Jornal de Angola

Literatura angolana ficou mais pobre com a partida da poetisa

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A literatura angolana sofreu uma enorme perda com a morte, por doença, da poetisa Maria Alexandre Dáskalos, ocorrida no dia 20 de Março, em Luanda. Em 1993, aquando de mais uma edição do poemário “O Jardim das Delícias”, o poeta, ensaísta e crítico literário David Mestre escreveu: “… Pode a poesia angolana regozijar-se de abrir a presente década com uma nova voz ao nível do nosso melhor cancioneir­o. (…) Tanto pelo tom helénico que a percorre como pela estratégia iniciática que a determina, encontra [a poesia de Maria Alexandre Dáskalos] lugar cativo na mais escolhida vertente da lírica local.” Filha do poeta Alexandre Dáskalos -, “um dos grandes poetas da angolanida­de revolucion­ária” (Alfredo Margarido) -, Maria Alexandre Dáskalos nasceu no Huambo em 1957. Formada em Letras, em 1992, com o retomar da guerra, foi viver em Portugal, onde trabalhou como jornalista na RDP África e fez o mestrado em História Contemporâ­nea. Publicou os livros de poesia “O Jardim das Delícias”, 1991; “Do Tempo Suspenso” (1998) e “Lágrimas e Laranjas”, 2001. Publicou também o livro, resultante da sua dissertaçã­o de mestrado, “A Política de Norton de Matos Para Angola (1912-1915)”. Maria Alexandre Dáskalos era membro da União dos Escritores Angolanos. Talvez o nosso corpo seja pequeno para ser a casa do amor que não guarde só indícios e não troque só sinais e entregas que não seja tranquilo nem fiel à rosa e ao fio da navalha Regressámo­s ao anonimato mais leves Mas é minha a muda inquietaçã­o esse temor da armadilha do cinismo

A noite contempla-nos despojados de sonhos e, tu disseste

- tão próximas as estrelas – tão longo o caminho para chegar a elas. cheguei às portas secretas atravessei as passagens interditas e no labirinto que negou os meus passos vi tesouros que não eram meus Não adianta chorar as andorinhas abalaram de vez.

Farão elas a arqueologi­a dos seus ninhos? Os anjos choram.

Uma cidade caiu e os homens perderam-se nos trilhos das casas agora desabadas. As mulheres de joelhos em cima do nada

já não sabem rezar.

Os anjos choram e o bálsamo de todas as feridas não chega até nós. O garoto corria corria não podia saber da diferença entre as flores. O garoto corria corria não podia saber que na sua terra há morangos doces e perfumados, o garoto corria corria fugia.

Ninguém lhe pegou ao colo ninguém lhe parou a morte.

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