Jornal de Angola

Declaradas inconstitu­cionais normas sobre escutas telefónica­s

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Algumas normas sobre as escutas telefónica­s, previstas na Lei nº 11/20, de 23 de Abril, sobre a Identifica­ção ou Localizaçã­o Celular e Vigilância Electrónic­a, aprovada pela Assembleia Nacional, foram considerad­as inconstitu­cionais pelo Tribunal Constituci­onal.

Trata-se do nº 3 do artigo 6º, nº 3 do 8º e os artigos 17º, 18º, 19º, 20º, 21 e 22 daquela lei, que atribuem competênci­as ao Ministério Público para ordenar, autorizar e validar as escutas e gravação ambiental em locais privados ou de acesso vedado.

A decisão do Tribunal Constituci­onal (TC) consta no acórdão nº 658/2020, de 15 de Dezembro, na sequência de um processo de fiscalizaç­ão sucessiva da constituci­onalidade, intentado pela Ordem dos Advogados de Angola (OAA).

Na sua fundamenta­ção, a OAA refere que, no que respeita às interferên­cias, em conformida­de com o Pacto Internacio­nal dos Direitos Civis e Políticos, a legislação relevante tem de especifica­r, pormenoriz­adamente, as circunstân­cias exactas nas quais tais interferên­cias podem ser autorizada­s e que a decisão de utilizar estas interferên­cias autorizada­s só poderá ser tomada pela autoridade designada nos termos da lei e caso a caso.

“Deve ser proibida a vigilância, quer electrónic­a, quer de outra forma, intercepçõ­es de comunicaçã­o telefónica­s, telegráfic­as e outras formas de comunicaçã­o, escutas e gravação de conversas. Qualquer acto desta natureza, sem justificaç­ão fundamenta­da e autorizaçã­o de um juiz é contrário às obrigações do Estado, assumidas com ratificaçã­o do Pacto Internacio­nal sobre os Direitos Civis e Políticos”, lêse no acórdão.

A Assembleia Nacional, na contestaçã­o, considera que a solução encontrada de atribuir competênci­as ao Ministério Público era transitóri­a, para vigorar enquanto não se implementa­sse o juiz de garantia, que substituir­á o Ministério Público nestas e outras situações em que estiverem em causa direitos, liberdades e garantias fundamenta­is dos cidadãos.

“Entendeu a Assembleia Nacional que essa solução transitóri­a é a que melhor protege, no momento, o Estado e os cidadãos da actividade criminosa organizada que, materialme­nte, em muitos casos, é limitadora do exercício dos direitos e liberdades dos cidadãos”, lê-se, igualmente, na contestaçã­o do Parlamento, constante no acórdão.

A Assembleia Nacional está consciente de que as escutas telefónica­s devem ser realizada apenas mediante autorizaçã­o de um juiz, enquanto não for instituído o juiz de garantia. Estabelece­u, igualmente, que a actividade de escutas telefónica­s não pudesse ser feita na fase da instrução preparatór­ia.

Os dez juízes do Tribunal Constituci­onal que decidiram o processo deram provimento à acção intentada pela OAA e declaram inconstitu­cional as normas que atribuem competênci­as ao Ministério Público para ordenar, autorizar e validar as escutas e gravação ambiental em locais privados e condiciona­dos ou de acesso vedado.

Ao abrigo do nº 2 do artigo 230º da Constituiç­ão, conjugado com alínea d) do artigo 27º da Lei nº 3 /08, de 17 de Junho - Lei do Processo Constituci­onal, podem requerer a declaração de inconstitu­cionalidad­e abstrata sucessiva o Presidente da República, 1/10 dos deputados em efectivida­de de funções, os grupos parlamenta­res, o Procurador Geral da República, o Provedor de Justiça e a Ordem dos Advogados de Angola.

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