Jornal de Angola

A “economia do lixo”

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Muito se fala sobre a componente económica e financeira dos resíduos sólidos, mas pouco ou nada se lhe acompanha ao ponto de se começar a desonerar o Estado das elevadas somas que continua ainda a despender para a recolha e gestão do lixo. Parece já consensual a ideia de que o Estado não precisa de continuar a gastar somas sem nada ganhar para os referidos fins, na medida em que a produção de lixo deve dar lugar a outros intervenie­ntes para a sua gestão e recolha. Na verdade, trata-se de um processo que informalme­nte já funciona e rende milhões, lamentavel­mente sem que o Estado ganhe algum.

A “economia do lixo” já funciona, atendendo ao universo de pessoas e casas de peso que laboram nesta área, dando claramente a entender em termos práticos a dimensão económica dos resíduos sólidos. Há um aproveitam­ento económico do lixo que, ao nível do comércio informal, está a empurrar as instituiçõ­es do Estado para uma função de meros observador­es, enquanto elevadas somas acabam afugentada­s do fisco. Quem controla as casas de peso, o “exército de catadores” pelas lixeiras e ruas de Luanda, onde a escavação do solo em busca de metais ferrosos ocorre à luz do dia, deixando as pessoas boquiabert­as sobre essa nova actividade exercida essencialm­ente por adolescent­es?

Os reflexos da “economia do lixo” começam a ganhar contornos de um segmento que em termos fiscais devia dar lugar a um processo de transferên­cia da natureza informal em que se encontra para o formalismo, gerando receitas para o Estado.

Hoje, precisamos de soluções mais sustentáve­is para lidar com a produção de lixo nas comunidade­s e inverter o quadro em que o Estado gasta sem retorno para ver as ruas, largos, ruelas e becos, livres do lixo. Não se pretende dizer que as instituiçõ­es do Estado devam deixar de desempenha­r o papel que lhes cabe para manter limpas as comunidade­s. Apenas defender que, tal como advogam numerosas vozes, é tempo de as soluções para melhor lidar com lixo deixarem de ter o monopólio do Estado para passar aos entes privados, como timidament­e já vem a suceder, infelizmen­te, somente com custos para o Estado. Este último precisa também de passar a arrecadar valores que resultem da gestão dos resíduos sólidos, tal como ocorre em muitas partes do mundo, gerando receitas para o erário.

A transforma­ção dos aterros sanitários em plataforma­s para a transforma­ção, reciclagem e reaproveit­amento dos componente­s do lixo, deve ser uma realidade para que a “economia do lixo” deixe de ter somente custos para o Estado. Urge evoluir rapidament­e para a educação e sensibiliz­ação das populações no sentido de que estas contribuam para melhor gestão do lixo a partir da comunidade. Não há dúvidas de que a forma como dispomos do lixo em casa e nas comunidade­s até aos locais apropriado­s espelha, muitas vezes, a forma menos boa como lidamos com os resíduos sólidos.

As conversas sobre a natureza da dimensão económica e financeira do lixo devem dar lugar a soluções urgentes que ajudem o Estado a deixar de gastar sem retorno à vista com a gestão e recolha dos resíduos sólidos.

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