Jornal de Angola

Somente para ti, Luanda

- Luciano Rocha

Estas linhas, publicadas no primeiro dia de mais um ano, são apenas para ti, Luanda, desprezada por tantos dos teus filhos, os que nascestes e os que acolheste como teus, a todos de braços abertos.

Esta mukanda, Luanda, que nasceste para ser bonita como nenhuma, mas desde cedo sofredora ao veres teus filhos escravizad­os pelos ocupantes, mas, também, pelos que te rejeitaram, na mira de benesses dos invasores, é escrita em nome daqueles que não te renegam. Pelo contrário, indignam-se com o desdém a que continuas votada pelos que apenas serviram de ti. E são tantos, cada vez mais, quando, em tempos de sonhos que nos ensinaste a ter para resistir, chegámos a pensar que seriam sempre cada vez menos.

Neste início de mais um ano gostava de partilhar contigo coisas novas, por exemplo, que serias melhor tratada, deixavas de ser desventrad­a, passavam a tratar-te das árvores em vez de abatê-las ou esperar que morram de sede para te restituíre­m as sombras boas; acabavam, no tempo seco, com as lagoas das chuvas sem esperarem que elas cheguem para dizerem que o vão fazer, “quando o tempo melhorar”; iam tirar-te da escuridão que te cobrem as noites e apagar candeeiros públicos acessos na hora do meio-dia; todos os teus filhos iam ter água que lhes falta em casa e escorre pelas ruas; deixavas de ser incomodada pelos desafios à impunidade espelhados nas kinguilas, nos motoqueiro­s e falsos reguladore­s de trânsito; te livraram de placas toponímica­s insultuosa­s à dignidade angolana e de centrais de consumo dos novos ricos, que servem estranhos interesses; não havia gente a vasculhar restos de comidas nos contentore­s, nem a dormir sem tecto.

A lista de tristezas, que conheces tão bem, principalm­ente neste tempo de pandemia, é vastíssima, não vale pena prosseguir. Restate saber. Luanda, que não estás sozinha. Ao pé de ti e muito longe, até no estrangeir­o, tens filhos que te não esquecem, a sofrer por ti e contigo.

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