Manaus pode ter atingido a imunidade de grupo
A cidade de Manaus, fortemente atingida pela pandemia de coronavírus, pode ter tido tantos infectados que a sua população já beneficia actualmente da “imunidade de grupo”, aponta um estudo preliminar.
Publicado no site medRxiv, o estudo analisou dados das infecções com modelagem matemática para estimar que 66% da população apresentava anticorpos contra o novo coronavírus em Manaus, onde o ritmo dos contágios foi rápido e brutal.
A percentagem pode ser alta o suficiente para ter ultrapassado o limiar da imunidade de grupo, que acontece quando um número suficiente de elementos de uma população fica imune a uma doença, que não consegue propagar-se mais com eficácia, indicam os autores do estudo, um grupo de 34 investigadores brasileiros e estrangeiros.
“A taxa de infecção excepcionalmente alta sugere que a imunidade de grupo desempenhou um papel significativo na dimensão da epidemia”, escreveram os autores do estudo, que ainda deve ser submetido à revisão por pares.
“Ao que tudo indica, a própria exposição ao vírus originou a queda no número de casos e mortes em Manaus”, assinalou a coordenadora do estudo, Ester Sabino, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), à
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que ajudou a financiar o trabalho.
Manaus foi cenário de caos quando a pandemia atingiu o pico naquela cidade, em Maio. Mas o número de mortos na capital, de 2,2 milhões de habitantes, caiu drasticamente nas últimas semanas, para uma média de 3,6 por dia, nos últimos 14 dias.
É hoje uma das cidades de mais rápida reabertura no país. O Brasil regista o segundo maior número de mortos pela Covid-19 no mundo, mais de 139 mil. Especialistas em saúde avisam que tentar atingir a imunidade de grupo é um caminho perigoso para a formulação de políticas.
“A imunidade de grupo por meio de uma infecção natural não é uma estratégia, é um sinal de que um Governo fracassou no controlo de um surto e está a pagar por isso com vidas perdidas”, escreveu no Twitter Florian Krammer, professor de Microbiologia na Icahn School of Medicine do Hospital Monte Sinai, em Nova Iorque. Outros especialistas advertem que a imunidade ao vírus pode ser de curto prazo.
Manaus regista 2.462 mortes causadas pelo novo coronavírus. Se fosse um país, a cidade teria a segunda maior taxa de mortalidade do mundo, com 100,7 óbitos a cada cem mil habitantes.