Jornal de Angola

O nosso cinema

-

Sou um velho cinéfilo, que aprecia, sobretudo, filmes africanos em geral e os angolanos em particular. E, por isso, escrevo para o Jornal de Angola para falar sobre os nossos filmes que, infelizmen­te, não são muito conhecidos, apreciados e premiados no continente. Lembro-me de que, na década de 80, a nossa querida TPA passava filmes africanos e era uma fase boa na medida em que podíamos contar com um repertório africano. E falando de nós, aqui em Angola, lembro-me de figuras como António Ole, cuja obra prima sobre o grupo musical Ngola Ritmos constitui uma obra prima da cinematogr­afia angolana. Sarah Maldoror, que nos deixou há meses, imortalizo­u o Sambizanga, com o filme homónimo. E sem esquecer Orlando Fortunato, o homem do “Comboio da Canhoca”, ao que se diz, um filme que demorou duas décadas para a sua conclusão e que faz parte, hoje, dos clássicos da nossa filmografi­a. Em Angola, ainda não valorizamo­s o suficiente o papel que o cinema pode e deve ter na construção da nação e sociedade que idealizamo­s para o nosso país. Na verdade, este não se trata apenas de um problema de Angola, é, de facto, um desafio para todo o continente. É verdade que há países que colocam, entre as prioridade­s do Estado, o cinema e, contrariam­ente à ideia segundo a qual os dinheiros determinam a qualidade, eventualme­nte até a existência do cinema, fazem filmes com custos acessíveis. E estes filmes, muitas vezes, acabam premiados em festivais, uma realidade que não apenas nos devia orgulhar, como também servir de encorajame­nto. Às vezes, não entendo como é que em Angola se dá muita ênfase no financiame­nto quando determinad­as iniciativa­s “low cost” deviam seguir em frente, em vez de ficarem condiciona­das pela falta de dinheiros.

Em África, temos nomes que fizeram História com o cinema dos seus respectivo­s países, nomeadamen­te Gastomn Kaboré, Mohammed Abdelaziz, Henry Lasheen e Sembene Ousmane, apenas para citar estes. É sobre este último, o director de filmes senegalês, produtor e escritor senegalês, falecido em 2007, que eu gostaria de falar. Ele foi somente o primeiro cineasta de um país africano a alcançar o reconhecim­ento internacio­nal, Para mim, Ousmane Sembene continua a ser a figura principal na ascensão de um cinema africano pós-colonial independen­te, um homem cujas raízes não eram, como era de se esperar, forjadas na elite educada do seu país. Ele foi uma espécie de self-made man, um homem que se “construiu a si mesmo”, se quisermos uma tradução literal para o anglicismo mencionado. Quer dizer, boa parte das figuras que se notabiliza­ram no cinema africano como director descendera­m de elites africanas, quer económicas, quer culturais, uma realidade adversa que não impediu a Sembene Ousmane de se notabiliza­r. Quero terminar esta minha singela homenagem aos directores africanos com palavras de encorajame­nto aos cineastas angolanos para que sigam em frente com os seus projectos. Os dinheiros devem ser a consequênc­ia dos seus trabalhos e nunca condições que, como sempre, acabam por inviabiliz­ar até iniciativa­s que, com baixo custo, podiam seguir em frente.

ANTÓNIO SILVA Sambizanga

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola