A solidariedade que falta
O Clube Desportivo 1º de Agosto e toda a Nação futebolística ficaram desolados com o desfecho do recurso apresentado à CAF (Confederação Africana de Futebol), na sequência das peripécias vividas nos dois jogos disputados na Tanzânia, qualificativos para a fase de grupos da Taça da Confederação.
A forma "pacífica" como os órgãos de soberania reagiram ao tratamento pouco cordial a que o representante angolano foi submetido, num país irmão, com históricos e fortes laços, desde os idos tempos de Países da Linha da Frente, aliança de seis nações que lutavam para o fim do Apartheid, chega a surpreender.
Acredito que Agostinho Neto (Angola), Samora Machel (Moçambique), Julius Nyerere (Tanzânia), Serets Khama (Botswana) e Robert Mugabe (Zimbabwe) se tivessem em vida, ao lado de Keneth Kaunda (Zâmbia), o único ex-Presidente desta organização ainda entre nós, teriam reagido contra tamanha falta de “fair play”..
O meu espanto (e peço perdão, se estiver errado, até porque estamos a viver a caminhada quaresmal, para quem é católico, na qual devemos perdoar, para sermos perdoados e não julgar, para não nos julgarem) é que se assiste a uma espécie de conformismo em torno de tudo o que aconteceu, deixando o representante angolano à sua sorte, à mercê da boa vontade da Confederação Africana de Futebol (CAF), entidade que já deu provas de não “morrer de amores” pelos angolanos.
Em jeito de retaliação à forma como dizem ter sido recebidos em Angola, país que cumpre as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), face aos cuidados a ter com a Covid-19, os tanzanianos trataram o 1º de Agosto, um dos mais emblemáticos e prestigiados clubes nacionais, de maneira humilhante na deslocação à terra de Nyerere.
Afirma quem acompanhou de perto a situação que o Parlamento tanzaniano criticou a postura adoptada pelas entidades sanitárias angolanas, que visava o isolamento dos atletas testados positivo. Em Angola, a delegação tanzaniana reagiu às medidas de forma pouco urbana. Exigiram o regresso ao país, em voo charter, procedimento que atropela as normas internacionais, que aconselham o tratamento imediato dos infectados.
Por respeito à soberania e às normas internacionais, os protestos foram tratados dentro dos procedimentos habituais, em caso de desobediência. infelizmente. Entretanto, a actuação das autoridades angolanas desagradou aos tanzanianos que optaram pela vingança, quebrando, no jogo de Dar-es-Salaam, a “espinha dorsal” do onze inicial do representante angolano, com a criação de casos positivos de Covid-19. De resto, os testes, à saída para a Tanzânia e à entrada em Angola, assim o confirmaram.
Imagens divulgadas nas redes sociais “testemunham” o triste teatro protagonizado pelo suposto membro da entidade sanitária daquele país, ele próprio pouco preocupado com as medidas de segurança contra a propagação da pandemia. Aliás, a Tanzânia é um país “negacionista” da Covid-19. Os vídeos que chegaram desta nação africana comprovam que o cenário estava claramente montado para dificultar ao máximo a vida ao 1º de Agosto.
Os atletas agostinos, que supostamente testaram positivo, foram apontados a dedo, daí a razão para que as autoridades de saúde locais não tivessem aceitado apresentar os resultados originais à equipa médica adversária e muito menos ainda aceitassem a realização de outros testes, na presença de um dos membros da delegação angolana.
A reacção passiva das entidades angolanas é, entretanto, uma realidade. Sequer se ouviu um pronunciamento, quer na Tanzânia, quer a nível interno. Um silêncio que não apenas destapa a falta de solidariedade que vez por outra nos caracteriza, como também faz passar a mensagem de que as autoridades angolanas não se importam que representantes desportivos seus sejam maltratados em compromissos internacionais.
O 1º de Agosto fez a sua parte, mas a diplomacia futebolística não acordou ante esta desonestidade e falta de verdade desportiva. Vicissitude semelhante a que sul-africanos passaram, o que faz crer que os tanzanianos são useiros e vezeiros nesta prática, que em nada engrandece o continente africano.
Onde andam os angolanos membros da CAF, que, em tempo de campanha eleitoral, apregoam união para a integração de mais dirigentes nos órgãos de decisão da entidade máxima do futebol africano?