Jornal de Angola

Rimas cruas carregadas de estiga

- Edna Dala

Com o olhar perdido a vaguear pelo bairro e um misto de emoções, senti-me teletransp­ortada para a minha doce infância no bairro Kalawenda, outrora conhecido por Manguemba e Cambalacho, na Emissora.

As gargalhada­s sonoras das crianças trouxeram-me de volta à realidade. E pimbas! Cruzo-me com três rapazes com idades que variam entre os 9 e os 11 anos. O mais novinho rimava uns versos de kuduro, com muita atitude, embalado na onda da música. Por isso mereceu salvas de palmas dos seus companheir­os.

Encantada com o cenário e a alegria contagiant­e das crianças, aproximei-me com um sorriso aberto. Ainda assim não foi o suficiente para ganhar a confiança dos pequenos. Mal me acheguei, o mocinho das rimas fugiu. Chamei-o. Sem sucesso.

Novamente pensei: os miúdos dessas bandas não gostam de intrusos. Não vou desistir e não saio daqui sem conversar com um desses pequenos. Aproximei-me do outro rapaz, o Mauro, que se mostrou mais receptivo.

Para deixar a conversa mais descontraí­da dei-lhe um “cule”, ao qual Mauro correspond­eu com satisfação, para minha alegria.

“Como é que te chamas?”. Com os braços cruzados sobre o peito em sinal de defesa e como se quisesse mostrar que não se sentia intimidado, respondeu: “eu sou o Mauro Pereira Manuel e tenho 11 anos de idade”.

“Então Mauro, vives aqui no Buraco?”, perguntei. A resposta foi negativa. “Não. Vivo na Terra Vermelha, lá mais para baixo. Só vim assistir ao jogo de uma equipa, aqui no campo da Escola do Comboio”.

“Gostas de estudar?”, prossigo. Mauro responde positivame­nte e acrescenta: “também gosto muito de cantar. Gosto muito de kuduro”.

“Já consegues ler?”. Orgulhoso e convicto, respondeu que sim. Antes que lhe colocasse outra pergunta, disse: “Kota posso ler o que está escrito na tua blusa”.

“Claro que podes, filho”, autorizei. Mauro provou que conhecia as letras, que sabia ler. Demos mais um “cule”, para mostrar que a Kota estava feliz pelo seu desempenho.

“Além da música e da escola, o que gostas, também de fazer?”. Amante de futebol, Mauro revela o desejo de ser um grande jogador.

“Quem é o teu jogador preferido?”, A pergunta era incontorná­vel. “Na nossa praça gosto muito do avançado Mabululo, do 1º de Agosto. Lá fora, sou fã de Leonel Messi, camisola nº 10 do Barça”.

Com um sorriso largo, despedi-me do Mauro e encorajei-o a dar continuida­de aos estudos, porque a vida vai além da bola e da música. Com um sorriso no rosto, e visivelmen­te agradado com a nossa conversa, o menino agradeceu.

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