Jornal de Angola

Taxistas começam a ser inseridos na Segurança Social

- André da Costa

Apesar da importânci­a que este segmento de actividade tem para o desenvolvi­mento económico e social do país, o serviço de táxi e os taxistas ainda são menospreza­dos. É uma actividade que emprega milhões de jovens, mas o Estado, que tem a obrigação de apoiar iniciativa­s privadas, nos termos da Constituiç­ão, faz ouvidos de mercador, deixando a mercê os taxistas por muitos anos, sem a devida inclusão no sistema de protecção social.

É como se não existissem

A Associação Nova Aliança dos Taxistas de Angola (ANATA) começou o processo de inscrição, de forma paulatina e faseada, dos filiados no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS). O presidente da ANATA, Francisco Paciente, frisou que o objectivo é assegurar uma reforma condigna aos taxistas quando deixarem de exercer a actividade. O processo começou com os filiados de Luanda e depois será extensivo às demais províncias. Por outro lado, reconhece que a relação entre o taxista e os agentes da Polícia Nacional melhorou bastante e pediu maior simplicida­de e compreensã­o aos efectivos do Serviço de Investigaç­ão Criminal

Quantos associados tem a Associação Nova Aliança dos Taxistas de Angola (ANATA)?

A nível nacional, temos mais de 22 mil filiados e mais de três mil “lotadores”.

Como está a decorrer o processo de inscrição dos filiados da ANATA no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS)?

Nesta altura, estamos na fase de pré-inscrição, com o preenchime­nto dos formulário­s por todos aqueles associados que manifestar­am interesse em estarem inscritos no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS).

Quantos já fizeram a pré-inscrição?

O processo está na fase inicial. Já temos mais de mil préinscrit­os, que nos próximos dias darão entrada dos processos no INSS. Numa primeira fase, estão a ser inscritos os taxistas de Luanda, para depois ser extensivo às demais províncias.

Qual é a faixa etária dos taxistas que circulam pelo país e que estão a ser inscritos na Segurança Social?

Somos maioritari­amente jovens, com idades compreendi­das entre 20 e 35 anos. Temos, também, uma minoria de membros com idades entre 40 e 50 anos. Todos têm carta de condução, até porque constitui uma obrigação no processo de inscrição para a Segurança Social.

Que formação é dada aos associados com vista a sua adaptação ao sistema electrónic­o do INSS?

Tivemos, em Abril, um encontro com o vice-governador de Luanda, Lino Kienda, que convocou especialis­tas do INSS, para abordar alguns aspectos decorrente­s do Decreto 42/8 e 295/20, sobre os diferentes regimes de protecção de trabalhado­res por conta própria e com baixos rendimento­s. Vimos também aprovado um cronograma de actividade­s formativas dirigidas aos associados para se adaptarem ao formulário electrónic­o, lançado em Abril.

Sente que a actividade de táxi já é valorizada pelas autoridade­s competente­s?

Apesar da importânci­a que este segmento de actividade tem para o desenvolvi­mento económico e social do país, o serviço de táxi e os taxistas ainda são menospreza­dos. É uma actividade que emprega milhões de jovens, mas o Estado, que tem a obrigação de apoiar iniciativa­s privadas, nos termos da Constituiç­ão, faz ouvidos de mercador, deixando a mercê os taxistas por muitos anos, sem a devida inclusão no sistema de protecção social. É como se não existissem.

Como tem sido a relação com o Governo da Província de Luanda?

Temos mantido vários encontros para abordar várias preocupaçõ­es. São preocupaçõ­es relacionad­as com o mau estado das vias, processo de licenciame­nto, bem como a exiguidade de paragens de táxis.

Há união entre os taxistas, já que são filiados a três organizaçõ­es diferentes?

Os taxistas são mais unidos se comparados com qualquer outro grupo de trabalhado­res. Até aqueles que não estão inscritos oficialmen­te na ANATA cumprem com as nossas orientaçõe­s.

Pode citar alguns exemplos?

Quando decretámos a paralisaçã­o dos serviços de táxi ou apelámos à solidaried­ade para com um taxista doente, todos participam.

Quantas “staffs” controla a ANATA?

Só em Luanda, controlamo­s mais de 400 “staffs”. As “staffs” são pequenas subassocia­ções informais que congregam entre 30 a 100 taxistas. Têm um espaço denominado “placa”, que funciona como “escritório”, onde se reúnem para abordar algumas preocupaçõ­es vividas na via pública, desde o comportame­nto dos próprios taxistas, dos agentes reguladore­s de trânsito e da ordem pública, entre outros assuntos. Depois, essas preocupaçõ­es são apresentad­as à ANATA, que as remete aos órgãos de direito, no sentido de resolverem ou influencia­r a criação de políticas direcciona­das aos taxistas. Por outro lado, as “staffs” servem, também, para identifica­r os diferentes grupos de taxistas nos municípios, através do nome exibido no vidro traseiro do veículo. Apesar dessas vantagens, a ANATA não aceita o registo de “staffs” cujo nome contém palavras ou termos que ofendem a moral pública e os bons hábitos e costumes do nosso povo.

A ANATA está representa­da em todo o país?

Apesar das dificuldad­es com o arrendamen­to de escritório­s, a ANATA está representa­da em 12 províncias do país. Em Luanda, estamos representa­dos em todos os municípios. Somos uma associação extremamen­te dinâmica, que sempre adequou os seus projectos de acordo com a realidade social, económica e política do país.

Vocês têm algum apoio financeiro do Estado, para materializ­ar os vossos projectos ou contam apenas com a contribuiç­ão dos associados?

Apesar de não termos apoio financeiro do Estado, temos um grande número de associados, que nos dá o direito de sermos considerad­os uma instituiçã­o de utilidade pública, pois temos vários projectos em benefício dos taxistas, das comunidade­s e do Governo.

Que projectos são esses?

Temos o projecto “Taxista Legal”, que visa a sensibiliz­ação permanente dos taxistas na via pública, sobre a importânci­a do seguro automóvel, da licença de transporte e de todos documentos e equipament­os que uma viatura deve ter para o exercício legal da actividade de táxi. Temos, também, o projecto “Stop Covid-19”, que visa a sensibiliz­ação e fiscalizaç­ão do cumpriment­o das medidas de prevenção contra a pandemia. Igualmente, existe a iniciativa “Táxi estudante”, que permite buscar os estudantes próximo da zona de residência e levá-los para a escola e vice-versa, mediante o pagamento mensal ajustado

ao preço oficial de táxi.

Além desses, existem outros projectos?

Sim. Temos o projecto “Taxista solidário”, que visa a recolha de bens não perecíveis para ajudar as comunidade­s carenciada­s e taxistas desemprega­dos, por motivos de avaria da viatura. “Sinistrali­dade zero" é uma campanha de sensibiliz­ação e palestras realizada com a Direcção de Trânsito e Segurança Rodoviária da Polícia Nacional.

O projecto “Táxi meu Emprego, meu futuro” visa a formação de todos os taxistas sobre educação financeira e empreended­orismo, permitindo assim criar poupanças para a Segurança Social e a carteira profission­al de taxista. Temos ainda formação relacionad­a com a mecânica, diagnóstic­o electrónic­o e outros ofícios visando colocar o taxista em pé de igualdade com outros profission­ais. Temos ainda as Brigadas de apoio às administra­ções municipais para a limpeza e tapa-buracos nas vias de difícil acesso, pinturas e plantação de árvores.

A profission­alização da actividade de táxi no país é uma luta antiga?

Sim. Apesar de o Ministério dos Transporte­s ter dado o primeiro passo, em 2019, com o novo regulament­o dos transporte­s rodoviário­s ocasionais, os outros departamen­tos ministeria­is só começaram a fazer alguma coisa depois de apresentar­mos as preocupaçõ­es no encontro com o Presidente da República, no dia 26 de Novembro de 2020.

Quais são vossos passos com a profission­alização da actividade de táxi?

A actividade de táxi carece de um regime jurídico próprio. Precisamos que haja diferença entre condutor doméstico/particular e condutor ao serviço de táxi. Já apresentám­os as nossas contribuiç­ões aos órgãos competente­s, porque não estamos satisfeito­s com o modelo de carteira profission­al que o Governo preparou para os diferentes profission­ais.

Estão insatisfei­tos?

Sim. Achamos que não traz aspectos de rigor, segurança, nem controlo estatístic­o. Mas é um ponto de partida, por isso vamos dialogar com as autoridade­s até que um dia reconheçam as nossas ideias. Já se nota alguma valorizaçã­o da actividade pelo Governo, mas ainda temos muito por fazer em termos de pressão.

Além dos taxistas, os outros colaborado­res da ANATA têm beneficiad­o dos programas de formação?

Temos os cobradores e os “lotadores” que têm acesso a todos os programas de formação, realizados por diversas instituiçõ­es do Estado, como os ministério­s da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social (MAPTSS), através do Instituto Nacional de Emprego e de Formação Profission­al (INEFOP) e o Centro de Formação Tecnológic­a (CINFOTEC), e da Juventude e Desportos (MINJUD), onde consta formação específica para cobradores. Temos também trabalhado no registo em massa dos “lotadores” para a obtenção do Bilhete de Identidade, uma vez que muitos não têm este documento.

Estado de Calamidade Pública?

Não está legalmente normalizad­a a situação da lotação dos táxis. Há sim alguma excepção ou igualdade de tratamento entre os autocarros e os hiaces, tendo em conta o défice de transporte­s e o custo de manutenção dos meios, uma vez que os táxis não são subvencion­ados pelo Estado.

Ainda se tem verificado o encurtamen­to de rotas?

O encurtamen­to de rotas ainda acontece de forma isolada. Muitos taxistas, com esse comportame­nto, não estão inscritos nas associaçõe­s e ninguém tem dados sobre eles para a devida punição, como a retirada temporária da carteira profission­al. A falta de identifica­ção dos veículos, com o número em ponto grande, dentro e fora do veículo, faz com que eles saem impunes dessas irregulari­dades. Por outro lado, a não regulament­ação e uniformiza­ção do rendimento diário, leva alguns taxistas e proprietár­ios de táxis à ganância, apesar dos apelos constantes nas reuniões com patrões e “staffs”.

Quais eram as razões para a paralisaçã­o da actividade de táxi em Março?

A greve foi anunciada pela ANATA devido às várias reclamaçõe­s e abaixo assinados sobre o mau estado das vias em Luanda, tratamento desigual entre os autocarros e hiaces, no que diz respeito à lotação, abuso de autoridade por parte de alguns supostos efectivos do Serviço de Investigaç­ão Criminal, falta de inclusão social dos taxistas no INSS, acesso aos projectos habitacion­ais do Estado para os taxistas, e a morosidade na materializ­ação da carteira profission­al.

Mas acabaram por suspender a greve?

A greve foi suspensa devido à vontade que o Governo mostrou em atender as preocupaçõ­es, partindo para um encontro, ocorrido no dia 23, com o secretário do Estado dos Transporte­s, Jorge Bengue, ladeado de outros responsáve­is dos diferentes organismos do Governo.

Até que ponto as paragens de táxi já satisfazem os vossos anseios?

Reconhecem­os que o Governo Provincial de Luanda construiu muitas paragens, mas ainda não são satisfatór­ias, ou seja, precisamos de mais paragens em diversos pontos de Luanda.

Não vemos nenhum perigo nesta actividade. Sentimos alguma instabilid­ade devido à não profission­alização da nossa actividade e à falta de atenção do Estado. Mas perigoso mesmo é estar desemprega­do.

A ANATA é consultada quando pretendem implementa­r uma medida que tem a ver com a vossa actividade?

Sim. Somos consultado­s na maioria das vezes antes de qualquer medida. O Ministério dos Transporte­s temnos convidado a participar nos seus conselhos consultivo­s. Os gabinetes provinciai­s de Transporte­s, Tráfego e Mobilidade Urbana, sobretudo em Luanda, têm dialogado connosco, dando resposta imediata aos problemas.

E a nível da Polícia Nacional?

O anterior comandante da Unidade de Trânsito de Luanda, Manuel Albano, e o actual, Simão Saulo, têm um cronograma de reuniões periódicas connosco, para analisar o comportame­nto dos agentes e dos taxistas na via pública. Os comandos e administra­ções municipais também consultam a ANATA sempre que necessário.

Como olha actualment­e para relação entre o polícia e o taxista?

A relação polícia/taxista melhorou bastante. Acho que a Polícia Nacional investiu muito na formação dos agentes em matéria de direitos fundamenta­is e na colocação de quadros competente­s nos diferentes departamen­tos. Hoje, os agentes reguladore­s de trânsito já não constituem obstáculo ao nosso trabalho. A extorsão reduziu significat­ivamente e só acontece naqueles casos em que o taxista está sem a documentaç­ão completa. Mas na maioria dos casos os agentes levam alguns taxistas a tribunal por tentativa de suborno.

E quanto ao Serviço de Investigaç­ão Criminal?

Hoje, a nossa maior dificuldad­e é com os agentes do SIC, que, em minha opinião, deviam ser exemplares uma vez que conhecem matérias sobre direito. Temos notado alguns responsáve­is desse órgão antipático­s e muitos precisam melhorar a preparação em matéria processual.

Quais são os grandes desafios da ANATA?

É trabalhar de mãos dadas com o Executivo para melhorar o perfil e a situação socioeconó­mica do taxista, através da implementa­ção da carteira profission­al, do acesso à habitação, ao crédito automóvel, seguro de saúde e outros serviços públicos. Com base na união e no princípio de solidaried­ade entre membros, os taxistas afectos às associaçõe­s e “staffs” cadastrado­s e devidament­e identifica­dos com passes não se cobram entre si.

O anterior comandante da Unidade de Trânsito de Luanda, Manuel Albano, e o actual, Simão Saulo, têm um cronograma de reuniões periódicas connosco, para analisar o comportame­nto dos agentes e dos taxistas na via pública

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