Beneficiários políticos tiveram acesso ao crédito sem garantias
O economista angolano Jonuel Gonçalves considerou, no fim-de-semana, que durante anos, em Angola, certos beneficiários políticos de crédito nem se julgavam obrigados a pagá-lo.
O economista Jonuel Gonçalves considerou, num artigo publicado este fim-desemana, que durante anos, em Angola, certos beneficiários políticos de crédito nem se julgavam obrigados a pagá-lo e que o fim da seguradora AAA, detentora do monopólio dos seguros do petróleo, mostra também as lutas ferozes entre famílias com altos rendimentos.
Para o também professor universitário, as investigações em Genebra e Luanda, sobre os movimentos bancários de Carlos de São Vicente, executivo chefe da ex-seguradora angolana AAA, actualmente em fase de liquidação, levantam elementos centrais sobre a própria natureza da economia criada em Angola.
Entre eles, Jonuel Gonçalves aponta os impactos do extractivismo petrolífero, as funções principais atribuídas à banca, os interesses nas importações ou nos contratos com o exterior e as lutas ferozes entre grupos de altíssimos rendimentos, muitas vezes autênticas linhagens. “A ‘triplo A’ foi criada no quadro da Sonangol e, por sucessivos aumentos de capital, passou a ter São Vicente (ex-técnico da petrolífera) como accionista principal”, afirma.
Jonuel Gonçalves recorda que há pouco mais de uma semana, o governador do Banco Nacional de Angola (BNA) afirmou, num fórum em Luanda, que o crédito equivale a 16 por cento dos activos bancários, sublinhando que “o crédito bancário não é mais do que 12,5 por cento no PIB não petrolífero” e no sector de particulares, não atinge 3,0 por cento, sendo a área comercial a mais beneficiada, em parte para importações.
A maior pressão sobre a banca situa-se no acesso à moeda convertível ao câmbio oficial, devido aos privilégios na transferência de fortunas e obtenção de divisas para importações, muitas vezes sobrefacturadas e com depósitos no exterior.
“Os interesses decorrentes têm sido obstáculo à criação de actividades produtivas em Angola, pois dispensariam várias importações. Estas pressões e práticas têm décadas e, somadas à queda dos preços do petróleo, explicam a erosão das reservas e a escassez de meios de investimento susceptíveis de reduzir a recessão, que dura desde 2014, e boa parte do crédito mal parado. Durante anos, certos beneficiários políticos de crédito nem se julgavam obrigados a pagá-lo”, disse.
Sonangol
A Sociedade Nacional de Combustíveis de Angola (Sonangol) vai responder a todas as interpelações necessárias para o esclarecimento do caso 900 milhões de dólares, que envolve o maior accionista da seguradora AAA,
Carlos de São Vicente.
Um documento da petrolífera estatal assume ter ela estado na origem da criação da seguradora e que a sua cooperação, no esclarecimento do caso, se limita aos “imperativos da justiça e do serviço público, sem nunca descurar a estrita observância e o respeito pelo segredo de justiça”.
Com forte repercussões na imprensa nacional e internacional, o congelamento de 900 milhões de dólares numa conta privada de Carlos de São Vicente, por um banco suíço, tem sido aproveitado por sectores da opinião pública para lançar desconfianças às sucessivas equipas de gestão da petrolífera.
Entrevistado pela TV Zimbo, o economista Carlos Rosado de Carvalho considera aproveitamento político a ex-gestora da petrolífera Isabel dos Santos chamar a si os “louros” da decisão de acabar com o monopólio das AAA no seguro petrolífero. De acordo com dados da Arseg, citados pela Angop, a seguradora foi dissolvida e liquidada em Janeiro.