Os debates poderão ser decisivos para esclarecer o eleitor
Como em vários temas da vida política, há, para o bem e para o mal, um efeito de contágio entre a realidade portuguesa e a angolana. Nos últimos dias, realizaram-se na mídia portuguesa quinze debates frente a frente entre os seis principais candidatos a Presidente da República. Os programas repartiram-se por todas as televisões e durante uma semana dominaram a atenção dos portugueses e estrangeiros, como nós.
Nas nossas últimas eleições gerais, praticamente não tivemos debates. A oposição contestou isso, mas também não fez muito alarido. O partido no poder simplesmente não deu cavado.
É pouco crível que para as eleições de 2022 as coisas se passem do mesmo modo. As circunstancias são totalmente diferentes, a começar do facto de termos hoje um crescimento da UNITA e uma necessidade do partido no poder baterse pela defesa do lugar. Hoje, todos sabem que as eleições não serão favas contadas para ninguém e, nestas condições uma “política de cadeira vazia” prejudicará os ausentes.
Acresce-se a isso o facto dos tempos de antena dos concorrentes se terem revelado na altura um fracasso. Depois do impacto inicial, o interesse caiu grandemente por causa do desnível das abordagens entre as candidaturas; qualidade técnica dos audiovisuais e do conteúdo dos programas de governação. Basicamente, o que as últimas eleições nos disseram é que os tempos de antena não traziam informação nem atractividade bastantes para esgotar a expectativa que as pessoas tinham de mudar ou consolidar a sua opinião sobre os concorrentes.
Em favor da ideia da inevitabilidade dos debates em 2022, queremos juntar mais três ideias: Em primeiro lugar, o facto de ter crescido na nossa sociedade o pensamento crítico, o que aumenta o número de bolsas de opinião divergente e a necessidade do debate. Em segundo, a longevidade da pré-campanha, que praticamente já começou. O desgaste dos temas, o facto de estarmos a viver a pandemia, vai dificultar as campanhas de rua e os banhos de multidão, deixando o “confronto” para a mídia. Em terceiro lugar o facto de terem aparecido mais rádios e uma massificação das redes sociais, o que abre também um novo mercado mediático que pede por ser alimentado com informação geralmente produzida em debates como as picardias, gaffes, provocações e insultos entre os candidatos. Os noticiários necessitam dessa nova realidade informativa para resumos para ajudar quem assistiu a formar a opinião e quem não assistiu a ficar informado.
Na situação económica do país (aumento da pobreza, do desemprego e acentuada queda do poder de compra), estão criadas as condições políticas para o aparecimento de candidatos de boa conversa e “sábias” soluções milagrosas. É nesse contexto que o debate deve permitir um confronto de ideias a partir do qual o eleitor possa buscar informações correctas sobre os candidatos, analisar se as propostas são viáveis e formar opinião sobre as tais propostas de solução.
Os debates poderão ser decisivos para esclarecer o eleitor que queira exercer o voto consciente e poderão ser também um meio para trazer a público assuntos impopulares, que muitos candidatos procuram evitar nas campanhas. Ora, aí não há tabus e temas proibidos.
Um elemento psicológico de avaliação dos candidatos é a experiencia do debate que permite ao eleitor comparar e avaliar o comportamento dos candidatos sob pressão.
Mas o debate também pode responsabilizar o eleitor. A tendência dos processos democráticos de hoje marcados pelo fake news e pelo marketing digital agressivo “elege qualquer um”, desde que faça promessas e se mostre anti-sistema. Ora, o debate é um dos últimos redutos onde, muitas vezes, alguns desses candidatos milagreiros e fala-baratos são desmascarados ou, também acontece, consolidam os seus projectos. Cabe ao eleitor escolher e escrutinar a posição de cada um sobre temas estruturantes da vida dos cidadãos, oferecendo a possibilidade de cada candidato explicar como pretende “solucionar” os principais e mais doloridos problemas.
Convém precisar que quando falamos de debates é disso mesmo que queremos referir e não de entrevistas colectivas.
O espaço em que estão todos os concorrentes representados e são dirigidas perguntas a cada um deles é um exercício maçante e entediante que não produz nem boa discussão nem esclarece nada.
Somos, como na realidade portuguesa destes dias, favoráveis a debates “one to one” entre todos, para permitir aos candidatos demarcarem as suas diferenças e realçar a boa vontade das suas propostas.
Como sempre, se quiser que isso aconteça em 2022, teremos desde já fazer a devida pressão pública para que os partidos se comprometam a realizar debates, incluindo, se necessário, um regulamento ao nível da CNE.
Na situação económica do país (aumento da pobreza, do desemprego e acentuada queda do poder de compra), estão criadas as condições políticas para o aparecimento de candidatos de boa conversa e “sábias” soluções milagrosas