Jornal de Angola

Terra de poetas

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Ruy Mingas não foi o único músico que encontrou matéria-prima nos poetas benguelens­es. Waldemar Bastos, no seu álbum de estreia “Estamos Juntos”, também recorreu a Ernesto Lara Filho para o seu hoje bastante notório “Marimbondo” e depois, no disco “Angola Minha Namorada” tomou de empréstimo a Raul David o poema “Nduva”. Duas jovens cantoras, Aline Frazão e Irina Vasconcelo­s não ficaram indiferent­es aos poetas da cidade das Acácias Rubras. Aline registou em disco “Ronda”, de Alda Lara e Irina Vasconcelo­s, durante um concerto, recriou textos da mesma poetisa. Vumvum Kamusasadi também recorreu à obra de Alda Lara e cantou “Testamento”. E Nelo de Carvalho deu um toque em “Talami Handi” de Gociante Patissa.

Nascido no Chinguar, Aires de Almeida Santos inspirou-se na sua musa do Bairro Benfica, em Benguela, e escreveu “Meu Amor da Rua 11”, que foi aproveitad­o pelo compositor caboverdia­no Pedro Rodrigues e a Banda Maravilha lhe deu forma de Semba cadenciado.

Da poesia de Viriato da Cruz os músicos não aproveitar­am apenas “Namoro” e “Makezu”, que depois de musicaliza­do tem muitas versões. “Sô Santo”, um interessan­te retrato social da burguesia angolana-assimilada do período colonial, também faz parte das produções tornadas canções, desta feita na voz de Raul Indipwo, do Duo Ouro Negro. Há uma outra versão cantada deste poema na voz de Armando Carvalho, artista que muito soube mexer com a poesia de Neto.

Tonito Fortunato, compositor respeitado, reconhece a força da métrica de poemas para a música. De Agostinho Neto pegou em “Caminho do Mato”, que resultou numa interpreta­ção de Belita Palma. Um outro feito do irmão mais velho de Jomo Fortunato foi a arte que emprestou ao “Engraxador” de Jofre Rocha. E recorreu ao poeta português Manuel Alegre para cantar “Trova do Vento que Passa”. O Duo Canhoto também tem recorrido a poesias, por exemplo, fizeram de “Cântico Sofrido”, de Chô do Guri o tema musical “Isto Não é um Poema” e de Rosa da Costa cantaram “Nao Me Provoquem”.

Fora do nosso espaço, trazemos o poema “Chamo-me Menino” do poeta guineense Tcheka, que foi apresentad­o musicalmen­te pelo seu contemporâ­neo Manecas Costa, produtor e guitarrist­a muito ligado à música angolana. Mais tarde, o DJ Dias Rodrigues chamou Micas Cabral para cantar o mesmo poema. Ainda da Guiné-bissau, a obra poética de Amílcar Cabral é aqui mencionada para fazermos alusão ao poema “Regresso”, conhecido musicalmen­te como “Mamãe Velha” na voz de Cesária Évora. O português Fausto, que passou parte da vida em Angola, cantou “Flagelados do Vento Leste”, poema conhecidís­simo por toda uma geração de angolanos que o tiveram como leitura obrigatóri­a na antiga 8ª Classe. É de autoria do caboverdia­no Manuel Lopes.

São vários os temas e poetas que têm sido revisitado­s pelos músicos, não na quantidade e qualidade exigidas, mas é possível e salutar este intercâmbi­o. Um nome a reter nestas parcerias é o de Carlos Ferreira “Cassé”, um poeta que tem colaborado com vários músicos, muitas vezes como compositor e outras pela estrutura dos seus textos poéticos aproveitad­os pelos cantores. Como sempre, estes levantamen­tos (passeios) são inconclusi­vos.

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