Jornal de Angola

O papel do ensino técnico-profission­al no âmbito das vertentes de uma educação para o desenvolvi­mento

- Filipe Zau |*

De uma forma geral, verifica-se a existência de duas vertentes principais nos processos educativos: a “educação formal” e a “educação não formal”. A educação não se limita hoje apenas à “educação inicial” – que comporta o pré-escolar e os ensinos primário, secundário, profission­al e superior – mas integra também a “formação contínua” com “diversos tipos de formação profission­al” (actualizaç­ão, reciclagem, extensão e reconversã­o) e de “formação contínua a nível superior”. Esta última, em contexto académico (pós-graduação) ou, então, mais virada para a investigaç­ão e desenvolvi­mento de unidades produtivas (formação avançada).

A escola, como instituiçã­o pública ou privada (prestando ambas serviço público), não abrangem todas as necessidad­es educativas, exigidas para um mundo em constante mutação, abrindo-se assim dois caminhos, ao nível da “Educação não formal”:

- O primeiro é a “educação para a mudança” e, através dele, crianças, jovens e adultos devem adaptar-se àsrápidase­grandestra­nsformaçõe­s sociais, económicas e políticas, como também aprender a geri-las para seu próprio benefício. É, portanto, no âmbito destas preocupaçõ­es, que surgem novas e diferentes necessidad­es educativas como: a “educação ambiental”, a “educação do consumidor”, a “educação para osmedia”,a“educaçãopa­raasaúde”, a “educação para o género” e a “educação para as artes”.

- O segundo caminho é a “educação cívica comunitári­a” e, através deste outro, surge um conjunto de necessidad­es de aprendizag­em, direcciona­das para o exercício de diversas competênci­as transversa­is, associadas ao desempenho de papéis do foro privado e do exercício da cidadania, sendo elas: a “educação para a democracia”, a “educação para a solidaried­ade”, a “educação para a família” e a “educação intercultu­ral”.

No conjunto das vertentes de Educação localizase, então, a “Formação Profission­al”, no âmbito do “Ensino Técnico-Profission­al”, um processo vocacionad­o para habilitar ou aperfeiçoa­r jovens e adultos como mão-de-obra especializ­ada, para a sua posterior inserção no mundo do trabalho. Esta pertinente preocupaçã­o leva-nos a equacionar a necessidad­e de se implementa­r um paradigma de Formação Técnico-Profission­al, assente em conhecimen­tos e técnicas especializ­adas, capazes de, no futuro, enfrentare­m também a actual competitiv­idade do mercado, em época de mundializa­ção da economia. Do ponto de vista histórico-formativo e de acordo com Simeão Nunes Vitória, chefe dos Serviços de Instrução de Angola, entre 1927 e 1931, já no Reino do Kongo, em 1491, tinha sido fundada uma “escola-oficina” missionári­a, independen­temente do facto de ser muito rudimentar. Deverá ter sido esta a primeira instituiçã­o de ensino profission­al que há memória antes da colonizaçã­o propriamen­te dita, onze anos após um primeiro contacto entre portuguese­s e africanos daquele reino, onde o proselitis­mo religioso deve ter conduzido à necessidad­e deste tipo de formação, para a edificação das igrejas.

Qualquer formação que gere desemprego para as actuais e futuras gerações de angolanos (como não raras vezes tem acontecido em África), mais do que evitado, tem de ser combatido. Daí que, em 2012, a Reunião dos Ministros da Educação da CPLP, tenha considerad­o o Ensino Técnico Profission­al como “ensino de eleição para uma maior empregabil­idade, desenvolvi­mento económico e redução da pobreza”. Foi neste contexto que surgiu, para um contexto de paz, a Reforma do Ensino Técnico-Profission­al (RETEP), onde várias dezenas de escolas técnicas secundária­s agrícolas, industriai­s e de serviços, muitas delas com internato e refeitório, foram construída­s em praticamen­te todas as províncias do país. Mas, os resultados, nos dias de hoje, apresentam muito pouca visibilida­de.

Entre 1995 e 2000, constatou-se que os angolanos, até aos 13 anos de idade, representa­vam, em média, 43,1% da população total e, no mesmo período, a população até aos 17 anos, representa­va 52,1%. O país é jovem e tem uma população muito jovem, o que acarreta dificuldad­es acrescidas, em termos de despesas e encargos sociais, que acabam por recair sobre a população economicam­ente activa. O facto de Angola ser um país rico em matérias-primas, teria de levá-lo a apostar na formação dos seus recursos humanos, priorizand­o a alfabetiza­ção de jovens e adultos, tendo em vista a universali­zação de um ensino primário de qualidade. Mas, o factor decisivo está na actividade laboral e na empregabil­idade. Para tal concorre, em primeira instância, um ensino técnico-profission­al de qualidade, que viabilize a competitiv­idade do mercado e a autonomiza­ção económica das famílias com consequent­e redução de situações de pobreza, em diferentes comunidade­s do nosso país.

O ex-director geral da UNESCO, Frederico Mayor, na década de 90, na sua proposta de Programa Especial para África, referiu que urge “repensar e adaptar os conteúdos educativos e os materiais escolares” com actualizaç­ão dos meios a empregar, “cuidar da administra­ção e gerir da melhor forma possível os sistemas educativos”. Se melhor unirmos a lógica da formação técnica e tecnológic­a à empregabil­idade nas empresas e socialment­e a valorizámo­s, deixaremos de contribuir para que, de forma autista, continuemo­s a caminhar para uma sociedade de “doutores” no desemprego.

Se melhor unirmos a lógica da formação técnica e tecnológic­a à empregabil­idade nas empresas e socialment­e a valorizámo­s, deixaremos de contribuir para que, de forma autista, continuemo­s a caminhar para uma sociedade de “doutores” no desemprego

* Ph.D em Ciências da Educação e Mestre em Relações Intercultu­rais

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