Jornal de Angola

Angola a vestir-se de verde semeado e plantado

- Manuel Rui

O angolano, por amor das guerras que ditaram a paz, com a fuga dos campos, com mitologias da “operário-camponesa” ou das culpas para a pequena burguesia, quase se viu despojado das virtudes do chão da terra, tudo era só petróleo e diamantes. Petróleo que se vendia para depois se comprar. Diamantes que foram sendo (de)lapidados por alguns até se concentrar­em na família real de férias “merecidas” em Espanha ou Dubai.

Importava-se comida, até fuba e óleo de palma, pois, importar também era um negócio em prejuízo do povo. O dinheiro de Angola espalhou-se por palácios, palacetes e aviões espalhados pelo mundo e, Luanda, cortadas árvores seculares, foi ocupada por enormes cazumbis a que chamam arranha-céus, onde não mora ninguém e o povo não conhece os donos, apenas, de dia, aproveita a sua sombra e, de noite, tem medo dos fantasmas ou vampiros que habitam essas inutilidad­es de betão.

Altas horas. Demandava enganar a insónia e as doenças. Encontrei a TPA Internacio­nal. Começou o deslumbram­ento do verde tantas vezes exaltado pelos poetas e cantores. Parecia uma fantasia. Festa do aniversári­o da cidade da Quibala (dos Kibalas). Foram muitas as vezes que fiz o percurso de carro para o Waku ou Huambo, parando sempre no mercado da Quibala, ao lado da estrada, inundada de camiões, carros e carrinhas. Chamava miudagem que me traziam as quitandeir­as e eu abastecia-me de fuba, quiabos, óleo de palma em garrafas que tinham sido de cerveja rolhadas com caroço de maçaroca, tomate, cebola, alho daquele pequenino, gentio, que é também medicament­o e ananases. Sim. Grandes plantações de ananases era a memória mais antiga que eu guardava da Quibala. Agora, no ecrã apareciam hectares e mais hectares verdes, plantio arrumado em corredores, máquinas de lavrar e de colher, silos metálicos para guardar o grão, fazendas e mais fazendas com agrónomos nacionais dando explicaçõe­s de ciência sobre uma agricultur­a extensiva e moderna. Afinal enquanto falávamos disto e daquilo, João Lourenço cumpria o princípio de substituiç­ão de importaçõe­s. Mas, segundo um perito explicou já exportamos. Era a amostragem da maior revolução depois da queda da monarquia. A amostragem era de comida de sobra e a continuar assim ninguém mais passará fome extrema porque os preços vão ter que baixar. Não apenas legumes mas frutas que nos podem levar aos sumos como já houve o de maracujá.

Fiquei a meditar naquela abundância e logo me ocorreu a ideia dos trabalhado­res, do emprego e aprendizag­em que geram essas fazendas. Se têm escolas para os filhos dos trabalhado­res. Posto médico. Cantina com linha, agulhas, canivetes e outros de somenos. Campo de futebol. Batuque nas noites de sábado para domingo. E se havia sistemas de semifrio para guardar a fruta até ser escoada e como se fazia o escoamento para não deixar apodrecer a comida para as bocas da nossa gente. E mais me espantei com a agropecuár­ia com vacas todas alinhadas de cabresto e pasto à frente da boca. Lembrei-me das nossas escolas de agronomia e veterinári­a e nos quadros que podem substituir os expatriado­s para a neo-descoloniz­ação.

Foram bons os momentos de ver e ouvir os fazendeiro­s e os agrónomos e veterinári­os. E foi das poucas vezes em que a televisão me soube a pouco inundando a minha imaginação de verde recordando versos de Amílcar Cabral: “…é tempestade que virou bonança.” E ainda fiquei a meditar sobre o relacionam­ento destas fazendas com os pequenos agricultor­es. Se estes vendem ou trocam ou se os fazendeiro­s podem ajudar na formação das cooperativ­as que pagam o trabalho do tractor com milho a colher e a ser moído nas fazendas.

A Quibala faz anos. É assim. A nossa história é descontada no tempo antes do invasor. A Quibala que sempre me impression­ou pelas pedras gigantes, cada uma com suas impressões digitais de acumulação ancestral. Das pedras e dos rios que matam a sede do chão.

Os Kibalas são antigos. Por volta do séc. XVI, Cipala Kia Samba, o “Nana Inene” deslocou-se com o seu povo das bandas a sul de Malanje e fixaram-se em terras que hoje são o Kwanza-Sul. Os kibalas tornaram-se um povo forte que se opôs ao invasor nas chamadas, pelo outro, guerras de pacificaçã­o. Daí o forte ou fortaleza que os portuguese­s começaram a implantar em Angola após a Independên­cia do Brasil.

Os da minha geração, só aprenderam História de Angola portuguesa. Aliás, tudo acontecia primeiro no Ocidente. Até o primeiro homem que desenhou as mais antigas pinturas murais com o bisonte. Tudo mentira. Afinal o primeiro homem e as primeiras pinturas acontecera­m em África. Também os kibalas deixaram pinturas rupestres no Ebo e os túmulos dos grandes reis aparecem pelas vertentes, principalm­ente no cimo dos morros graníticos e há a zona funerária de Catumby.

Não conheço a lagoa do Chindundo. Mas que me dera sentar-me à beira da água, ouvir contar sobre o “Nana Inene” que durou 103 anos e beber kissângua de uma cabaça das mãos da rainha dos kibalas Nzumba Muriango.

Os da minha geração, só aprenderam história de Angola portuguesa. Aliás, tudo acontecia primeiro no Ocidente. Até o primeiro homem que desenhou as mais antigas pinturas murais com o bisonte. Tudo mentira. Afinal o primeiro homem e as primeiras pinturas acontecera­m em África. Também os kibalas deixaram pinturas rupestres no Ebo e os túmulos dos grandes reis aparecem pelas vertentes, principalm­ente no cimo dos morros graníticos e há a zona funerária de Catumby

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