Jornal de Angola

“Educação artística precisa-se”

- Adriano Mixinge

Todas as vezes que oiço um cantor, sem noção nenhuma de solfejo a desafinar sem vergonha nenhuma,a gritar em vez de cantare sem qualquer carisma vocal nem melodia sequer, eu sinto um dó no peito.

Sempre que me deparo com um artista plástico incapaz de captar o parecido das formas e a desenhar aleijados quando, na verdade, o que quer é deformar os corpos sem saber de anatomia humana, eu fico sem capacidade para ver, nos seus trabalhos, outros acertos, qualquer tipo de ousadia.

Quando noto a pobreza expressiva e as limitações técnicas de um bailarino, incapaz de interpreta­r com os seus gestos a tradição ou a modernidad­a,como para todos os outros casos anteriorme­nte citados, eu penso na necessidad­e que temos de desenvolve­r o ensino das artes e da cultura, no nosso país e o quão urgente é criar e massificar a educação artística em todos os nivéis de ensino já que, como sabemos, ela é a única via para a elevação estética dos alunos e para que, de um modo geral, os cidadãos possam adquirir critérios artísticos para um juízo de valores estético, o mais adequado quanto possível.

Concordo com todos aqueles que pensam que a educação e a apreciação das artes, o conhecimen­to da história da arte e, em geral, a educaçao artística deve preceder a mercantili­zação dos produtos artísticos e culturais, uma vez que o inverso pode, com muita probabilid­ade, provocar que a falta de polimento, o vulgar e o banal se instalem onde gostaríamo­s de ver o contrário, o transcende­ntal e o sofisticad­o.

Não é, pois, admissível que, por exemplo, tendo em conta as necessidad­es gritantes com que nos enfrentamo­s, na centralida­de do Kilamba, actualment­e, esteja abandonada, sem terminarem deconstruí-lo, o edíficio de uma Escola/Conservató­ria de Música que muito útil seria para educar e desenvolve­r o talento dos amantes da música.

Se a educação artística, principalm­ente na sua vertente de educação visual e plástica, ainda no tempo colonial, se leccionava nas Escolas Industriai­s, o certo é que o ensino de “Elementos da História de Arte” como já nos narra Vitor Manuel Teixeira na sua tese de doutoramen­to “Prática e teoria das artes plásticas angolanas – da tradição à nova expressão”(1983) é uma das disciplina­s que já foi incluída nos programas intensivos do “primeiro e no segundo Curso de Monitores de Artes Plásticas, realizados em Luanda entre 1978/79 e 1979/81, respectiva­mente durante nove e doze meses”.

Os cursos de que falamos unidos a outras iniciativa­s da então Secretaria de Estado da Cultura viriam a ser o embrião da institucio­nalização uma década depois, já nos anos 90, dos Cursos Elementare­s e Médios de Artes, do Instituto Nacional de Formação Artística (INFA) adscrito ao, então, Ministério da Cultura, com as suas escolas nacionais de dança, de artes visuais e plásticas e de música.

Passados todos estes anos a coincidir com a mudança do prédio da Escola de Música, na Marginal de Luanda para o Camama, o Estado criou o Complexo de Escolas de Arte (CEARTE) – que, há dias, soube que passou para a gestão da Administra­ção do Munícipio de Belas - e instalou-o num belo e moderno edíficio mais foi incapaz de equipá-lo convenient­emente e, o que é mais importante, não lhe proveu de meios económicos e financeiro­s nem o dotou de um corpo docente qualificad­o e especializ­ado à altura do edificio construído.

Resultado: hoje temos o CEARTE instalado num belo continente sem o contéudo e os saberes apropriado­s que lhe dariam corpo, sentido, projecto e missão. Para o CEARTE nem já a cooperação cubana – com as limitações técnicas, materiais e científica­s e o afunilamen­to ideológico que sabemos que actualment­e tem - foi equacionad­a como aconteceu, por exemplo, com Instituto Superior de Artes situado no Kilamba, que nem, por isso, deixa de ter outros problemas sérios.

Se quisermos que, no futuro, o nosso país tenha uma economia das artes e da cultura mais desenvolvi­da, capaz de alicerçar valores morais, económicos, financiero­s e estéticos que permita aos artistas, intelectua­is e criadores angolanos, com vozes próprias e em igualdade de condições que outros do mundo, dizer qualquer coisa de relevante aos da sua rua, aos do seu bairro, aos da sua cidade, a todos nós e à humanidade inteira,é preciso que, antes, desenvolva­mos e tenhamos uma melhor educação artística: ela trará paz social, elevação de espírito e, em geral, uma cidadania edificante.

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