O fim da pós-verdade?
O Colégio Eleitoral dos Estados Unidos confirmou terça-feira a vitória de Joe Biden nas eleições presidenciais de 3 de Novembro e, com isso, esfumaram-se as últimas esperanças que Donald Trump ainda alimentava de poder estragar a festa dos democratas.
Ninguém,alémdeTrumpedosseusferrenhosseguidores,acreditava que pudesse haver uma reviravolta. Embora as eleições presidenciais nosEstadosUnidossejamindirectas,osresultadosobtidospelachapa Joe Biden-Kamala Harris asseguravam margem confortável para o ColégioEleitoralconfirmarapenasoqueasurnastinhamdeterminado. OPresidente-eleitodosEUAganhou306delegadosnoColégioEleitoral, contra 232 de Donald Trump - 74 votos a mais que Trump, 36 votos a mais do que precisava para ser eleito. Trump nem perto dos 270 delegados - o mínimo para ser reeleito - esteve.
Internamente,osamericanosesperamquea20deJaneiroonovo inquilino da Casa Branca dê início a todo um trabalho destinado a desmontar a deriva autoritária em que a América estava a mergulhar.
Com Trump, as fake news (notícias falsas divulgadas principalmente através das redes sociais como se fossem verdadeiras) ganharam outra projecção. Elas notabilizaram-se, sobretudo, no calor da disputa eleitoral de 2016, que opôs o Presidente cessante à candidata Hillary Clinton, durante a qual a equipa de campanha de Donald Trump fez recurso a uma chuva de conteúdos falsos sobre a candidata democrata, que foram partilhados de forma intensa pelos seus apoiantes.
A produção e divulgação de falsas informações não é um fenómeno novo. Joseph Goebbels (1897-1945), Ministro da Propaganda da Alemanha Nazista, ficou particularmente famoso por defender o principio de que uma mentira repetida várias vezes torna-se verdade. Asfakenewstêmnasuaorigem todaumapráticaeumahistória destinada a falsear a verdade dosfactos.Atreladaaela,vimos também como o conceito de pós-verdade ganha cada vez mais notoriedade e os especialistas da comunicação procuraram esmiuçar a essência e os contornos do que estava a acontecer.
Em 1992, o cineasta Steve Tesich, em artigo publicado na revista The Nation, definia a pós-verdade como “uma espécie de inclinação social em que a verdade não era tão importante quanto que se imaginava que era verdadeiro”. Transposto para a realidade da campanha eleitoral de 2016 (Donald Trump versus Hillary Cinton), a ideia foi resumida nos seguintes termos: “na hora de criar e modelar a opinião pública, os factos objectivos têm menos influência que os apelos às emoções”. E é isso que as fake news exploram, essencialmente nas redes sociais, sendo o seu poder de persuasão maior em ambientes de menor grau de escolaridade, não deixando também de provocar estragos mesmo em segmentos sociais onde é suposto as pessoas estarem mais esclarecidas, mas em que a atitude acrítica (de acolher e aceitar logo a primeira informação como verdadeira) prevalece.
Infelizmente para o jornalismo, hoje, as fake news disseminaram-se de tal forma que já se fala até na existência de uma indústria de informações falsas. Nas redes sociais, são criados perfis falsos que espalham informações, vídeos, etc., sem obedecer ao rigor que o jornalismo exige e há quem confunda isso com jornalismo. Nada mais errado!
Em Angola, as redes sociais estão infestadas de falsas notícias que têm vindo a merecer os mais diversos desmentidos. É fácil descortinar o propósito com que elas são produzidas e postas a circular. O conceito de pós-verdade partilhado nas linhas atrás esclarece a finalidade que o(s) autor(es) pretendem atingir. Ou seja, o estado de opinião que se pretende criar.
Por isso, não me espanta que uma tal de Joana Clementina tenhapostoarolarumalistadeeventuaisbeneficiáriosdepagamentos do GRECIMA, na qual incluiu o meu nome. Essa lista não é nova e, aqui mesmo neste espaço, quanto tomei conhecimento da sua existência, reagi dizendo que achava que o autor da partilha do post, se calhar, andava a receber por mim a tal remuneração sem eu saber, porque nunca fui recrutado pelo Grecima, nunca soube da existência de tal lista e nunca recebi um tostão furado sequer.
A verdade é que, se não existissem as redes sociais, talvez a Joana Clementina andasse desempregada, porque fazer jornalismo não é o mesmo que andar escondido em perfis falsos nas redes sociais e lançar calúnias e difamação quando bem lhe apetece e não está de barriga estendida. Se as coisas funcionassem a sério, como noutras realidades, eu até iria correr atrás de uma indemnização calculada no valor da dita remuneração vezes o número de partilhas feitas.
Acredito, entretanto, que um dia as redes sociais vão deixar de ser, em Angola, um antro para o jogo de bater e esconder a mão.
A verdade é que, se não existissem as redes sociais, talvez a Joana Clementina andasse desempregada, porque fazer jornalismo não é o mesmo que andar escondido em perfis falsos nas redes sociais e lançar calúnias e difamação quando bem lhe apetece e não está de barriga estendida