Jornal de Angola

O longo caminho de casa à escola

Professore­s e alunos do município da Quiçama são autênticos guerreiros. Devido à dispersão de bairros e aldeias, há alunos que percorrem muitos quilómetro­s a pé para assistirem às aulas

- João Pedro

Aos 15 anos de idade, Manuel Baptista vê-se obrigado aatravessa­rorioLonga,através de uma canoa a motor, e depois percorre 14 quilómetro­s a pé, para chegar à escola. Apesar da distância, o adolescent­e, que sonha ser engenheiro civil para seguir os passos do tio, que trabalha na barragem de Capanda,nãodesiste.Écorajoso. Faz um grande esforço para nunca atrasar ou faltar às aulas.

“Quero contribuir para a melhoria das condições sociais da população do nosso país, mas para isso tenho de estudar muito, e depois ir viver na cidade de Luanda para prosseguir com os estudos. Aqui não tenho como conseguir atingir os meus objectivos”, disse, tendo sublinhand­o que a maioria dos membros da sua família se dedica à actividade agrícola.

“O meu pai não quer que eu siga este caminho. Ele defende que não podemos ser todos camponeses, por isso me incentiva sempre a estudar”, explica. Pelo esforço que os pais são obrigados a fazer, para que não lhe falte material didáctico, roupas e alimentaçã­o, Manuel Baptista diz não estar disposto a desiludi-los. Está determinad­o em estudar, apesar do sofrimento que enfrenta para chegar até à escola.

“Houve um dia em que faltou pouco para cairmos da canoa e morrermos afogados. “Graças a Deus, o meu tio foi muito hábil e conseguimo­s chegar sãos e salvos no outro lado da margem do rio. Mas no dia seguinte não perdi a coragem. Preparei-me cedo e fui à escola”, lembra.

Nem mesmo em tempo da pandemia Covid-19, as dificuldad­es se tornaram em grandes empecilhos para os alunos matriculad­os no município da Quiçama, província de Luanda, onde as direcções das escolas criaram condições para a higienizaç­ão das mãos e distanciam­ento físico entre os alunos, nas salas de aula, sob a supervisão dos professore­s.

O director municipal da Educação da Quiçama, Joaquim Cabungula, disse que apesar das restrições impostas pelas autoridade­s sanitárias do país, pelo menos 2.967 alunos das classes de transição (7ª, 8 ª, 10ª e 12ª), bem como das classes de exame (6ª, 9ª e 11ª), participam nas aulas em massa e de forma activa.

“Todos os alunos que recebem aulas presenciai­s seguem as normas definidas pelo Ministério de Educação. E com o apoio dos professore­s, pais e encarregad­os de educação, o processo de ensino-aprendizag­em, nesta região de Luanda, decorre sem grandes sobressalt­os”, disse o director municipal da Educação.

Novas infra-estruturas

No município de Quiçama, o número de estabeleci­mentos de ensino é insuficien­te para atender os milhares de crianças e jovens ávidos de estudar. Apenas 22 escolas funcionam na localidade. Agora, no âmbito do Plano Integrado de Intervençã­o nos Municípios (PIIM), a localidade foi contemplad­a com projectos de construção de dez escolas. Neste momento, já decorrem as obras de oito estabeleci­mentos de ensino. “Quando as obras terminarem, não haverá mais crianças a percorrer distâncias muito longas”, disse o director da Educação da Quiçama.

Segundo Joaquim Cabungula, as novas escolas estão a ser erguidas para facilitar a implementa­ção de vários cursos técnicos. “Com isso, será possível ter aqui uma escola de formação de professore­s, um instituto agrário, um politécnic­o, e um instituto médio de saúde”.

“Os nossos alunos, quando querem frequentar cursos técnicos, deslocamse para outras localidade­s da província de Luanda. Doravante, vão ter muitas opções sem precisarem de sair da Quiçama”, destacou o responsáve­l.

Dispersão de aldeias

No município falta de tudo um pouco. Os sectores da Educação e Saúde, por exemplo, enfrentam sérias dificuldad­es, devido à distância que separa a sede municipal das comunas. “É aqui que reside a nossa maior dificuldad­e, porque as vias de acesso não são favoráveis”, referiu Joaquim Cabungula.

Dada a complexida­de geográfica e os obstáculos nas vias de acesso às comunas e aldeias, o Jornal

de Angola teve de passar pelo município da Quibala, província do Cuanza-Sul, para chegar à comunidade de Dala Caxi, onde até camiões de grande porte chegam com grandes dificuldad­es.

Não é fácil atingir as áreas do Waco, Catamba, Caxilu, Zemba e Longa Zemba, onde a população já se habituou a percorrer a pé, distâncias muito longas, para alcançar os seus objectivos.

“Devido a dispersão populacion­al, infelizmen­te ainda temos alunos que percorrem longas distâncias até chegar à escola. Os professore­s e alunos do município da Quiçama são autênticos guerreiros”, afirma.

Na localidade de Cacharanda­nda, os alunos atravessam o rio Longa em canoas, e de seguida caminham cerca de 14 quilómetro­s. “Uns têm de sair da comuna do Lumbondo para estudar no município do Porto Amboim, no Cuanza-Sul.

“Devido a dispersão populacion­al, infelizmen­te ainda temos alunos que percorrem longas distâncias até chegar à escola. Os professore­s e alunos do município da Quiçama são autênticos guerreiros”, afirma.

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ALBERTO PEDRO | EDIÇÕES NOVEMBRO

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