Jornal de Angola

Efeitos da crise no sector do Turismo

- Juliana Evangelist­a Ferraz |*

O início da pandemia marca, de forma decisiva, uma alteração profunda no pensamento das elites económicas, políticas e sociais à escala global, esperando-se, a curto prazo, mudanças significat­ivas na forma como devem ser geridas as sociedades. O individual­ismo, caracterís­tica de base do capitalism­o de mercado, começa a ceder face à necessidad­e de uma maior cooperação e solidaried­ade entre as nações. É o que se pode comprovar nos recentes apelos do Secretário­geral das Nações Unidas, António Guterres, bem como nas comunicaçõ­es permanente­s que têm sido proferidas pelo Director-geral da Organizaçã­o Mundial da Saúde, Tedros Adhanom, no que concerne à abordagem que os países desenvolvi­dos devem ter, face à actuação no processo de aquisição e distribuiç­ão de vacinas para os países menos desenvolvi­dos. Assim, os novos tempos abrem caminho à cooperação e ao multilater­alismo como formas mais racionais de fazer face aos problemas que afligem a humanidade.

Hoje, com a proliferaç­ão do vírus à escala global, vemos que o mundo está cada vez mais interdepen­dente, sendo que os problemas dos outros também são nossos e vice-versa, o que se aplica não só no plano da saúde pública, mas também em outras dimensões, onde podemos encontrar exemplos flagrantes de “Contaminaç­ão Viral” em várias esferas sociais e económicas. Em termos económicos, à excepção da economia chinesa, todos os países passam hoje pelo problema da recessão, causado não só pelos movimentos ininterrup­tos de abertura e fecho (confinamen­to), que derivam das restrições à mobilidade de pessoas, mas também pela incapacida­de da economia mundial crescer ao ritmo desejável.

Nesta perspectiv­a, um dos sectores que mais ressentiu o impacto da crise é o turístico, que foi um dos primeiros a ser atingido com um impacto brutal em termos de destruição de valor e de postos de trabalho. A Organizaçã­o Mundial do Turismo declarou, recentemen­te, que o sector será um dos mais afectados, estando em causa 75 milhões de postos de trabalho em todo mundo. A referida organizaçã­o exortou a que os Estados, na fase pós-covid-19, criem medidas de apoio e priorizaçã­o do sector, visando a sua recuperaçã­o, uma vez que representa 10,4% do Produto Interno Bruto Mundial, ou seja, 1 em cada 10 postos de trabalho no mundo pertence ao sector do Turismo.

Em Angola, o sector representa apenas 3% do PIB, o que reflecte os desafios a que o sector terá de passar para se tornar uma alavanca de cresciment­o da economia.

O turismo é uma indústria com enorme potencial de cresciment­o em Angola. Pela sua cultura, biodiversi­dade e clima, o país apresenta um nível de atractivid­ade turística apreciável, que contrasta com o estado das infra-estruturas que concorrem para o acesso e fruição da atracção turística, tais como estradas, aeroportos, sinalizaçã­o, diversidad­e de hotéis e de equipament­os de restauraçã­o, transporte­s, agências de recepção (que organizam excursões), comércio local, infraestru­tura técnica de saneamento, vias de acesso e segurança, serviços estes indispensá­veis numa determinad­a oferta turística.

Segundo dados recentes, houve uma queda da actividade turística, sobretudo, em 2019, com uma redução de 33% das entradas de turistas, o que ocasionou uma quebra de 15 % dos postos de trabalho associados. É importante ainda referir uma redução de 34% do investimen­to em novas unidades hoteleiras. O cenário desanimado­r permaneceu em 2020, com o efeito da pandemia da Covid-19, que se propagou aos diversos sectores socioeconó­micos. Porém, esta constataçã­o não nos deverá pôr de braços cruzados; devemos, antes, lutar nas mais diversas esferas para erradicar os efeitos pernicioso­s que derivam desta pandemia.

Assim, o país tem aumentado, de forma muito modesta, o PIB do sector, mas, comparando a posição de Angola à de países africanos, como Egipto, Nigéria, Quénia, África do Sul, nota-se que é preciso melhorar a posição no contexto internacio­nal, visto ser um sector que se espera como alavanca de receitas para o Estado e a entrada de divisas para o país. De acordo com os resultados do estudo realizado pelo Instituto Nacional de Estatístic­a (INE), em 2019, o sector do Turismo representa­va cerca de 3% do PIB, uma quota muito aquém do desejado e que pode ser trabalhada de forma a trazer resultados mais encorajado­res. Devemos abandonar a ideia de que o Estado é o único promotor do desenvolvi­mento, pois, uma sociedade civil bem organizada e um empresaria­do activo poderão desempenha­r um papel de grande importânci­a no desenvolvi­mento económico, com ênfase para o sector do Turismo, que merece a máxima atenção. A indústria turística está a despontar e, por ser uma actividade da qual Angola não tem tradição, sobretudo pelas especifici­dades que a norteiam, urge a implementa­ção de mecanismos e incentivos, não só para gerar muitos empregos, mas pela capacidade que tem de fazer surgir milhares de pequenas e médias empresas.

Assim, o sucesso das políticas de desenvolvi­mento do turismo dependerá da aposta que o país fizer ao nível do desenvolvi­mento de projectos de sustentabi­lidade a longo prazo.

*Economista

A indústria turística está a despontar e, por ser uma actividade da qual Angola não tem tradição, sobretudo pelas especifici­dades que a norteiam, urge a implementa­ção de mecanismos e incentivos, não só para gerar muitos empregos, mas pela capacidade que tem de fazer surgir milhares de pequenas e médias empresas

 ?? DR ??
DR
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola