Bairros desprovidos de serviços sociais “cercam” Ndalatando
O surgimento de bairros desprovidos de serviços sociais básicos, no Cuanza Norte, tornou-se num dos principais fenómenos que afectam a cidade de Ndalatando, capital da província. Embora alguns apresentem edificação moderna, como os bairros “90 casas”, “20 casas” e “Juventude”, contudo, carecem de ruas asfaltadas, abastecimento de água da rede pública, escolas, entre outras infra-estruturas
Cerca de 80 por cento dos novos bairros construídos em Ndalatando são formados por casas de adobe e outros materiais que não adicionam qualidade. O desalinhamento, falta de arruamento, iluminação pública, valas de drenagem das águas pluviais e residuais e, em alguns casos, localizados em zonas acidentadas são características comuns. Esta realidade afecta bairros como Vieta, Sassa, Comarca, Posse, São Filipe, Catome de Cima, Tiro aos Pratos, Camunzunzulo, entre outros. Construídas à berma dos rios Catende, Camungo e Muenbeje, nos bairros Vieta, Camundai e Camungo, quando chove e a água transborda, os danos materiais são incalculáveis, à semelhança do que aconteceu no passado mês de Março em que as enxurradas desalojaram 1.778 famílias. Apesar de ter um espaço para habitar, Filomena Santos, 29 anos, moradora numa das montanhas da Comarca, zona Nordeste da cidade, diz ser um calvário o “sobe e desce diário” em busca de água, bens alimentares e diversos. O tempo de vivência nas montanhas tem sido incapaz de atenuar o sacrifício que ela e os vizinhos enfrentam. “Construímos aqui por falta de condições financeiras para adquirir terrenos em zonas mais seguras”, justificou Filomena Santos, realçando que o transporte de material de construção a partir da rua até à montanha tem um custo elevado. Nos novos bairros, ficase com a sensação de que não existe regra. Cada um constrói como quer e pode. Por este motivo, casas erguidas ao longo da linha de água, nas encostas e debaixo de linhas de alta-tensão tornaram-se comuns, enquanto arruamentos estreitos e becos caminham unidos. Algumas pessoas estão a construir por cima de fossas e valas e não deixam sequer espaço para as ruas”, criticou Zeferino André, um cidadão que acompanha com bastante desagrado o desordenamento urbano. Atento ao fenómeno, o arquitecto António Leitão afirmou ser difícil falar em crescimento urbanístico em Ndalatando e na periferia da cidade quando os novos bairros foram construídos de forma desordenada. Sem o acompanhamento de um plano director, situação que abrange até construções mais antigas, António Leitão incluiu os bairros “90 casas”, “20 casas”, Juventude e o complexo habitacional “AAA”, entre os projectos que cumpriram as normas mínimas exigidas na construção de habitações. O Jornal de Angola constatou que, no restrito grupo, encaixa-se o condomínio afecto ao Instituto Médio Agrário, a Escola Superior Pedagógica, e os bairros afectos à Escola Superior Pedagógica e ao hospital provincial. “O crescimento urbano da cidade de Ndalatando é utópico, porque a malha urbana não sofreu redimensionamento na ordem de 10 por cento a julgar pelos projectos erguidos nos últimos anos”, sustentou António Leitão.
Gestão urbana
O crescimento de bairros desordenados deveu-se a incapacidade das entidades de gestão urbana da cidade na criação de projectos mais consentâneos, evitando que a população tomasse o controlo da situação, considerou o director do Gabinete de Infra-estruturas e Serviços Técnicos do Governo Provincial do Cuanza-Norte, Zacarias Ndongala.
“Só nesta altura a administração municipal tem técnicos para área de urbanismo e infra-estruturas. Precisam de uma organização mais profunda, maior autonomia em termos de trabalho para que possam reorganizar-se, tomar decisões e criar condições de trabalho para controlar todos esses factos”, disse.
Zacarias Ndongala fez saber que tornou-se quase impossível reestruturar a maioria dos bairros de Ndalatando, por se tratar de um processo que pode durar até 40 anos. Com excepção dos bairros São Filipe, Mesquita e parcialmente o Catome de Baixo, Zacarias Ndongala indicou que os demais apresentam os mesmos problemas, entre os quais as condições difíceis de acesso. Para inverter a situação, revelou que técnicos do Gabinete Provincial de Infra-Estruturas e Serviços Técnicos realizaram, há alguns meses, um trabalho de constatação para avaliar as condições de habitabilidade dos cidadãos que permanecem em zonas de risco.
“Elaboraram um memorando com soluções pontuais, mas por falta de condições a todos os níveis, desde dinheiro, técnicos e meios de trabalho o mesmo não vincou”, declarou Zacarias Ndongala.
Diferentes visões do fenómeno
A inversão do quadro em Ndalatando constitui unanimidade entre os moradores, entidades governamentais, encarregados de obra e arquitectos, porém, cada uma das partes apresenta uma visão diferente do fenómeno. Umas com pendor dispendioso e outras relativamente razoáveis.
A construção e requalificação com ou sem movimentação de moradores são hipóteses que se colocam para que se consiga uma cidade mais moderna. Por outro lado, cidadãos residentes em áreas montanhosas nos bairros Sassa, Embondeiro, Miradouro, entre outros, clamam por realojamento em locais seguros.
Marcos de Assunção e Sérgio Magalhães, ambos residentes no bairro Embondeiro, “votam” pela transferência dos moradores das zonas de risco no quadro de um programa habitacional. Zeferino Panzo, outro munícipe, tem uma posição diferente. Residente no bairro Sambizanga, descarta a transferência e sugere a substituição das designadas “casas de lama” por bloco.
Para o arquitecto António Leitão, todos os bairros de Ndalatando devem passar por uma requalificação profunda sem descartar a rede viária de modo a tornar fluida a circulação de viaturas, projectos que dependem da melhoria da situação financeira do país.