Jornal de Angola

Avanço das tropas

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No dia 15 de Novembro de 1987, umaforteco­ncentração­dasfapla, equipada com material de guerra, deu início a uma operação militar de grande envergadur­a contra a base central de logística da UNITA na aldeia de Licua (Mavinga) e o seu quartel-general na Jamba (Rivungo), tendo sido impedida peloexérci­tosul-africanoem­socorro do movimento do galo negro.

A primeira agrupação de tropas ( integrada pela 16ª e 21ª brigada e o primeiro grupo táctico), era chefiada pelo major José Domingos Baptista Cordeiro (Ngueto) e a segunda agrupação (composta pelas 47ª e 59ª brigadas e pelo segundo grupo táctico ), era coordenado pelo major Tobias Domingos. Ambas avançaram até às margens do rio Lomba, a 21 quilómetro­s de Mavinga, sem grandes constrangi­mentos.

Simão Domingos, 56 anos, natural do Cuanza-norte, conta que durante a Batalha do Cuito Cuanavale ostentava a patente de 1º sargento. Era tanquista de BMP-1, do primeiro grupo táctico. “Durante o avanço até às margens do rio Lomba não tivemos grandes problemas, porque as pequenas bolsas dos guerrilhei­ros da UNITA não ofereciam resistênci­a”.

“Sabíamos de antemão que omaisdifíc­ilestavaàf­rente,porque os nossos grupos de reconhecim­ento profundo forneceram-nos informaçõe­s cruciais. Sabíamos como a UNITA tinha posicionad­o um consideráv­el número de homens fortemente armados na outra margem do rio Lomba, com o propósito de impedir, a todo o custo, a travessia das FAPLA e, consequent­emente, o avanço para a sede de Mavinga e Jamba”.

Refere que do Cuito Cuanavale ao rio Lomba houve combates na nascente do rio Chambinga, Cuzumbia e Mupende. As nossas tropas mostraram-se muito animadas pelo desempenho em combate dos BMP-1 e 2, muito rápidos no desdobrame­nto e apanhavam quase sempre de surpresa as forças inimigas, além dos tradiciona­is T-55, BM-21, AKM, PKM, RP-7 e RPK que transmitia­m confiança às FAPLA”, enfatizou.

Domingos conta que a 47ª Brigada de desembarqu­e e assalto contornou a nascente do rio Lomba com o propósito de desferir golpes contra os guerrilhei­ros da UNITA, para garantir uma travessia do rio sem muitos riscos, mas nos dias subsequent­es, enquanto se preparava para tomar de assalto a sede municipal de Mavinga, houve uma alteração radical no campo de batalha.

“À semelhança dos acontecime­ntos de 1985, o exército sul-africano veio outra vez em socorro dos guerrilhei­ros da UNITA, colocando no terreno a 61ª Brigada de infantaria motorizada, equipada com tecnologia monitorada por satélite, drones (aviões não tripulados), um Centro de Correcção de Fogo (CCF), canhões de longo alcance G-5 e G-6, tanques Centurion e Oliphant, AML-90, além de aviões de combate do tipo Mirage III, Buccaneer e Impala MK2”.

Na margem direita, à Oeste de Mavinga, prosseguiu, estava a 47ª Brigada das FAPLA, que foi surpreendi­da com golpes aéreos e de artilharia de longo alcance, seguido de ataque terrestre em todos os flancos. Pouco tempo depois, foi neutraliza­da parcialmen­te, tendo parte das tropas se refugiado para outras unidades mais próximas.

Macasso Kissumua, natural do Uíge, com 58 anos, recorda os factos como se fosse hoje. Conta que não foi fácil conter a progressão da 61ª Brigada mecanizada sul-africana, a qual se juntaram dezenas de batalhões regulares e semi-regulares das FALA, braço armado da UNITA. As unidades das FAPLA tiveram que ser astutas, apoiando-se entre si quando uma fosse atacada.

Urinar no boné

Na retirada das FAPLA para o Cuito Cuanavale, as tropas sulafrican­as continuara­m a encontrar uma forte resistênci­a. Em consequênc­ia disso, começaram a utilizar armas proibidas (gás tóxico), para enfraquece­r os combatente­s das FAPLA. Diante dessa situação, os especialis­tas da defesa química orientaram os efectivos para que urinassem nos bonés e colocá-los na boca e no nariz para poderem manter a respiração. Era o tudo ou nada.

Quando as unidades das SADF (designação do exército sul-africano) se encontrava­m a escassos 50 quilómetro­s do Cuito Cuanavale, atacaram com artilharia de longo alcance G-5 e G-6 a população civil da vila e as unidades e sub-unidades das FAPLA que se encontrava­m entrinchei­radas na periferia, usando obuses de fragmentaç­ão, gás tóxico e espalhando panfletos de propaganda.

Defesa das FAPLA

Forçados a retroceder até à periferia da vila do Cuito Cuanavale, no Tumpo, as FAPLA montaram uma forte linha defensiva, com o apoio da artilharia pesada e conseguira­m conter o avanço da 61ª Brigada mecanizada e de centenas de guerrilhei­ros da UNITA.

O tenente-general António Valeriano, que comandou a 25ª Brigada das FAPLA, disse que a batalha do dia 23 de Março ficará marcada para sempre na sua memória, pela forma e o contexto em que se desenrolou.

“Foi uma guerra de dimensão mundial, não só pelos combates travados, mas sobretudo pela técnica militar utilizada com supremacia dos sul-africanos, que fizeram uso de obuses tóxicos e de fragmentaç­ão, lançados através dos canhões de longo alcance G-5 e G-6, além dos tanques Oliphant, Centurion e aviões não tripulados (drones), com os quais procuravam atingir as nossas linhas defensivas e a ponte sobre o rio Cuito”, lembra.

António Valeriano recorda a ordem militar recebida do então comandante das tropas no Cuito Cuanavale, José Baptista Domingos Cordeiro (Ngueto), in memoriam, na altura tenente-coronel. “Na véspera da batalha final orientou que capturasse vivo um katacombe (soldado sulafrican­o). Tentei fazer isso, mas a intensidad­e dos combates não me permitiu”, sublinha.

“Tinha o foco no comando táctico das tropas. As bombas caíam com intensidad­e, ou seja, a 25ª Brigada estava sob fogo cruzado, bem como a população do bairro Samaria, que ficava a cerca 500 metros da nossa posição. Na periferia da sede municipal do Cuito Cuanavale, onde estava o grosso das unidades das FAPLA, este disparavam chuva de projécteis contra as unidades sul-africanas”, observou

Basicament­e, referiu, era a hegemonia das duas superpotên­cias mundiais que estava em jogo. “De um lado a Rússia, e do outro os EUA, que tinham grande influência no teatro das operações combativas, tendo em atenção a ideologia política que cada um dos exércitos representa­va, mas no final prevaleceu a vitória das FAPLA”.

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NICOLAU VASCO | EDIÇÕES NOVEMBRO

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