UE procura salvar acordo nuclear assinado com Irão
O representante diplomático de Teerão em Portugal, Morteza Damanpak Jami, assegurou que o Irão nunca fechou as portas à diplomacia sobre o programa nuclear e admitiu o regresso da cooperação com os EUA, caso este país reconsidere a sua decisão
A União Europeia (UE) vai continuar a trabalhar na preservação do acordo nuclear com o Irão, apesar da retirada dos Estados Unidos, e insiste ser esta a única ferramenta que dá garantias sobre o programa nuclear de Teerão.
No quinto aniversário da celebração do Plano Conjunto de Acção (Joint Comprehensive Plan of Action, JCPOA, em inglês), a UE garante, em comunicado, que fará o possível para preservar o acordo, salientando que “não devemos partir do princípio de que no futuro surgirá novamente uma oportunidade para a comunidade internacional abordar o programa nuclear do Irão de uma forma tão abrangente”.
O JCPOA “continua a ser o único instrumento para fornecer à comunidade internacional as garantias necessárias no que respeita ao programa nuclear do Irão”, salienta o comunicado, assinado pelo chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell.
O acordo consiste em compromissos relacionados com o nuclear a serem aplicados pelo Irão em troca do levantamento de sanções pela comunidade internacional, com vista à normalização das relações comerciais e económicas com Teerão.
O acordo prevê, ainda, que haja controlo e verificação pela Agência Internacional da Energia Atómica.
Na sequência da retirada dos Estados Unidos do acordo, em 2018, Teerão anunciou, em Janeiro, que deixará de considerar quaisquer restrições ao nível do enriquecimento de urânio, número de centrifugadoras usadas para o enriquecer ou no armazenamento de combustível nuclear.
O Plano Conjunto de Acção foi assinado a 14 de Julho de 2015, em Viena, pelo Irão e pelos países com assento permanente no Conselho de Segurança da ONU - Estados Unidos, China, Rússia, Reino Unido e França - e Alemanha, e visa restringir a capacidade do Irão desenvolver armas nucleares.
Teerão admite voltar a cooperar com os EUA
O embaixador do Irão em Lisboa disse, ontem, à Lusa que o acordo internacional sobre o programa nuclear pode ser aplicado mesmo com a retirada dosEUA,masadmitiuoregresso da cooperação caso Washington recue na sua decisão.
“Consideramos que o acordo pode ser aplicado, mesmo com a retirada dos Estados Unidos. As outras partes não saíram. E se os EUA regressarem ao acordo e pretenderem a sua aplicação, estamos prontos a trabalhar com eles”, indicou o embaixador Morteza Damanpak Jami, quando se assinalam os cinco anos da assinatura deste documento entre o Irão e as grandes potências.
O JCPOA foi assinado em 14 de Julho de 2015 entre o Irão e o designado P5+1 (os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, China, Estados Unidos, França, Reino Unido, Rússia e ainda a Alemanha), com a participação da União Europeia. Em 8 de Maio de 2018, a Administração do Presidente norte-americano Donald Trump decidiu retirar-se do acordo e reimpôs um duro pacote de sanções internacionais a Teerão.
O embaixador do Irão assegurou, ontem, que o seu país “nunca fechou as portas à diplomacia”, considera o JCPOA uma “vitória da negociação” e assegura que o Governo do Presidente iraniano, Hassan Rohani, acredita numa “interacção construtiva” a nível mundial.
“É o pilar da actual diplomacia externa do Irão. Acreditamos que necessitamos de uma interacção muito positiva com a comunidade internacional, e o JCPOA foi uma prova disso”, afirmou.
No entanto, e após recordar que os três países europeus ocidentais (Alemanha, França, Reino Unido) ainda não renunciaram ao acordo nuclear, Morteza Damanpak Jami assinala que não devem “submeterse às ordens norte-americanas” e manter a independência.
“Se o JCPOA é importante para a União Europeia, numa perspectiva política, económica e de segurança, se é importante para a promoção do multilateralismo na UE, então deve regressar-se à aplicação do acordo rubricado”, frisou.
No actual contexto, reconhece, “não existe espaço para negociações” com a Administração Trump, que continua a “colocar a máxima pressão sobre o Irão, a tentar fechar todas as portas ao Irão”, uma estratégia que relaciona com a aproximação das eleições presidenciais nos EUA em Novembro.
“Mas o Irão recusa-se a ser parte de um figurino eleitoral para o Presidente dos Estados Unidos”, assinalou.
O representante diplomático de Teerão também aludiu às recentes declarações do Presidente Rohani, que exortou a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) a “manter a independência” após a adopção por esta instância de uma resolução que censura o Irão pela recusa em autorizar a inspecção de dois locais suspeitos de actividade nuclear.
A AIEA, o organismo sob a égide da ONU com sede em Viena (Áustria), tenta promover o uso pacífico da energia nuclear e limitar o desenvolvimento das suas aplicações militares.
Recentemente, e numa reunião do Conselho de governadores da Agência, foi aprovada uma resolução que não foi consensual, com a Rússia, China e outros países a oporem-se. “O que esperamos da AIEA é neutralidade. Se a AIEA for neutral e a sua agenda não se tornar política, se abordar as questões nucleares de um país numa perspectiva técnica, então ninguém terá problemas”, assegurou o embaixador.
Na perspectiva iraniana, o director-geral da AIEA emitiu um relatório, em Dezembro de 2015 onde se referia que não existiam questões ou alegações relacionadas com a designada componente militar do programa nuclear iraniano, sendo “assunto encerrado”. Mas nos últimos meses, em particular após a retirada dos EUA do acordo, têm surgido alegações sobre uma nova aceleração do programa nuclear iraniano em desrespeito pelos patamares previstos no JCPOA.
“Desde então, e até agora, o Irão tem permanecido sob intensas inspecções das equipas da AIEA. Numa recente carta do nosso ministro dos Negócios Estrangeiros (Mohammad Javad Zarif) ao Secretário-Geral da ONU, António Guterres, foi mencionado que nos últimos cinco, seis anos, mais de 90 por cento das inspecções da AIEA estiveram focalizadas no Irão”, justificou Morteza Damanpak Jami.
E precisou: “Infelizmente, e recentemente, a AIEA tentou apresentar um relatório para o qual não estava mandatada. E esse relatório ao Conselho de governadores, por pressão dos EUA, e de Israel, referiam-se a dois locais onde Israel alegava existirem actividades nucleares”.
O diplomata referiu que um desses locais já está incluído num primeiro relatório, e está encerrado.
“Os membros da AIEA não devem considerar alegações falsas, antes trabalhar na base de documentos técnicos. O Irão continua a cooperar totalmente com a AIEA, mas não pode cooperar com alegações emitidas por inimigos do Irão”,