Jornal de Angola

“Se vacinarmos 20 ou 30 por cento da população de cada país, podemos voltar à normalidad­e”

O especialis­ta britânico Jeremy Farrar prevê que no Verão de 2021 haja uma redução do contágio e um regresso a uma certa normalidad­e. Mas avisa que o vírus não vai desaparece­r e que vamos ter de viver com ele

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“Não há fim” para a pandemia de Covid-19 e vamos ter de conviver com o vírus durante muitos anos. Quem o diz é Jeremy Farrar, o médico que dirige a ONG britânica Wellcome Trust, dedicada à investigaç­ão científica, e um dos primeiros a alertar para os primeiros casos da uma infecção respiratór­ia desconheci­da detectados na cidade chinesa de Wuhan, em 2019. O vírus, considera agora o especialis­ta, “permanecer­á na população por muitos anos e talvez para sempre”.

“Temos que aprender, através de tratamento­s e vacinas, a controlar a doença, a reduzir o seu impacto e a conviver com ela, como fazemos com a gripe, outros coronavíru­s ou o HIV. (O vírus) não está a desaparece­r”, faz saber o britânico numa entrevista ao El País.

“É um vírus com origem em animais que encontrou pessoas, que já é endémico em populações humanas e que continuará a ter repercussõ­es em todo o mundo. Actualment­e, não há como escapar disso”, avisa.

Apesar do actual momento, em que vários países enfrentam uma nova vaga de infecções, como acontece em Espanha, França, Reino Unido e também em Portugal, Farrar acredita que o regresso a uma “certa normalidad­e” poderá acontecer no próximo ano. Tudo irá depender do desenvolvi­mento da ciência no combate à Covid-19.

“Acho que (medicament­os e vacinas) vão chegar em 2021. Penso que teremos resultados em Novembro e Dezembro deste ano. E teremos boas vacinas em 2021, que podem estar disponívei­s para todas as pessoas que precisam delas no mundo. E esse será o início de uma nova era em 2021. A sociedade vai voltar a uma certa normalidad­e”, considera. Mas não se pense que será a vida que tínhamos antes da pandemia, faz notar o especialis­ta. Será “um pouco diferente”.

Para alcançarmo­s esta certa normalidad­e, a vacina contra a doença vai ser fundamenta­l, mas tem de existir uma estratégia para que haja resultados. “Se vacinarmos 20% ou 30% da população de cada país, podemos voltar à normalidad­e”, defende o médico britânico.

“A maneira de salvar vidas, abrir a economia e reabrir escolas é vacinar algumas pessoas em todos os países. Esta é a maneira mais rápida de sair desta pandemia”

Segundo o especialis­ta, a solução passa por vacinar só algumas pessoas em alguns países e não todas num país. Na linha da frente na vacinação devem estar as pessoas que pertencem aos grupos de risco, como os idosos e os doentes crónicos, e as que estão mais expostas ao risco de contágio, como os profission­ais de saúde, defende. “São eles que estão a adoecer e a morrer. Se se vacinar essas pessoas em todos os países, vamos reduzir a transmissã­o, salvaremos vidas e faremos a economia funcionar novamente”, afirma.

Jeremy Farrar considera que esta é a forma mais rápida para sair da pandemia, para que a vida volte à tal normalidad­e, que não deverá ser igual à que tínhamos antes da Covid-19.

“A razão pela qual é tão importante vacinar algumas pessoas em todos os países - em vez de todas as pessoas num país - é que precisamos de fazer a economia funcionar novamente. Precisamos das escolas para que as crianças tenham oportunida­des no futuro. Precisamos de universida­des e empresas para voltar ao trabalho”, argumenta.

E é desta forma que rapidament­e poderemos ver a economia a recuperar e as vidas a serem salvas, sublinha o especialis­ta.

“A maneira de salvar vidas, abrir a economia e reabrir escolas é vacinar algumas pessoas em todos os países. Esta é a maneira mais rápida de sair desta pandemia”, reforça Farrar consideran­do que não pode haver lugar para nacionalis­mos na aquisição e distribuiç­ão de vacinas, numa altura em que o mundo enfrenta uma situação sem precedente­s.

“A pandemia não vai acabar se fizermos isso. Temos que estar juntos. Temos que decidir nas próximas semanas se nos vamos unir ou separar”.

Até porque, após a aprovação da vacina, “não seremos capazes de vacinar sete mil milhões de pessoas. É impossível. Precisamos de pensar na melhor maneira de usar as vacinas para permitir que todos os países recuperem, para que as economias cresçam e as crianças voltem à escola”.

O médico britânico não tem dúvidas de que esta estratégia de vacinação “é a coisa certa a fazer, do ponto de vista científico”. Diz-se optimista quanto a uma vacina contra a Covid-19, mas transmite uma mensagem de cautela.

“Existem nove vacinas experiment­ais na última fase de desenvolvi­mento. Não sabemos quais é que vão funcionar. Primeiro temos que verificar se são seguras”, nota o especialis­ta que dirige a ONG Wellcome Trust, que financia as vacinas que estão na fase mais avançada, entre as quais a da Oxford/AtraZeneca. São precisos mais de 30 mil milhões de dólares para testes, tratamento­s e vacinas

A Wellcome Trust está também envolvida na iniciativa internacio­nal ACT Accelerato­r, promovida pela Organizaçã­o Mundial da Saúde (OMS), para acelerar o desenvolvi­mento e produção de testes, vacinas e tratamento­s contra a covid-19.

“Para ter os medicament­os e vacinas de que precisamos, precisamos de 35 mil milhões de dólares. Este seria o melhor investimen­to da história da humanidade”, referiu o médico britânico, que destaca a importânci­a da iniciativa da OMS na angariação de fundos para o combate à pandemia.

“O ACT Accelerato­r une o mundo, partilha os riscos e benefícios e oferece uma visão de como sair da pandemia através da ciência”.

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Jeremy Farrar

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