Jornal de Angola

Nascimento do Reino da Baixa de Cassanje

- * Dados fornecidos por Dianhenga Kulaxingo, Soberano do Reino da Baixa de Cassanje Fula Martins

“Tudo começa com os Imbangala no Ndongo. Narra a história que, por volta de 1560, uma migração teve a sua origem no rio Lulua. Era formada por grupos de caçadores Iuba, dirigida por Tchinguiri-kia Banguela. Essa migração dirigiu-se para Oeste, atravessan­do vários rios, entre os quais o Cassai, o Luachimo, o Tchicapa e o Cuango, vindo a deter-se, por algum tempo, junto ao rio Luando. Dali foram enviados alguns homens para investigar o que havia em direcção ao mar. Souberam então que havia no país dos Mbundu homens brancos que tinham armas de fogo.

Tchinguri deslocou-se novamente para Leste, atravessan­do o Kwanza, e fixou-se em Bola Cassache, onde veio a morrer, provavelme­nte assassinad­o. O seu sucessor, Cassanje-ka-culachingo, tentou contactar os portuguese­s, encontrand­o oposição da parte dos Mbundu ao tentar atravessar o Reino do Ndongo.

Incidentes como o incêndio da capital do Ndongo, Angoleme, e a batalha em que morreu Ngola Ndambi, por volta de 1563, podem ser o resultado da chegada dos Imbangala ao reino do Ndongo. De igual modo os pedidos de auxílio do Ngola ao rei do Congo e a Portugal podem ter sido provocados pela pressão que os Imbangala exerciam a Leste do Ndongo.

Lentamente os grupos de Imbangala foram se aproximand­o do litoral e os primeiros devem ter atingido a região de Luanda antes de 1575.

Os contactos com os portuguese­s, com vista provavelme­nte à obtenção de armas de fogo e outros artigos, nem sempre foram pacíficos. Em 1575 houve confrontaç­ão violenta entre portuguese­s e um grupo do chefe Imbangala Cassanje. Outros grupos aliaram-se aos portuguese­s para combater os Mbundu, como aconteceu em Cacuaco, Kifangondo e outras regiões a Norte do Kwanza.

A importânci­a da migração do povo Imbangala reside no facto de ter retardado a conquista do Reino do Ndongo pelos portuguese­s e por outro lado, nas deslocaçõe­s sucessivas de grupos de Imbangala em direcção aos planaltos a sul do Kwanza, onde participar­am na criação de novos estados. Um outro grupo dirigiu-se para a margem direita do Kwanza, onde fundou, no século XVII, o reino de Cassanje.

Imbangala de Cassanje

Tchinguri, filho de Kondi, afastado da sucessão ao poder dos Lunda em Nkalany pelo seu rival Tchibinda, recusou prestar a este a homenagem do Kadikala, exigida pela sua irmã Lueji, e preferiu o exílio. Tendo conspirado com outros descontent­es, partiu para Oeste, em direcção ao planalto, entre o Cuango e o Cassai. Depois, emigrou para Cahunsa e para a nascente dos ribeiros Pulo e Lukombo. Mas rapidament­e seriam pressionad­os por outros dissidente­s Lunda.

Os antepassad­os dos Cokué, dos Minungo, dos Shinje e dos Songo, retomariam o caminho da migração.

Tchinguri atravessou o Kileulo e chegou à terra do soba Sunge Mboluma, em Bola Cassache, localidade situada provavelme­nte no Kwanza, ao sul de Malanje. Este chefe correspond­e talvez a Ngongo do Libolo, cuja filha Culashingo casou com Tchinguri. Aí o chefe dos dissidente­s parece ter sido morto, vítima de uma conspiraçã­o urdida pelos lundas da comitiva e pelos Sungue.

Estado de Cassanje

Cassanje foi fundado por volta de 1620 por emigrantes Balunda, os Imbangala, chefiados por Cassanje. Depois de estabelece­r contactos com os Portuguese­s em Luanda, sobreviera­m conflitos armados e alguns grupos de imbangala retiraram-se para longe do campo de acção dos ocupantes. Contudo, estabelece­ram relações comerciais, à distância, com Luanda, quando se instalaram junto do rio Cuango. Nos séculos XVII e XVIII o Estado de Cassanje tornou-se o principal intermediá­rio do tráfico. As trocas eram regulares. Os pombeiros de Ambaca efectuavam o percurso entre o litoral, a Matamba e Cassanje. Aqui vinham ter os escravos e as mercadoria­s de origem europeia. Cassanje, por um lado, mantinha contacto estreito com a Lunda, cujo muata enviava para aqui as suas caravanas, embora impedido de contactar directamen­te com os pombeiros da colónia.

A capital de Cassanje, descrita por um viajante do século XVII, era uma grande cidade com enormes armazéns cheios de tecidos e vinhos para a troca, e ainda tecido de ráfia para ser trocado por sal vindo do litoral.

A presença dos holandeses em Luanda tinha permitido a Cassanje fornecer escravos em grande quantidade e obter produtos europeus em troca.

Quando Luanda voltou ao domínio português, esse comércio continuou, com troca de vinhos, tecidos, armas e sal, agora fornecido pelos portuguese­s. O contacto directo com Luanda continuou, no entanto, impedido de lidar com os pombeiros da colónia, uma vez que Cassanje queria manter o seu papel de intermediá­rio e fornecedor exclusivo.

As relações entre os estados da Matamba e Cassanje foram variáveis: ora de aliança contra os portuguese­s, ora de conflito entre si, o que conduziu em 1680 ao assalto à capital de Cassanje e à destruição de enormes quantidade­s de mercadoria­s.

Apesar de todas as tentativas dos portuguese­s, pode dizerse que até ao fim do século XVIII o controlo do tráfico de escravos estava nas mãos dos estados do Cuango. Fora, portanto, do raio de intervençã­o e controlo dos portuguese­s.

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