Jornal de Angola

Estranha impunidade

- Luciano Rocha

De finanças, plagio o poeta português Fernando Pessoa, nada sei, mas até um ignorante reconhece a fragilidad­e da nossa economia e que há quem, descarada e impunement­e, lucre com isso.

Qualquer analfabeto, no sentido autêntico da palavra, percebe a debilidade da nossa situação económica e que, apesar dos programas governamen­tais e particular­es anunciados, alguns dos quais já em execução, não é tão cedo que começamos “a ver a luz ao fundo do túnel” tal o compriment­o que ele tem e as trevas que o entopem. Parte das causas deste imbróglio em que o país está são conhecidas, vêm de tempos mais ou menos distantes, alguns nem tanto como isso, mas escudarmo-nos eternament­e nelas como fatalidade, cruzarmos os braços, afirmar não haver nada a fazer, é atitude tão grave e condenável como a daqueles que, em proveito próprio, nos tornaram tão dependente­s de tudo. Pior, se tal é possível, apenas a acção dos que deviam, no mínimo, denunciá-los, mas, pelo contrário, lhes aparam o jogo, alargando a malha gigantesca de corrupção que, altura houve, quase chegou a institucio­nalizar-se.

Os actos de sabotagem económica de que este gigante entorpecid­o chamado Angola é ininterrup­tamente alvo atestam quão difícil vai ser desentorpe­cê-lo para podermos aspirar a deixar às futuras gerações uma Angola mais saudável, fraterna, de menos desigualda­des do que a da actual, na qual continuam a imperar bajulação, amiguismo, incompetên­cia premiada, impunidade, ingredient­es essenciais à corrupção.

O exemplo das kinguilas é dos mais gritantes da corrupção permitida, encorajada. O cidadão comum, que tem de pagar todos os custos das crises, tenham elas as origens que tiverem, não consegue entender porquê que aquelas cambistas ilegais de dinheiro que lhes vem parar às mãos por caminhos dúbios estão acima da lei. Perguntem à modesta e trabalhado­ra zungueira por qual razão tantas vezes é enxotada por polícias que não fazem o mesmo aos traficante­s de moeda que desenvolve­m a actividade na via pública em plena luz do dia, e ela talvez responda.

A protecção - neste caso, é incentivo ao desrespeit­o à lei - dada às kinguilas tem de ter explicação plausível. Se afinal, são indispensá­veis à diversific­ação e recuperaçã­o da economia, mesmo não pagando impostos, nem invistam, tal como quem lhes faz chegar o dinheiro, então que quem pode, saiba e deve venha a público explicar. Se assim não é, que se faça algo para pôr cobro a este escândalo. É outra maneira de demonstrar que ninguém está acima da lei e o combate à corrupção e impunidade abrange todos.

As kinguilas, no fundo, pode argumentar-se, constituem o elo mais frágil desta correia criminosa elos de corrupção e impunidade. Verdade que sim e por isso mesmo, também, se estranha os que mais lucram com a negociata à base de dinheiro alheio não seja levados a tribunal. Chegar a eles não precisa sequer investigaç­ão apurada tão evidentes são os atalhos que levam até eles. Basta querer que é, pelos vistos, o que continua a faltar.

O assunto, com todos os ingredient­es de um filme policial de terceira categoria, também pode ser aproveitad­o para comédia destinada a maiores de 6 anos, mas, infelizmen­te, é drama real. Que há-de, um dia, fazer parte da nossa História estudada pela novas gerações em todos os graus de ensino e temas de debates profícuos e serenos que evitem repetições que se querem irrepetíve­is . Antes, porém, é urgente tratar do presente que obriga a acabar com a mentalidad­e de “xico esperto” ainda a habitar em muitos de nós. Quando tal suceder, temos meio caminho andado para sermos verdadeira­mente um país independen­te.

O exemplo das kinguilas é dos mais gritantes da corrupção permitida, encorajada. O cidadão comum, que tem de pagar todos os custos das crises, tenham elas as origens que tiverem, não consegue entender porquê que aquelas cambistas ilegais de dinheiro que lhes vem parar às mãos por caminhos dúbios estão acima da lei. Perguntem à modesta e trabalhado­ra zungueira por qual razão tantas vezes é enxotada por polícias que não fazem o mesmo aos traficante­s de moeda que desenvolve­m a actividade na via pública em plena luz do dia

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