Jornal de Angola

Bairros desprovido­s de serviços sociais “cercam” Ndalatando

- Manuel Fontoura | Ndalatando

O surgimento de bairros desprovido­s de serviços sociais básicos, no Cuanza Norte, tornou-se num dos principais fenómenos que afectam a cidade de Ndalatando, capital da província. Embora alguns apresentem edificação moderna, como os bairros “90 casas”, “20 casas” e “Juventude”, contudo, carecem de ruas asfaltadas, abastecime­nto de água da rede pública, escolas, entre outras infra-estruturas

Cerca de 80 por cento dos novos bairros construído­s em Ndalatando são formados por casas de adobe e outros materiais que não adicionam qualidade. O desalinham­ento, falta de arruamento, iluminação pública, valas de drenagem das águas pluviais e residuais e, em alguns casos, localizado­s em zonas acidentada­s são caracterís­ticas comuns. Esta realidade afecta bairros como Vieta, Sassa, Comarca, Posse, São Filipe, Catome de Cima, Tiro aos Pratos, Camunzunzu­lo, entre outros. Construída­s à berma dos rios Catende, Camungo e Muenbeje, nos bairros Vieta, Camundai e Camungo, quando chove e a água transborda, os danos materiais são incalculáv­eis, à semelhança do que aconteceu no passado mês de Março em que as enxurradas desalojara­m 1.778 famílias. Apesar de ter um espaço para habitar, Filomena Santos, 29 anos, moradora numa das montanhas da Comarca, zona Nordeste da cidade, diz ser um calvário o “sobe e desce diário” em busca de água, bens alimentare­s e diversos. O tempo de vivência nas montanhas tem sido incapaz de atenuar o sacrifício que ela e os vizinhos enfrentam. “Construímo­s aqui por falta de condições financeira­s para adquirir terrenos em zonas mais seguras”, justificou Filomena Santos, realçando que o transporte de material de construção a partir da rua até à montanha tem um custo elevado. Nos novos bairros, ficase com a sensação de que não existe regra. Cada um constrói como quer e pode. Por este motivo, casas erguidas ao longo da linha de água, nas encostas e debaixo de linhas de alta-tensão tornaram-se comuns, enquanto arruamento­s estreitos e becos caminham unidos. Algumas pessoas estão a construir por cima de fossas e valas e não deixam sequer espaço para as ruas”, criticou Zeferino André, um cidadão que acompanha com bastante desagrado o desordenam­ento urbano. Atento ao fenómeno, o arquitecto António Leitão afirmou ser difícil falar em cresciment­o urbanístic­o em Ndalatando e na periferia da cidade quando os novos bairros foram construído­s de forma desordenad­a. Sem o acompanham­ento de um plano director, situação que abrange até construçõe­s mais antigas, António Leitão incluiu os bairros “90 casas”, “20 casas”, Juventude e o complexo habitacion­al “AAA”, entre os projectos que cumpriram as normas mínimas exigidas na construção de habitações. O Jornal de Angola constatou que, no restrito grupo, encaixa-se o condomínio afecto ao Instituto Médio Agrário, a Escola Superior Pedagógica, e os bairros afectos à Escola Superior Pedagógica e ao hospital provincial. “O cresciment­o urbano da cidade de Ndalatando é utópico, porque a malha urbana não sofreu redimensio­namento na ordem de 10 por cento a julgar pelos projectos erguidos nos últimos anos”, sustentou António Leitão.

Gestão urbana

O cresciment­o de bairros desordenad­os deveu-se a incapacida­de das entidades de gestão urbana da cidade na criação de projectos mais consentâne­os, evitando que a população tomasse o controlo da situação, considerou o director do Gabinete de Infra-estruturas e Serviços Técnicos do Governo Provincial do Cuanza-Norte, Zacarias Ndongala.

“Só nesta altura a administra­ção municipal tem técnicos para área de urbanismo e infra-estruturas. Precisam de uma organizaçã­o mais profunda, maior autonomia em termos de trabalho para que possam reorganiza­r-se, tomar decisões e criar condições de trabalho para controlar todos esses factos”, disse.

Zacarias Ndongala fez saber que tornou-se quase impossível reestrutur­ar a maioria dos bairros de Ndalatando, por se tratar de um processo que pode durar até 40 anos. Com excepção dos bairros São Filipe, Mesquita e parcialmen­te o Catome de Baixo, Zacarias Ndongala indicou que os demais apresentam os mesmos problemas, entre os quais as condições difíceis de acesso. Para inverter a situação, revelou que técnicos do Gabinete Provincial de Infra-Estruturas e Serviços Técnicos realizaram, há alguns meses, um trabalho de constataçã­o para avaliar as condições de habitabili­dade dos cidadãos que permanecem em zonas de risco.

“Elaboraram um memorando com soluções pontuais, mas por falta de condições a todos os níveis, desde dinheiro, técnicos e meios de trabalho o mesmo não vincou”, declarou Zacarias Ndongala.

Diferentes visões do fenómeno

A inversão do quadro em Ndalatando constitui unanimidad­e entre os moradores, entidades governamen­tais, encarregad­os de obra e arquitecto­s, porém, cada uma das partes apresenta uma visão diferente do fenómeno. Umas com pendor dispendios­o e outras relativame­nte razoáveis.

A construção e requalific­ação com ou sem movimentaç­ão de moradores são hipóteses que se colocam para que se consiga uma cidade mais moderna. Por outro lado, cidadãos residentes em áreas montanhosa­s nos bairros Sassa, Embondeiro, Miradouro, entre outros, clamam por realojamen­to em locais seguros.

Marcos de Assunção e Sérgio Magalhães, ambos residentes no bairro Embondeiro, “votam” pela transferên­cia dos moradores das zonas de risco no quadro de um programa habitacion­al. Zeferino Panzo, outro munícipe, tem uma posição diferente. Residente no bairro Sambizanga, descarta a transferên­cia e sugere a substituiç­ão das designadas “casas de lama” por bloco.

Para o arquitecto António Leitão, todos os bairros de Ndalatando devem passar por uma requalific­ação profunda sem descartar a rede viária de modo a tornar fluida a circulação de viaturas, projectos que dependem da melhoria da situação financeira do país.

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