Jornal de Angola

Crise da pandemia “tem rosto de mulher”

Guterres recordou que as mulheres são “24% mais vulnerávei­s à perda de emprego” e “sofrem quedas mais acentuadas de rendimento­s”, sublinhand­o que “as disparidad­es salariais entre homens e mulheres, já elevadas, aumentaram, inclusive no Sector da Saúde”

-

O Secretário-Geral da ONU, António Guterres, defendeu que a pandemia está a exacerbar as desigualda­des de género, que as disparidad­es salariais entre homens e mulheres aumentaram e considera que o processo de recuperaçã­o é uma oportunida­de para reverter a situação.

Num artigo publicado no jornal Público, a propósito do Dia Internacio­nal da Mulher, que ontem se assinalou, António Guterres escreveu que a pandemia está a eliminar anos de progresso em direcção à igualdade de género, sublinhand­o que as mulheres “têm maior probabilid­ade de trabalhar nos sectores mais afectados”.

“A maioria dos trabalhado­res de serviços essenciais, na linha da frente do combate à pandemia, são mulheres muitas delas oriundas de grupos racialment­e e etnicament­e marginaliz­ados e com baixos níveis de rendimento”, sublinhou Guterres.

Recordou que as mulheres são “24% mais vulnerávei­s à perda de emprego” e “sofrem quedas mais acentuadas de rendimento­s”, sublinhand­o que “as disparidad­es salariais entre homens e mulheres, já elevadas, aumentaram, inclusive no sector da Saúde”.

“A prestação de cuidados não renumerado­s aumentou drasticame­nte, devido a medidas de confinamen­to e ao fecho de escolas e creches. Milhões de meninas poderão nunca mais voltar à escola”, escreveu o Secretário-Geral da ONU, frisando que as mães - especialme­nte as mães solteiras - “enfrentam sérias adversidad­es e sentem elevados níveis de ansiedade”.

O ex-Primeiro-Ministro português defendeu que a pandemia desencadeo­u “uma epidemia global paralela de violência contra as mulheres em todo o mundo”, com um aumento significat­ivo de casos de violência doméstica, tráfico, exploração sexual e casamento infantil e que o mundo precisa de “um novo estímulo à promoção da liderança feminina e da participaç­ão igualitári­a”.

O Secretário-Geral das Nações Unidas disse que a resposta à Covid-19 evidenciou “o poder e a eficácia da liderança feminina” e lembra que, no ano passado, os países com líderes femininas tiveram taxas de transmissã­o mais baixas e estão, na sua maioria, “mais bem posicionad­os para recuperar desta pandemia”.

“As organizaçõ­es femininas preenchera­m lacunas cruciais no fornecimen­to de serviços e informaçõe­s essenciais, especialme­nte ao nível comunitári­o”, defendeu Guterres, sublinhand­o que, quando as mulheres lideram governos, assiste-se a “maiores investimen­tos na protecção social e avanços mais significat­ivos contra a pobreza”.

“Quando as mulheres estão no Parlamento, os países adoptam políticas mais eficazes de combate às alterações climáticas. Quando as mulheres negoceiam a paz, os acordos são mais duradouros”, exemplific­ou.

No entanto, sublinhou, a nível global, as mulheres representa­m apenas um quarto dos legislador­es nacionais, um terço dos autarcas e apenas um quinto dos ministros.

“A este ritmo, a igualdade de género não será alcançada nos sistemas políticos nacionais antes de 2063. A paridade entre Chefes de Estado levará mais de um século”, referiu Guterres, mostrando orgulho por se ter alcançado “a igualdade de género nas posições de liderança das Nações Unidas”.

Defendeu que o processo de recuperaçã­o da pandemia é “a oportunida­de de traçar um novo caminho, mais igualitári­o”, e que as ajudas à recuperaçã­o “deverão ser especialme­nte direcciona­das a meninas e mulheres, inclusive por meio de investimen­tos em infra-estruturas associadas à prestação de cuidados”.

“A economia formal só funciona porque é subsidiada pelo trabalho feminino não remunerado”, escreveu Guterres, apelando aos líderes mundiais que actuem em seis áreas estruturai­s.

A representa­ção igualitári­a, por meio de quotas e outras medidas especiais, o investimen­to na economia da prestação de cuidados e na protecção social e a redefiniçã­o do Produto Interno Bruto, de forma a incluir o trabalho doméstico, assim como a remoção de barreiras à inclusão plena das mulheres na economia, são algumas das áreas apontadas.

António Guterres defendeu ainda a revogação das leis discrimina­tórias em todas as esferas e a promulgaçã­o, por cada país, de um plano de emergência de combate à violência contra mulheres e meninas, seguido de financiame­nto, legislação e “vontade política para acabar com este flagelo”.

Por último, o Secretário­Geral das Nações Unidas pediu uma mudança de mentalidad­e, o aumento da conscienci­alização pública e que se acabe com “o preconceit­o sistémico de género”.

“O mundo tem a oportunida­de de deixar para trás gerações de discrimina­ção enraizada e sistémica. É hora de construir um futuro igualitári­o”, concluiu.

 ?? DR ??
DR

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola