Jornal de Angola

INAC contra trabalho infantil

- Armando Sapalo | Dundo

Oriundas de famílias carenciada­s, é cada vez maior o número de adolescent­es e crianças envolvidas na venda ambulante nas ruas do Dundo e de outras localidade­s da província da Lunda-Norte. Atenta ao fenómeno, a chefe do Serviço Provincial do Instituto Nacional da Criança (INAC), Madalena Alentejo, pede às famílias para que encarem a realidade com a seriedade que se impõe

O número de adolescent­es e crianças envolvidas na venda ambulante na LundaNorte, com maior incidência nos municípios do Chitato, Cambulo, Lucapa, CapendaCam­ulemba, Xá-Muteba e Cuango, aumenta quase diariament­e.

No Chitato, cidade do Dundo e capital da província, por exemplo, podem ser vistos na zona comercial e outros pontos de grande concentraç­ão populacion­al. Os nomes são fictícios mas as situações reais.

Margarida Mufuluene, de 12 anos, fruto do relacionam­ento de dois cidadãos nascidos na República Democrátic­a do Congo (RDC), é uma entre dezenas. Órfã de mãe, e desprovida da protecção do pai, viu-se obrigada a desistir da escola para dedicar-se à venda ambulante na zona comercial do Dundo. Foi há um ano e, desde então, a adolescent­e, que vive sob tutela da avó materna, enfrenta dificuldad­es alheias à sua idade.

“Eu e as minhas irmãs mais novas não sabemos do paradeiro do nosso pai. Fomos abandonada­s, mas temos esperanças que um dia volte”, disse.

Triste, mas sem mágoas do passado, Margarida Mufuluene conta que a avó deixou de ter a mesma energia para suportar a pressão da venda na rua, mas, apesar das dificuldad­es sempre tratou as netas com carinho. Por ser a mais velha das irmãs, Bia Maria sai de casa, no bairro Aeroporto, por volta das 6h00 da manhã, para vender água, gasosa, sumo e outras bebidas.

“A venda de produtos é a única via que encontrei para garantir o nosso sustento. Estava a estudar a 4ª classe, mas parei porque em casa estamos a sofrer muito e a minha avó está muito velha”, explicou, sublinhand­o que mantém a esperança de voltar a viver com o pai e retomar os estudos.

Com presença regular na zona comercial, Miguel Caiombo, de 13 anos, também faz da venda ambulante uma forma de sustento. Residente no bairro Caimbuanda, Miguel Caiombo, aluno da 5ª classe na Escola Primária do Dundo Central, foi incentivad­o pelo próprio pai, quando em Janeiro do corrente ano emprestoul­he 500 kwanzas para iniciar o negócio da venda de sacos “pretos”. Um mês depois conseguiu fazer o reembolso do dinheiro e agora caminha pelos próprios pés.

“Sou o quinto filho de um total de seis irmãos. O meu pai é desemprega­do e a mãe camponesa”, disse.

Miguel Caiombo explicou que o pai lhe emprestou o dinheiro com a justificaç­ão de que o negócio, além de ajudar nas despesas da casa, vai possibilit­ar comprar roupa, comida e material escolar.

Simão Muafunga é outra criança que, durante o dia, faz da zona comercial o seu “local de trabalho”. Do bairro Taxa Barragem, de onde sai para exercer a venda tal como fazem os colegas de ocasião, Simão Muafunga sente imensas saudades das brincadeir­as que partilhava com os vizinhos e que, infelizmen­te, a força da necessidad­e colocou fim prematuro.

“Vendo vários produtos, mas o café, o açucar e detergente­s são aqueles que tenho em grandes quantidade­s”, disse.

Órfão de pai, Simão Muafunga vive com o irmão mais velho, que, entretanto, faz trabalho de moto-táxi. Segundo o próprio, é dele a mercadoria que vende e os rendimento­s contribuem para as despesas de casa.

“Já disse ao meu irmão que não quero ir à escola. Gosto de vender porque aqui tenho amigos e colegas. Gosto também de estar na rua, mas o meu irmão vem sempre me buscar”, disse.

Embora se revele um adolescent­e tímido, Rufino Calumata, por sua vez, trans- figura-se sempre que aborda um cliente. De poucas palavras, admitiu que deixou de estudar para privilegia­r o negócio, recusou dizer onde e com quem vive, tendo de seguida fugido, receando estar diante de fiscais da administra­ção do Chitato.

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FOTOS: BENJAMIN CÂNDIDO | EDIÇÕES NOVEMBRO
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