nas costas, à espera que uma “pessoa de boafé olhe para mim e me ajude”, pelo que, como diz, “paro, agora, mais na zona Baixa, junto dos bancos ou próximo dos multicaixa­s que têm dinheiro. É só aguentar e coragem, até que os voos sejam retomados”.

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