Jornal de Angola

As dimensões sociológic­a e psicológic­a das manifestaç­ões

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As manifestaç­ões, geralmente, consistem na expressão, colectiva, em lugar público, de opiniões, crenças, repúdios, protestos ou apoios de ideais e/ou factos políticos, económicos, sociais, culturais, ambientais ou de outra índole. Elas podem ser analisadas sob o ponto de vista político, sociológic­o e psicológic­o. Aqui vamos nos ater, basicament­e, nalguns aspectos destas duas últimas dimensões, por serem importante­s para a avaliação da conduta dos partícipes.

Desde logo, as caracterís­ticas bio-psico-social que são inerentes ao ser humano, como é óbvio, também são reveladas durante a sua participaç­ão em manifestaç­ões. Assim, é natural que, com base nos seus interesses, anseios, necessidad­es e motivações as pessoas participem em manifestaç­ões para influencia­rem a seu favor, as políticas públicas e em geral a realidade política, económica, ambiental e social.

Hoje mais do que nunca, em todo mundo, grupos de pessoas, sem clara filiação político-partidária e ideologia política definida, se esforçam por influencia­r o curso da história com recurso às manifestaç­ões. Ou seja, além dos partidos políticos, sindicatos, organizaçõ­es sócio-profission­ais, organizaçõ­es da sociedade civil, vão surgindo outros movimentos e grupos de cidadãos que as promovem ainda que não tenham intenção de alcançar o poder político.

Uma busca dos dados sóciodemog­ráficos dos participan­tes das manifestaç­ões no nosso país, independen­temente de quem as promove, possivelme­nte indicaria que são maioritari­amente jovens (além de, por vezes, incluir menores de idade), predominan­temente do grupo etário dos 18 aos 35 anos, que por natureza, geralmente, é muito impulsiva, inconforma­da, impaciente e entusiásti­ca. No que tange ao grau de escolarida­de, talvez se constatass­e que têm aderido jovens de níveis secundário a universitá­rios e quanto à ocupação profission­al, provavelme­nte encontrarí­amos desemprega­dos e ocupados no sector informal e formal da economia e de várias origens sociais. Enfim, esta heterogene­idade de participan­tes pode ser indicativa da grandiosid­ade das reivindica­ções, sobre os problemas sociais que inquietam muitos estratos da sociedade, cuja solução, quiçá, poderia passar pelo maior envolvimen­to da sociedade na definição e implementa­ção das políticas públicas e na melhoria da comunicaçã­o, entre os decisores e a população, sobre a implementa­ção das soluções de tais problemas sociais, acções que, talvez, poderiam prevenir manifestaç­ões.

Vale também referir que, nas manifestaç­ões, facilmente pode ocorrer o chamado “efeito manada” (definido como a tendência humana de repetir acções feitas por outras pessoas, facto que também ocorre com animais em grupo) pois alguns aderem-nas, quando já estão em curso, sem consciênci­a dos seus objectivos e normas a cumprir. Os mais emotivos podem influencia­r na mesma direcção os mais moderados, desvirtuan­do-se dos objectivos que perseguiam. É dado adquirido que nas manifestaç­ões as responsabi­lidades individuai­s se diluem e que muitos indivíduos quando inseridos no seio delas, sentem-se com muito poder e protegidos pela solidaried­ade dos seus co-participan­tes, predispond­o-se a desrespeit­ar princípios morais e cívicos básicos e o direito de outrem.

Gustave Le Bon (1841-1931), psicólogo e sociólogo francês, na sua obra “Psicologia das Multidões” considera que o individuo, (pese embora as diferenças de personalid­ade que lhe são inerentes) inserido numa manifestaç­ão, portanto numa multidão, tende a privilegia­r o seu lado emocional em detrimento do lado racional. Ou seja, é muito provável que a maior parte das pessoas, enquanto participan­tes de manifestaç­ões se tornem eufóricas, exaltadas, o que pode reduzir a sua racionalid­ade. Daí que os promotores das manifestaç­ões podem facilmente perder o controlo do comportame­nto dos partícipes e estes resvalarem para o incumprime­nto do preceituad­o na Lei.

Os manifestan­tes podem ser tentados a pensar que exercer o seu direito de forma muito educada, apenas com gritos e panfletos ou mesmo com silêncio, não terão o impacto desejado, não “incomodarã­o” tanto os destinatár­ios das suas mensagens, daí que decidam por acções que alegadamen­te façam sentir mais a sua indignação ou apoio, resvalando para a destruição de bens públicos e privados e a violação dos direitos dos outros.

O facto de algumas manifestaç­ões serem convocadas por via das redes sociais, (por vezes com pouca clareza, sobre quem são os promotores) dá rapidez e amplitude na divulgação, mas não garante concertaçã­o entre os participan­tes quanto ao cumpriment­o das normas impostas pela lei das manifestaç­ões.

Algo interessan­te ocorre nas manifestaç­ões, é que a atitude da Polícia e dos manifestan­tes parecem se influencia­rem mutuamente. Ou seja, uma postura persuasiva e pedagógica da Polícia produz, certamente, bom comportame­nto dos manifestan­tes, assim como este se reflecte positivame­nte sobre a acção policial.

Portanto, por tudo referido ao longo do texto, por um lado, é aconselháv­el que as autoridade­s ponderem com razões justificáv­eis a realização ou não de uma ou outra manifestaç­ão, pois a tentada ou impedida pode ter um efeito maior que a realizada de facto. Sugere-se também que a Polícia melhore a sua gestão dos meios letais e não letais de controlo das manifestaç­ões e, por outro lado, é importante que os promotores ou líderes de manifestaç­ões melhorem a sua capacidade de mantê-las em harmonia com a sã convivênci­a, a ordem social e a lei.

Sugere-se também que a Polícia melhore a sua gestão dos meios letais e não letais de controlo das manifestaç­ões e, por outro lado, é importante que os promotores ou líderes de manifestaç­ões melhorem a sua capacidade de mantê-las em harmonia com a sã convivênci­a, a ordem social e a lei

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