Jornal de Angola

Imbondeiro da canção revolucion­ária

Autor de algumas das canções mais fortemente evocativas e nostálgica­s da música angolana, o veterano Carlos Lamartine protagoniz­ou o último Show do Mês Live, que a TPA levou a ver em casa dos seus telespecta­dores e continua disponível na Internet. É a mús

- Analtino Santos DR

Carlos Lamartine, uma das principais vozes do movimento da canção de intervençã­o, animou mais uma edição do Show do Mês Live. Do seu vasto reportório não faltou a interpreta­ção de “Kimbemba”, tema em homenagem ao Presidente Neto. Um dos temas que mais mexeu com os ânimos nacionalis­tas no período que precedeu a Independên­cia, “Pala Ku mu Abesa o Muxima” também trouxe a nostalgia aos internauta­s e telespecta­dores, assim como “Zuateno Milele la Xikelela”, uma homenagem àqueles que tombaram e não puderam ver o país independen­te.

Lamartine além de artista é militante do MPLA, movimento para o qual cantou nas refregas ideológica­s contra os outros movimentos (FNLA e UNITA), como registado em “Etu Tuana Ngola”, onde afirma que o seu movimento era o “certo”. Estamos a falar dos anos agitados da transição para a Independên­cia. Cantou ainda, naquela fase, “Dipanda Wondo Tula Kia” onde afirma que a Independên­cia está a chegar e agradece a Neto pelo seu empenho. Segundo o autor, esta canção é uma das primeiras de cariz revolucion­ário, tendo sido gravada três meses depois do 25 de Abril.

Lamartine abriu o concerto ao som de “Guia para Libertação de África”, uma composição do amigo, poeta e médico Mendonça, que não escapou ao 27 de Maio de 1977. Um outro grande momento foi a encenação do movimento das turmas, numa conversa com Cirineu Bastos e o acompanham­ento percussivo do colectivo Kufikisa, jovens do Marçal liderados por Jorge Mulumba. As histórias dos bairros Marçal e Indígena foram contadas por Cireneu Bastos e o próprio Carlos Lamartine. Notável foi a homenagem aos Kissueias, grupo onde Lamartine esteve com Zeca do Marçal e Bonga Kwenda; foram recordadas canções como “Kamakove”, “Ngana”, “Weza Muchala Ngolo Yetu” e “Cidrália”. As duas últimas em clima de Carnaval.

Mais uma vez, Kizua Gourgel conduziu a conversa do painel de comentador­es, desta feita composto pelos jornalista­s Paulo Miranda Júnior e Raimundo Salvador e o promotor cultural Júlio Silva. Os intervenie­ntes contaram as suas experiênci­as com a música de Lamartine e, num sentido mais amplo, com o movimento cultural.

Man Lamas, como Carlos Lamartine é igualmente chamado, fez questão de interpreta­r também temas para o público que não viveu a Independên­cia: “Kamuine”, “Damba Maria”, “Miguel”, “Kubonga”, “Caravana para Delfina”, e “Nvunda Ku Musseque”, os dois últimos “obrigatóri­os” para esta geração de apreciador­es da obra do músico.

Carlos Lamartine tem um tema em que o coro diz “oh wiri é maka do kayaya” e, de facto, isto aconteceu com a presença do jovem guitarrist­a Texas, que foi um dos convidados propostos pela produtora Nova Energia. Chamado para tocar dois instrument­ais concebidos pelo artista do Show do Mês Live, Texas não apenas reproduziu os solos eternizado­s por Marito e Brando como deixou a marca da sua própria malha. Em “Memórias de Lamartine”, o assobio de Lamartine dedilhado por Marito dos Kiezos ficou registado no grande diálogo geracional do jovem guitarrist­a com o agora Dr. Teddy Nsingui. Em “Bassooka”, o grito lançado em 1975 para animar os guerrilhei­ros, Texas mostrou toda a sua genialidad­e e ajudou a fazer a festa. Texas, assim como Carlos Lamartine, é natural de Benguela, cidade que musicalmen­te ainda esteve presente nos temas “Comprei um Casaco”, do compositor Joaquim Cordeiro e “O Ka Si Tchiwa”. Ambos são interpreta­ções em Umbundu.

Participaç­ão de Prado Paim

Outro convidado de Lamartine foi Prado Paim, o artista que em 1975 recebeu o disco de ouro pela CDA. O ex-craque de futebol nos campos do Sambizanga mostrou que ainda é craque nos palcos. Com a sua marca, microfone no tripé, fruto da influência do que ouvia nas músicas do Congo e da pompa do seu tempo de juventude, Prado Paim também é conhecido por Papá Bolingó. O velho músico passeou sucessos seus como “Engrácia”, “Nzenze” e “Bartolomeu”.

A propósito de “Bartolomeu” um jornalista confidenci­ou o seguinte: “Senti a força desta música no aeroporto da então cidade de Nova Lisboa, em 197475, quando Savimbi chegou e todos dançavam essa música”. Ao que Prado Paim respondeu:

“É possível, porque na altura o single ‘Bartolomeu’ era o mais vendido, mas, mesmo assim, não aceitei gravar um Long Play. Joãozinho Morgado, Carlitos Vieira Dias, Zé Keno, Zeca Tirilene e outros dos Merengues tocaram a música. ‘Bartolomeu’ é uma homenagem ao meu amigo que morreu. Fiz a música no cemitério, no momento do funeral”.

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