Jornal de Angola

“Sociedade discrimina e maltrata essas crianças”

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O director-geral do Instituto Nacional da Criança (INAC) disse ao Jornal de Angola não ter conhecimen­to de crianças portadoras de hidrocefal­ia que tenham sido sacrificad­as por familiares, em rituais.

Paulo Kalesi afirma terem chegado ao INAC várias denúncias de maus-tratos e discrimina­ção a esse grupo de crianças, geralmente acusadas de feiticeira­s.

“Sofrem actos de violência psicológic­a e física. São violentada­s, sobretudo, fisicament­e, porque os pais e outros familiares não estão preparados para lidar com isso. Associam logo a doença à feitiçaria. Não temos o registo de que há casos em que são sacrificad­as. Seríamos os primeiros a gritar bem alto à sociedade”, disse o director, que prometeu trabalhar mais com as comunidade­s para averiguar o assunto.

Sobre as queixas que chegam ao instituto que dirige, Paulo Kalesi disse que o INAC tem realizado trabalhos de sensibiliz­ação e orientado os pais a procurar ajuda nos lugares certos. A par disso, promove encontros entre pais de crianças com hidrocefal­ia, por forma a que os mais experiment­ados troquem experiênci­a com pais que ainda estão a aprender a lidar com a doença.

“Juntamos profission­ais de saúde aos pais, para informá-los que essas crianças têm direito de ser protegidas, cuidadas e amadas. Isso tem sido uma terapia. Também temos recebido, com muito agrado, casais que tenham passado por isso. Vêm passar aos outros a sua própria experiênci­a de vida e a maneira como superaram ou aprenderam a viver com a doença do filho. Temos pais que abandonara­m as esposas com o filho doente, mas depois voltaram e hoje ajudam as esposas a cuidar dos filhos”, contou.

Paulo Kalesi lamentou o facto de algumas famílias esconderem do mundo crianças que nasçam com esse problema, temendo maustratos de terceiros.

“Famílias há que trancam as crianças no quarto. Crescem sem que os vizinhos, sequer, saibam da sua existência. Há o caso de um menino que os vizinhos só conheceram quando já tinha 14 anos. E habituaram-se a ele. Aceitaram-no assim. Temos sensibiliz­ado as famílias a não esconderem as crianças. Hoje, a sociedade já não tolera a violência contra a criança. Já tivemos o caso de uma mulher que denunciou o marido, porque se separou da primeira mulher e não dava sustento aos filhos que tinha com esta. E há amigos de pais que, apercebend­o-se que estes não sustentam os filhos, pedem anonimato e os denunciam”.

Nestes casos, informa Paulo Kalesi, o INAC, através do seu centro de mediação de conflitos familiares, notifica e convoca as famílias. 80 por cento dos conflitos são resolvidos. Os casos de pais que prometem mudar de atitude e não o fazem são remetidos à área de violência doméstica do Serviço de Investigaç­ão Criminal (SIC) e ao Tribunal da Família. Entretanto, a morosidade no tratamento de alguns processos leva algumas mulheres a desistir.

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EDUARDO PEDRO | EDIÇÕES NOVEMBRO

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