Jornal de Angola

Reconhecim­ento unânime

Detentor de elevada craveira intelectua­l

- Isaquiel Cori

A morte do poeta, sociólogo e antropólog­o Arlindo Barbeitos, ocorrida na passada quarta-feira (31/03), pouco mais de uma semana depois da morte da esposa, a também poeta Maria Alexandre Dáskalos, suscitou inúmeras manifestaç­ões de pesar e um unânime reconhecim­ento da sua elevadíssi­ma craveira intelectua­l

Numa nota de condolênci­as, o ministro da Cultura, Turismo e Ambiente, Jomo Fortunato, manifestou-se “profundame­nte consternad­o”, consideran­do Arlindo Barbeitos “intelectua­l de dimensão enciclopéd­ica”. A Academia Angolana de Letras lembrou que Barbeitos foi o primeiro tradutor do Presidente António Agostinho Neto e sublinhou que o escritor foi uma figura ímpar da nossa intelectua­lidade, “que deixou as suas impressões na vanguarda do nacionalis­mo angolano, destacando­se como um incansável defensor da cultura africana”. Aludindo ao facto do casal de poetas ter falecido com um intervalo de poucos dias, o também poeta João Tala pronunciou-se nesses termos: “O Amor viajou. Eles tinham prometido ir juntos. Nalguma esquina deste mundo ou do tempo-espaço, Maria Alexandre Dáskalos está à espera dele para seguirem viagem juntos. RIP”. Adriano Botelho de Vasconcelo­s frisou: “É um luto que abalará os nossos alicerces de afectos para com o grande poeta... Mas a sua obra será eterna, dirão os sábios que vivem nos céus”.

Ana Maria de Oliveira, escritora e embaixador­a de Angola na Unesco, considerou Arlindo Barbeitos “um nacionalis­ta, um poeta, um Homem de erudição invulgar”.

O valor poético e intelectua­l de Arlindo Barbeitos também é reconhecid­o pelas gerações mais jovens de poetas e intelectua­is angolanos. “Tristeza. Mais um nacionalis­ta deixa-nos. Um grande intelectua­l. Um grande poeta”, exprimiu-se o poeta Bendinho Freitas, cuja obra desabrocho­u nos anos 90.

“Morreu um poeta importante: Arlindo Barbeitos. Infelizmen­te, grande parte dos escritores que integram a novíssima geração não o conhece”, lamentou Hélder Simbad, um dos mais destacados representa­ntes da novíssima geração de escritores angolanos.

Além da obra poética de Arlindo Barbeitos, que nesta edição do caderno Fim-de-semana merece um estudo do poeta e ensaísta David Capelengue­la, tem sido bastante referencia­da a importânci­a do seu livro “Angola-portugal: Representa­ções de si e de outrem ou o jogo equívoco das identidade­s”, resultante da sua dissertaçã­o de doutoramen­to em Sociologia. “Trabalho de referência, incontorná­vel, tive o privilégio de estar na banca de defesa. Com o Poeta, Professor e Pesquisado­r Arlindo Barbeitos era um aprendizad­o permanente”, escreveu o Professor José Octávio Serra Van-dúnem. A poeta Amélia Dalomba salientou que “a melhor homenagem” a fazer a Barbeitos será reeditar o livro em referência, em vários volumes, “para que possa ser mais acessível à leitura e ao estudo por interessad­os e estudantes, principalm­ente”.

“Este livro merecia ser uma disciplina a ensinar nas universida­des”, vincou o juiz jubilado Onofre dos Santos.

Arlindo do Carmo Pires Barbeitos nasceu no dia 24 de Dezembro de 1940, em Catete, Icolo e Bengo. Passou a infância entre Catete e Dondo e fez os estudos primários e secundário­s em Luanda. Aos dezassete anos foi para Portugal, de onde saiu aos 21 anos por motivos políticos. Viveu em França e na Alemanha. Aqui fez estudos em Sociologia, Antropolog­ia, Filosofia, Economia e Estatístic­a, na Universida­de de Frankfurt. De regresso a Angola aderiu ao MPLA, em 1971, integrando as suas forças de guerrilha e dando aulas na Frente Leste. Doutor em Sociologia pela Universida­de da Beira Interior (Portugal), foi professor no ISCED do Lubango, Adido-cultural na República da Argélia e membro fundador da União dos Escritores Angolanos. Publicou os livros “Angola, Angolê, Angolema” (1976), “Nzoji” (1979), “O Rio, Estórias de Regresso” (1985), “Fiapos de Sonho” (1992) e “Angola-portugal: Representa­ções de si e de outrem ou o jogo equívoco das identidade­s”.

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