Taxistas começam a ser inseridos na Segurança Social
Apesar da importância que este segmento de actividade tem para o desenvolvimento económico e social do país, o serviço de táxi e os taxistas ainda são menosprezados. É uma actividade que emprega milhões de jovens, mas o Estado, que tem a obrigação de apoiar iniciativas privadas, nos termos da Constituição, faz ouvidos de mercador, deixando a mercê os taxistas por muitos anos, sem a devida inclusão no sistema de protecção social.
É como se não existissem
A Associação Nova Aliança dos Taxistas de Angola (ANATA) começou o processo de inscrição, de forma paulatina e faseada, dos filiados no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS). O presidente da ANATA, Francisco Paciente, frisou que o objectivo é assegurar uma reforma condigna aos taxistas quando deixarem de exercer a actividade. O processo começou com os filiados de Luanda e depois será extensivo às demais províncias. Por outro lado, reconhece que a relação entre o taxista e os agentes da Polícia Nacional melhorou bastante e pediu maior simplicidade e compreensão aos efectivos do Serviço de Investigação Criminal
Quantos associados tem a Associação Nova Aliança dos Taxistas de Angola (ANATA)?
A nível nacional, temos mais de 22 mil filiados e mais de três mil “lotadores”.
Como está a decorrer o processo de inscrição dos filiados da ANATA no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS)?
Nesta altura, estamos na fase de pré-inscrição, com o preenchimento dos formulários por todos aqueles associados que manifestaram interesse em estarem inscritos no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS).
Quantos já fizeram a pré-inscrição?
O processo está na fase inicial. Já temos mais de mil préinscritos, que nos próximos dias darão entrada dos processos no INSS. Numa primeira fase, estão a ser inscritos os taxistas de Luanda, para depois ser extensivo às demais províncias.
Qual é a faixa etária dos taxistas que circulam pelo país e que estão a ser inscritos na Segurança Social?
Somos maioritariamente jovens, com idades compreendidas entre 20 e 35 anos. Temos, também, uma minoria de membros com idades entre 40 e 50 anos. Todos têm carta de condução, até porque constitui uma obrigação no processo de inscrição para a Segurança Social.
Que formação é dada aos associados com vista a sua adaptação ao sistema electrónico do INSS?
Tivemos, em Abril, um encontro com o vice-governador de Luanda, Lino Kienda, que convocou especialistas do INSS, para abordar alguns aspectos decorrentes do Decreto 42/8 e 295/20, sobre os diferentes regimes de protecção de trabalhadores por conta própria e com baixos rendimentos. Vimos também aprovado um cronograma de actividades formativas dirigidas aos associados para se adaptarem ao formulário electrónico, lançado em Abril.
Sente que a actividade de táxi já é valorizada pelas autoridades competentes?
Apesar da importância que este segmento de actividade tem para o desenvolvimento económico e social do país, o serviço de táxi e os taxistas ainda são menosprezados. É uma actividade que emprega milhões de jovens, mas o Estado, que tem a obrigação de apoiar iniciativas privadas, nos termos da Constituição, faz ouvidos de mercador, deixando a mercê os taxistas por muitos anos, sem a devida inclusão no sistema de protecção social. É como se não existissem.
Como tem sido a relação com o Governo da Província de Luanda?
Temos mantido vários encontros para abordar várias preocupações. São preocupações relacionadas com o mau estado das vias, processo de licenciamento, bem como a exiguidade de paragens de táxis.
Há união entre os taxistas, já que são filiados a três organizações diferentes?
Os taxistas são mais unidos se comparados com qualquer outro grupo de trabalhadores. Até aqueles que não estão inscritos oficialmente na ANATA cumprem com as nossas orientações.
Pode citar alguns exemplos?
Quando decretámos a paralisação dos serviços de táxi ou apelámos à solidariedade para com um taxista doente, todos participam.
Quantas “staffs” controla a ANATA?
Só em Luanda, controlamos mais de 400 “staffs”. As “staffs” são pequenas subassociações informais que congregam entre 30 a 100 taxistas. Têm um espaço denominado “placa”, que funciona como “escritório”, onde se reúnem para abordar algumas preocupações vividas na via pública, desde o comportamento dos próprios taxistas, dos agentes reguladores de trânsito e da ordem pública, entre outros assuntos. Depois, essas preocupações são apresentadas à ANATA, que as remete aos órgãos de direito, no sentido de resolverem ou influenciar a criação de políticas direccionadas aos taxistas. Por outro lado, as “staffs” servem, também, para identificar os diferentes grupos de taxistas nos municípios, através do nome exibido no vidro traseiro do veículo. Apesar dessas vantagens, a ANATA não aceita o registo de “staffs” cujo nome contém palavras ou termos que ofendem a moral pública e os bons hábitos e costumes do nosso povo.
A ANATA está representada em todo o país?
Apesar das dificuldades com o arrendamento de escritórios, a ANATA está representada em 12 províncias do país. Em Luanda, estamos representados em todos os municípios. Somos uma associação extremamente dinâmica, que sempre adequou os seus projectos de acordo com a realidade social, económica e política do país.
Vocês têm algum apoio financeiro do Estado, para materializar os vossos projectos ou contam apenas com a contribuição dos associados?
Apesar de não termos apoio financeiro do Estado, temos um grande número de associados, que nos dá o direito de sermos considerados uma instituição de utilidade pública, pois temos vários projectos em benefício dos taxistas, das comunidades e do Governo.
Que projectos são esses?
Temos o projecto “Taxista Legal”, que visa a sensibilização permanente dos taxistas na via pública, sobre a importância do seguro automóvel, da licença de transporte e de todos documentos e equipamentos que uma viatura deve ter para o exercício legal da actividade de táxi. Temos, também, o projecto “Stop Covid-19”, que visa a sensibilização e fiscalização do cumprimento das medidas de prevenção contra a pandemia. Igualmente, existe a iniciativa “Táxi estudante”, que permite buscar os estudantes próximo da zona de residência e levá-los para a escola e vice-versa, mediante o pagamento mensal ajustado
ao preço oficial de táxi.
Além desses, existem outros projectos?
Sim. Temos o projecto “Taxista solidário”, que visa a recolha de bens não perecíveis para ajudar as comunidades carenciadas e taxistas desempregados, por motivos de avaria da viatura. “Sinistralidade zero" é uma campanha de sensibilização e palestras realizada com a Direcção de Trânsito e Segurança Rodoviária da Polícia Nacional.
O projecto “Táxi meu Emprego, meu futuro” visa a formação de todos os taxistas sobre educação financeira e empreendedorismo, permitindo assim criar poupanças para a Segurança Social e a carteira profissional de taxista. Temos ainda formação relacionada com a mecânica, diagnóstico electrónico e outros ofícios visando colocar o taxista em pé de igualdade com outros profissionais. Temos ainda as Brigadas de apoio às administrações municipais para a limpeza e tapa-buracos nas vias de difícil acesso, pinturas e plantação de árvores.
A profissionalização da actividade de táxi no país é uma luta antiga?
Sim. Apesar de o Ministério dos Transportes ter dado o primeiro passo, em 2019, com o novo regulamento dos transportes rodoviários ocasionais, os outros departamentos ministeriais só começaram a fazer alguma coisa depois de apresentarmos as preocupações no encontro com o Presidente da República, no dia 26 de Novembro de 2020.
Quais são vossos passos com a profissionalização da actividade de táxi?
A actividade de táxi carece de um regime jurídico próprio. Precisamos que haja diferença entre condutor doméstico/particular e condutor ao serviço de táxi. Já apresentámos as nossas contribuições aos órgãos competentes, porque não estamos satisfeitos com o modelo de carteira profissional que o Governo preparou para os diferentes profissionais.
Estão insatisfeitos?
Sim. Achamos que não traz aspectos de rigor, segurança, nem controlo estatístico. Mas é um ponto de partida, por isso vamos dialogar com as autoridades até que um dia reconheçam as nossas ideias. Já se nota alguma valorização da actividade pelo Governo, mas ainda temos muito por fazer em termos de pressão.
Além dos taxistas, os outros colaboradores da ANATA têm beneficiado dos programas de formação?
Temos os cobradores e os “lotadores” que têm acesso a todos os programas de formação, realizados por diversas instituições do Estado, como os ministérios da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social (MAPTSS), através do Instituto Nacional de Emprego e de Formação Profissional (INEFOP) e o Centro de Formação Tecnológica (CINFOTEC), e da Juventude e Desportos (MINJUD), onde consta formação específica para cobradores. Temos também trabalhado no registo em massa dos “lotadores” para a obtenção do Bilhete de Identidade, uma vez que muitos não têm este documento.
Estado de Calamidade Pública?
Não está legalmente normalizada a situação da lotação dos táxis. Há sim alguma excepção ou igualdade de tratamento entre os autocarros e os hiaces, tendo em conta o défice de transportes e o custo de manutenção dos meios, uma vez que os táxis não são subvencionados pelo Estado.
Ainda se tem verificado o encurtamento de rotas?
O encurtamento de rotas ainda acontece de forma isolada. Muitos taxistas, com esse comportamento, não estão inscritos nas associações e ninguém tem dados sobre eles para a devida punição, como a retirada temporária da carteira profissional. A falta de identificação dos veículos, com o número em ponto grande, dentro e fora do veículo, faz com que eles saem impunes dessas irregularidades. Por outro lado, a não regulamentação e uniformização do rendimento diário, leva alguns taxistas e proprietários de táxis à ganância, apesar dos apelos constantes nas reuniões com patrões e “staffs”.
Quais eram as razões para a paralisação da actividade de táxi em Março?
A greve foi anunciada pela ANATA devido às várias reclamações e abaixo assinados sobre o mau estado das vias em Luanda, tratamento desigual entre os autocarros e hiaces, no que diz respeito à lotação, abuso de autoridade por parte de alguns supostos efectivos do Serviço de Investigação Criminal, falta de inclusão social dos taxistas no INSS, acesso aos projectos habitacionais do Estado para os taxistas, e a morosidade na materialização da carteira profissional.
Mas acabaram por suspender a greve?
A greve foi suspensa devido à vontade que o Governo mostrou em atender as preocupações, partindo para um encontro, ocorrido no dia 23, com o secretário do Estado dos Transportes, Jorge Bengue, ladeado de outros responsáveis dos diferentes organismos do Governo.
Até que ponto as paragens de táxi já satisfazem os vossos anseios?
Reconhecemos que o Governo Provincial de Luanda construiu muitas paragens, mas ainda não são satisfatórias, ou seja, precisamos de mais paragens em diversos pontos de Luanda.
Não vemos nenhum perigo nesta actividade. Sentimos alguma instabilidade devido à não profissionalização da nossa actividade e à falta de atenção do Estado. Mas perigoso mesmo é estar desempregado.
A ANATA é consultada quando pretendem implementar uma medida que tem a ver com a vossa actividade?
Sim. Somos consultados na maioria das vezes antes de qualquer medida. O Ministério dos Transportes temnos convidado a participar nos seus conselhos consultivos. Os gabinetes provinciais de Transportes, Tráfego e Mobilidade Urbana, sobretudo em Luanda, têm dialogado connosco, dando resposta imediata aos problemas.
E a nível da Polícia Nacional?
O anterior comandante da Unidade de Trânsito de Luanda, Manuel Albano, e o actual, Simão Saulo, têm um cronograma de reuniões periódicas connosco, para analisar o comportamento dos agentes e dos taxistas na via pública. Os comandos e administrações municipais também consultam a ANATA sempre que necessário.
Como olha actualmente para relação entre o polícia e o taxista?
A relação polícia/taxista melhorou bastante. Acho que a Polícia Nacional investiu muito na formação dos agentes em matéria de direitos fundamentais e na colocação de quadros competentes nos diferentes departamentos. Hoje, os agentes reguladores de trânsito já não constituem obstáculo ao nosso trabalho. A extorsão reduziu significativamente e só acontece naqueles casos em que o taxista está sem a documentação completa. Mas na maioria dos casos os agentes levam alguns taxistas a tribunal por tentativa de suborno.
E quanto ao Serviço de Investigação Criminal?
Hoje, a nossa maior dificuldade é com os agentes do SIC, que, em minha opinião, deviam ser exemplares uma vez que conhecem matérias sobre direito. Temos notado alguns responsáveis desse órgão antipáticos e muitos precisam melhorar a preparação em matéria processual.
Quais são os grandes desafios da ANATA?
É trabalhar de mãos dadas com o Executivo para melhorar o perfil e a situação socioeconómica do taxista, através da implementação da carteira profissional, do acesso à habitação, ao crédito automóvel, seguro de saúde e outros serviços públicos. Com base na união e no princípio de solidariedade entre membros, os taxistas afectos às associações e “staffs” cadastrados e devidamente identificados com passes não se cobram entre si.
O anterior comandante da Unidade de Trânsito de Luanda, Manuel Albano, e o actual, Simão Saulo, têm um cronograma de reuniões periódicas connosco, para analisar o comportamento dos agentes e dos taxistas na via pública