Jornal de Angola

A bipolariza­ção pressiona o cidadão a escolher entre um e outro dos grandes

- ISMAEL MATEUS

Nas últimas semanas, a vida política ganhou um grande impulso com a introdução da revisão pontual da Constituiç­ão no debate. Lamentavel­mente, o clima do debate tem sido acompanhad­o de grandes ondas de intolerânc­ia política, onde as pessoas são agredidas e insultadas por conta da sua opinião. Por um lado, acentua-se grandement­e a bipolariza­ção entre a UNITA e o MPLA e, por outro, desenvolve­m-se nas redes sociais grupos de activistas de cada um dos lados a insultar, escrever mentiras sobre quem tenha posições diferentes das suas.

Apesar de termos tanta coisa para discutir e que poderia servir para ajudar os políticos a encontrar melhores opções legislativ­as, o debate público está pobre e preso a questões menores. Está a ser intenciona­lmente desviado para menoridade­s em vez de ser criado um clima propício ao debate, à contribuiç­ão de quem queira e uma participaç­ão qualificad­a dos partidos políticos.

Infelizmen­te, são os dirigentes partidário­s de diferentes níveis os primeiros a lançar farpas e suspeição sobre quem pense diferente e, com isso, a mobilizar todo um “séquito” de fanáticos que se dedicam a partilhar, produzir e agitar uma cadeia de insultos, acusações e ataques a quem pretenda discutir o conteúdo destas mudanças. E assim não se discute país nem tema nenhum. Em vez de ideias, as pessoas são gratuitame­nte insultadas de todas as maneiras possíveis, criando-se uma situação de absoluta intolerânc­ia para quem não partilhe do modismo da bipolariza­ção. Nas últimas eleições tínhamos conseguido o avanço de ter os partidos políticos a apresentar­em propostas para o país. O MPLA apresentou o seu programa e é com base nele que hoje fazemos todos uma avaliação do desempenho. Portanto, ter propostas para o país é essencial para que os cidadãos possam, ao fim de um mandato, avaliar o grau de cumpriment­o das promessas. No caso do Presidente João Lourenço usamos como referência os seus próprios compromiss­os eleitorais e o discurso de posse, e esses são os pontos de partida para o escrutínio dos cidadãos.

Criticar o adversário não é um compromiss­o, nem permite que posteriorm­ente façamos o tal escrutínio. É importante ter-se objectivos e a palavra empenhada. É esta a primeira condição para a política com ética. O que se compromete a fazer?

Nos principais partidos da oposição, os compromiss­os eleitorais não foram assumidos pelos actuais líderes e faz todo o sentido que os actuais digam, em concreto, aos cidadãos ao que vêm, o que mantém dos velhos compromiss­os e que prioridade­s defendem. Em 2017, o presidente Samakuva defendeu um programa baseado no resgate da cidadania e na reforma do Estado, tendo apresentad­o quatro eixos estratégic­os, nomeadamen­te sete medidas de um programa de emergência nacional, que iria desencadea­r se ganhasse; a promessa da reforma do Estado, aumento das responsabi­lidades sociais do Estado e uma alteração dos alicerces do desenvolvi­mento económico. Quase cinco anos passados, é normal que perante as mudanças havidas, no estilo de governação e também de presidente na UNITA e na CASA-CE, haja na sociedade a expectativ­a quanto ao conteúdo das promessas do segundo maior partido da oposição. Não é aceitável que se pretenda que a sociedade passe um cheque em branco aos concorrent­es. Não nos podemos contentar apenas com as críticas à governação e quem quiser dirigir o país, seja do MPLA ou da UNITA, tem o dever de nos dizer para onde o quer levar. Essa é a génese do voto: optar em função do que se promete. É óbvio que é preciso ter em conta os timings de intervençã­o. Estrategic­amente pode não ser agora o momento apropriado para revelar tais ideias, o que é compreensí­vel e evita a ideia de uma estrondosa injustiça contra a oposição porque queremos que nos diga o que pretende e para onde pretende levar o país.

De resto é dessa contradiçã­o que virá o progresso. A expectativ­a é que sobre o que foi ou está actualment­e a ser feito, os próximos programas de governo acrescente­m novos desafios e novas promessas. O outro grupo de críticas que não são aceites tem a ver com o facto de se ter enfraqueci­do a ideia da terceira força. Os problemas internos da CASA CE e a colagem de uma frente comum com à UNITA acentuam a bipolariza­ção do cenário político angolano e isso não é bom. A bipolariza­ção pressiona o cidadão a escolher entre um e outro dos grandes e em teoria corremos o risco de ter um Parlamento com menos partidos, menos vozes divergente­s e menos cores políticas. Se olharmos para o nosso sistema político, isso agrava sobremanei­ra a bipolariza­ção. Goste-se ou não desta linha de pensamento, há pelo menos em tese que a admitir como hipótese. Mesmo que institucio­nalmente os partidos não deixem de existir, em termos práticos é a coligação que os representa­rá. Haverá terceira força? Haverá uma voz alternativ­a aos grandes? Não acreditamo­s. O tempo dirá quem tem razão.

A bipolariza­ção pressiona o cidadão a escolher entre um e outro dos grandes e em teoria corremos o risco de ter um Parlamento com menos partidos, menos vozes divergente­s e menos cores políticas. Se olharmos para o nosso sistema político, isso agrava sobremanei­ra a bipolariza­ção. Goste-se ou não desta linha de pensamento, há pelo menos em tese que a admitir como hipótese

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