Morreu o homem que esteve sempre do lado certo da História
John Lewis era o mais novo e último sobrevivente do Movimento de Defesa dos Direitos Cívicos norteamericano liderado pelo reverendo Martin Luther King e foi membro da Câmara dos Representantes
Era o mais novo e último sobrevivente do grupo “Os Grandes Seis”, composto por líderes negros que lutavam pelos direitos humanos, que incluía Martin Luther King Jr. John Lewis morreu sextafeira, aos 80 anos, devido a um cancro no pâncreas.
O activista era membro da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos desde 1986 e, até ao dia da sua morte, lutou pela justiça e pelos ideais que defendia.
Depois de meses afastado de Washington para se concentrar nos seus tratamentos, Lewis regressou à capital, em Junho, após a morte de George Floyd, para participar na mobilização do movimento “Black Lives Matter” contra a discriminação racial.
“Temos estado nas ruas e a Polícia continua a usar a mesma táctica para impedir a nossa luta pela liberdade negra e, no entanto, isso nunca impediu o congressista Lewis. Ele esteve sempre no lado certo da História”, disse Patrisse Cullors, uma das fundadoras do movimento “Black Lives Matter”.
Asuaúltimaapariçãopública aconteceu no início de Junho, quando participou numa manifestação perto da Casa Branca, em Washington, onde caminhou (com a ajuda de uma bengala) com Muriel Bowser, presidentedoDistritodeColumbia, numa rua da Casa Branca acabada de ser renomeada Black Lives Matter Plaza e que tinha sido decorada com a inscrição “Black Lives Matter”.
O ex-Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, que em 2011 concedeu a Lewis a Medalha da Liberdade, a maior distinção civil dos Estados Unidos, usou as redes sociais para homenagear o activista. “Muitos de nós não vivemos para ver o nosso legado desenrolar-se de uma maneira tão significativa e notável. O John Lewis viveu. E graças a ele, agora todos temos instruções para continuar a acreditar na possibilidade de reconstruir este país que amamos até que ele cumpra o seu potencial”, pode ler-se no texto partilhado pelo democrata.
A origem de um Ícone
John Lewis nasceu a 21 de Fevereiro de 1940, nos arredores da cidade de Troy, no Alabama, era o quarto de dez irmãos numa família pobre de agricultores. Tinha 21 anos quando se tornou um dos fundadores dos “Passageiros da Liberdade”, que lutaram contra a segregação racial no sistema de transporte público americano e, em 1963, foi um dos fundadores e lideres do Comité de Coordenação dos Estudantes Não Violentos (SNCC), que esteve na vanguarda do movimento pelos direitos dos negros e que organizou manifestações no Sul dos Estados Unidos.
Após assumir a direcção do SNCC, Lewis apresentouse na Sala Oval da Casa Branca com outros líderes negros, Martin Luther King Jr., Whitney Young, A. Philip Randolph, James Farmer e Roy Wilkins, que ficaram conhecidos como os “Os Grandes Seis”, ele era o mais novo e último sobrevivente deste grupo. Na reunião, os seis anunciaram ao Presidente John F. Kennedy que rejeitavam cancelar a marcha até à porta da Casa Branca para promover uma legislação que protegesse melhor os direitos cívicos. Foi nesta manifestação que Martin Luther King fez o icónico discurso “I Have a Dream”, mas Lewis foi mais directo. “Se não conseguirmos uma legislação significativa deste Congresso, chegará uma altura em que não limitaremos a nossa marcha a Washington… Temos de dizer ‘Acorda, América, acorda!’ Porque não podemos parar, e não vamos ser pacientes.” Dois anos depois, durante a manifestação antirracista pacífica em Selma, no Alabama, quase morreu depois de ter sido brutalmente espancado pela Polícia, que lhe causou uma fractura no crânio.
Anti-Trump
Nos últimos anos, a vida de Lewis foi marcada pela sua posição contra o actual Presidente dos Estados Unidos da América, Donald Trump.
O congressista opôs-se à vitória de Trump nas eleições e boicotou a sua tomada de posse, em 2016. Lewis considerava que as interferências russas nas eleições tornavam a vitória “ilegítima”. Esta foi a primeira vez que um congressista se pronunciou de tal forma contra um Presidente. Raúl Grijalva, do Arizona, e Barbara Lee, da Califórnia, também se opuseram.
“Acho que os russos ajudaram a que este homem fosse eleito. E ajudaram na destruição da candidatura de Hillary Clinton”, explicou Lewis. “Eu disse aos estudantes: ‘Quando vêm algo que não está certo, que não é justo, têm a obrigação moral de fazer alguma coisa, de dizer algo’”, disse Lewis, em 2018, quando foi colocada a hipótese de existir um “impeachement” a Donald Trump. Em relação à morte de Lewis, Trump reagiu com um curto Tweetter. “Triste por ouvir as notícias sobre a morte de John Lewis, um herói dosdireitoscívicos.Eu eaMelania enviamos as nossas condolências à família”.
De forma a honrar a sua morte, a bandeira da Casa Branca ficou à meia haste, como acontece sempre que morre um congressista.