Jornal de Angola

Pandemia transtorna Angola há seis meses

O 28 de Março ficou marcado pelas duas primeiras mortes por Covid-19 no país. Não resistiram à doença dois homens, com 37 e 59 anos, então residentes em Luanda. Tinham ambos acabado de chegar de Lisboa

- José Meireles

Completam-se hoje, 21 de Setembro, seis meses desde que foram anunciados, pela voz da ministra da Saúde, Sílvia Lutucuta, os dois primeiros casos positivos da pandemia da Covid-19 em Angola, importados por cidadãos nacionais residentes em Luanda, provenient­es de Lisboa (Portugal), em Março.

Nessa altura, o pânico e o receio apossaram-se das pessoas, enquanto as autoridade­s sanitárias iam apelando à calma e incentivan­do a população a observar as medidas de prevenção individual e colectiva, para evitar a propagação da doença, numa altura em que havia ainda muitas incertezas a nível mundial sobre os protocolos, em matéria de tratamento dos casos positivos.

Muito antes dos primeiros casos positivos da Covid-19 terem aportado em Luanda, as autoridade­s sanitárias, bem como o Mais Alto Mandatário da Nação, já haviam, em diversas ocasiões, manifestad­o atitudes humildes, ao reconhecer­em as fragilidad­es do nosso Sistema Nacional de Saúde.

Para o efeito, e de forma antecipada, foram efectuados investimen­tos de vulto, como a construção de um Hospital de Campanha, na Zona Económica Especial, em Viana, com capacidade para mil camas. A Sonangol encarregou-se de erguer uma unidade especializ­ada, no Quilómetro 27, também em Viana.

Inicialmen­te vocacionad­o para acolher pacientes em quarentena institucio­nal, o centro do Ramiros, na Barra do Kwanza, passou depois para unidade de referência no tratamento da doença, juntandose também os de Calumbo I e II, em Viana, só a nível de Luanda, enquanto no resto do país investimen­tos do género foram sendo também feitos.

A par dos investimen­tos em infra-estruturas, o Governo angolano colocou em marcha a aquisição de equipament­os hospitalar­es, com destaque para Laboratóri­os de Biologia Molecular (TR-PCR), em Luanda, com capacidade para processar seis mil amostras.

Ainda em Luanda, foram renovados os equipament­os no Instituto Nacional de Investigaç­ão em Saúde, enquanto nas províncias de Cabinda, Zaire, Lunda-Norte e Huambo estão a ser instaladas réplicas de laboratóri­os de Biologia Molecular, cuja novidade recai para a presença de um angolano, que lidera a equipa vinda da China, para erguer as referidas instalaçõe­s.

Em matéria de investimen­tos, foram também adquiridos pelo menos 700 ventilador­es, material de biossegura­nça e medicament­os essenciais, num processo acompanhad­o com a formação de técnicos de saúde, em Luanda e no resto do país.

Estado de Emergência

Durante o período em que a doença começou a transtorna­r o país e o mundo, a Comunicaçã­o Social angolana foi chamada a reorganiza­r a sua programaçã­o, com a inserção de conteúdos informativ­os sobre as formas de contágio, as consequênc­ias para as famílias, economia nacional e mundial, ao mesmo tempo que especialis­tas iam elucidando a população. Com a chegada da doença, que obrigou a que todos os países do mundo encerrasse­m as fronteiras aéreas, terrestres e marítimas, as autoridade­s angolanas permitiram a realização de voos humanitári­os, para o repatriame­nto de milhares de concidadão­s retidos em países da Europa, África e América.

Depois de alguma confusão na recepção dos passageiro­s, que, inicialmen­te, deviam cumprir quarentena institucio­nal obrigatóri­a, muitos foram para casa e, sem medir as consequênc­ias, abdicaram do cumpriment­o das recomendaç­ões, e “deram-se ao luxo” de mentir às autoridade­s sanitárias sobre os endereços e contactos telefónico­s.

O Presidente da República, João Lourenço, ouvindo os conselheir­os e a Assembleia Nacional, decretou, a 15 de Março, o Estado de Emergência, com a duração de 15 dias, prorrogand­o-o, depois, para mais 15, até 9 de Abril, e, posteriorm­ente, mais outros 15, até finais desse mês. Em Maio, foi decretado o Estado de Calamidade Pública, que se mantém até hoje.

O Estado de Emergência teve como propósito fazer com que o maior número possível de pessoas, com destaque para mulheres com filhos menores de sete anos, cidadãos em situação de risco de saúde, ficassem confinadas, ao mesmo tempo que a população foi sendo exortada a permanecer em casa e só sair em caso de necessidad­e extrema.

As primeiras mortes

O 28 de Março ficou marcado pelas duas primeiras mortes por Covid-19 no país. Não resistiram à doença dois homens, com 37 e 59 anos, então residentes em Luanda. Ambos chegaram de Lisboa, nos dias 12 e 13, respectiva­mente, nos primeiros voos humanitári­os de repatriame­nto de angolanos retidos em Portugal, e receberam assistênci­a em clínicas privadas de referência em Luanda. Durante os meses de confinamen­to, a comunicaçã­o social foi reportando casos de violação do Estado de Emergência, por pastores e fiéis de igrejas, afronta às Forças de Defesa e Segurança, violação

Muito antes dos primeiros casos positivos da Covid19 terem aportado em Luanda, as autoridade­s sanitárias, bem como o Mais Alto Mandatário da Nação, já haviam, em diversas ocasiões, manifestad­o atitudes humildes, ao reconhecer­em as fragilidad­es do nosso Sistema Nacional de Saúde.

da cerca sanitária, por pessoas de vários estratos, incluindo altas figuras do Estado e da Magistratu­ra Judicial.

Entre Junho e Julho, enquanto os números de contágios e de mortes cresciam exponencia­lmente - nessa altura já estavam contabiliz­ados 880 casos e 35 mortes - paradoxalm­ente, assistia-se a um “boom” no ajuntament­o de pessoas nas ruas e mercados. Foi decretado o uso obrigatóri­o de máscara facial nos transporte­s públicos, na rua e em locais fechados.

Na comunicaçã­o à Nação, proferida a 17 de Julho, o Presidente da República, João Lourenço, chamou a atenção da população para levar “muito a sério” a realidade da circulação comunitári­a no país e tomar medidas que evitem a propagação da doença.

Para João Lourenço, “pior do que não usar a máscara, é usá-la incorrecta­mente, porque enganamos a nós próprios, enganamos quem nos rodeia, enganamos as estatístic­as da Saúde Pública. Lembre-se, a nossa salvação individual e colectiva está na nossa autodiscip­lina, está na prevenção. Cuide-se, cuide de quem nos rodeia”, apelou.

Como resultado da teimosia e ignorância de muitos, as autoridade­s sanitárias impuseram a cerca sanitária a Luanda, que dura há seis meses, situação que depois se alastrou para o município do

Cazengo (CuanzaNort­e), entretanto já levantada. Hoje, os casos de Covid-19 contam-se em quase todo o país, à excepção das províncias do Namibe e Cuando Cubango.

Seis meses depois, são assustador­es os números da doença no país. Até ontem, havia 152 mortos e 3.991 casos, tendo recuperado 1.445 pacientes, situação que está a preocupar o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da União Africana (África CDC), devido ao crescente número de fatalidade­s, comparativ­amente ao resto do continente.

Embora a África CDC tenha revelado ser “prematura qualquer avaliação à mortalidad­e elevada em Angola”, associada à Covid-19, não deixa de ser preocupant­e a situação, tendo em conta que a média global da doença é 3.2 por cento e em África 2.4 por cento.

Angola, com o registo de 4 por cento de taxa de mortalidad­e, tem das mais altas do continente (incluindo Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa), apenas superada pela República Saharaui, com 8 por cento, Chade, 7 por cento, Libéria, Nigéria, Egipto e Mali, todos acima de 5 por cento.

Entretanto, como ocorre um pouco por todo o Mundo, Angola abre-se, aos poucos. Na segunda-feira, ficou confirmada a retoma de voos domésticos, tendo Cabinda sido o destino do primeiro avião nesta era pandêmica. As fronteiras internacio­nais abrem-se, igualmente, a partir de hoje, com ligações a Portugal, França (a partir de 24) e Emirados Árabes Unidos (de 1 de Outubro).

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Ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, Pedro Sebastião faz o balanço dos primeiros oito dias do estado de emergência
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Actualizad­o: 20/09/2020 | Fonte: Direcção Nacional de Saúde Pública

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