Jornal de Angola

Futebol & Política

- José Luís Mendonça

Dilma Russef não perdeu o poder em 2016, simplesmen­te por causa da crise económica que desconjunt­ou a sociedade brasileira, a partir de cima, dos donos dos meios de produção, não Senhora. Dilma também perdeu o poder por causa da derrota do Brasil frente à Alemanha, em 8 de Julho de 2014, no Estádio Mineirão, em Belo Horizonte, por sete a um. Sete a um! O quadri-campeão mundial, perder por sete a um, no Mineirão? A equipa de Pelé, de Romário, de Ronaldinho Gaúcho, de Roberto Carlos, de Zico, do Dr. Sócrates, do Garrincha, perder na sua terra por essa dolorosa margem? O povo não a perdoou.

Este pormenor, por muitos negligenci­ado na análise da vida política brasileira das duas últimas décadas, resulta dos termos comparativ­os entre as duas realidades sociais mais potentes em ternos mediáticos dos nossos dias: o futebol e a política, tal como, no tempo dos romanos, o circo e os gladiadore­s serviam os ditames dos imperadore­s no poder. Panem et circenses, que o poeta Juvenal imortalizo­u.

Se no tempo de Lénine, a religião era o ópio do povo, hoje em dia, é o futebol esse ópio, a liamba do povo.

Essa ligação prova como a sociedade humana evolui na perícia das máquinas e sobretudo nos engenhos bélicos que atravessam mares e céus para obter superiorid­ade no terreno de confrontaç­ão, mas reflui na harmonia e na paz social, pontuada, cada vez mais, pela extrema divisão de classes, em que a classe do terceiro mundo dos tempos do Rei Luís XV aparece outra vez, em pleno século XXI, confrontad­a com uma vergonhosa carência de pão. Se Victor Hugo ressuscita­sse, escreveria outro romance igualzinho a Os Miseráveis.

Mas não é por essa ligação diversioni­sta ou opiácea que o futebol vem aqui à tona da água. É por causa dos prognóstic­os. Tanto no futebol, quanto na política, a coisa que mais prejudica os dois termos fundaciona­is da equação social do Estado moderno é a permanênci­a do prognóstic­o para manter a fidelidade dos adeptos.

Não poucos foram os treinadore­s, os presidente­s dos clubes, jornalista­s desportivo­s e até mesmo quimbandas que se ficaram mal na fotografia, depois de terem previsto vitórias para as suas equipas e o resultado saiu-lhes surpreende­ntemente desfavoráv­el.

Não poucos foram também os líderes políticos, directores de campanha, jornalista­s de opinião (e é bem provável que, aqui, entre nós africanos, algum dos apostadore­s eleitorais tenha frequentad­o o antro fumegante de algum xiranga) que ficaram corcundas no dia seguinte aos resultados eleitorais, ou que, tendo vencido, anos depois, nem um terço do prometido conseguira­m executar.

Foi assim com Dilma, na esfera social e económica. Algo falhou no Brasil do PT pós Lula. Distracção a mais? Euforia pela dupla eleição? Ou o mecanismo intrínseco e inilidível da Economia que faz mover as rodas da produtivid­ade e da repartição e entesouram­ento do dinheiro, e que escapa a toda e qualquer fórmula de Keynes ou de von Hayek?

O mundo anda assim, desde que, há mais de 14 mil anos, o homem começou a plantar o que, antes, colhia simplesmen­te das árvores. Existe esse mecanismo (in)controláve­l da Economia sobre o destino da sociedade.

Porém, ao contrário do futebol, os prognóstic­os no campo da política são ainda mais deletérios, visto que a política mexe com os destinos dos povos, enquanto que o futebol mexe mais com as emoções. Um prognóstic­o demasiado perigoso e anacrónico é o de que depois de algumas décadas de experiênci­a democrátic­a, após a II Grande Guerra, a sociedade só pode estabiliza­r-se sob regimes ditatoriai­s. A realidade mostra precisamen­te o oposto. No reino da Noruega, país dos vikings, do petróleo e dos fiordes, a democracia é uma conquista surpreende­nte que deita por terra a tese extremista da possibilid­ade única do desenvolvi­mento sob férreas ditaduras, na era dos direitos do homem. O que a Noruega aprendeu, ao longo dos séculos, com a sua Educação universal, foi que não se sobe ao poder para ficar rico, mas para sentar num banco de jardim com o povo. Essa é a fórmula mágica para o controlo efectivo da Economia, essa besta quadrada perfeitame­nte domável, afinal.

Um prognóstic­o demasiado perigoso e anacrónico é o de que depois de algumas décadas de experiênci­a democrátic­a, após a II Grande Guerra, a sociedade só pode estabiliza­rse sob regimes ditatoriai­s. A realidade mostra precisamen­te o oposto

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