O primeiro “blockbuster”
Como é óbvio,
nada disto aconteceu apenas através de impulsos nostálgicos. Num dos cartazes da época, Indiana Jones era anunciado como “o novo herói dos criadores de Tubarão e Star Wars”. Que é como quem diz: Spielberg e George Lucas, numa aliança que redefiniu valores e práticas de toda uma estrutura industrial.
Importa, aliás, não esquecer que o “inventor” da personagem do Dr. Henry Walton Jones Jr., mais conhecido como Indiana Jones, não foi Spielberg, mas Lucas. Como o próprio recordou em diversas entrevistas, a sua “aventura espacial” surgiu em paralelo com a ideia de um arqueólogo aventureiro, envolvido na procura de uma “arca” ligada a “poderes sobrenaturais”. O inesperado mega-sucesso de Star Wars, estreado em 1977 (com o título português A Guerra das Estrelas), levou-o a dedicar-se por inteiro à saga galática, oferecendo o projecto de Indiana Jones ao seu amigo Spielberg.
Com Tubarão, lançado em 1975, Spielberg contribuíra decisivamente para uma nova dinâmica, temática e industrial. Tradicionalmente apontado como o primeiro “blockbuster” da era moderna, Tubarão não se distinguiu apenas pelas singularidades do seu conceito de espectáculo, narrando uma história em que, definitivamente, a mãe Natureza perdeu qualquer carácter idílico; o filme desempenhou também um papel determinante na reconversão das regras de difusão dos filmes nas salas.
Até aí, no mercado norteamericano (EUA + Canadá), mas também nos mercados de menor dimensão, cada filme cumpria um tempo de vida comercial mais ou menos dilatado. O lançamento de um determinado título em salas de Nova Iorque e Los Angeles podia ocorrer algumas semanas, ou meses, antes da sua exibição noutras cidades e regiões do país. Com Tubarão tudo mudou: foi espectacularmente alargado o número de salas em simultâneo (mais de mil, situação invulgar na época), mudando a própria lógica de rentabilização - visavam-se mais receitas em menos tempo. Os resultados comerciais foram grandiosos: Os Salteadores da Arca Perdida acabaria por ser o filme mais rentável de 1981, quase duplicando as receitas de A Casa do Lago, nº 2 do top.
A presença de A Casa do Lago nesta memória de 1981 é bem reveladora das convulsões e contradições que Hollywood estava a atravessar. Coexistiam, de facto, duas matrizes de “entertainment”: se o primeiro capítulo das aventuras de Indiana Jones ilustrava o triunfo de toda uma nova geração de criadores, A Casa do Lago, drama familiar protagonizado por Katharine Hepburn e Henry Fonda, surgia como um objecto ainda ligado a modelos narrativos tradicionais.
Dir-se-ia que Spielberg e Lucas relançaram o espírito dos “serials” e das aventuras que os apaixonaram enquanto crianças e adolescentes, mas agora com a sofisticação técnica de um cinema de recursos financeiros incomparavelmente superiores. Na prática, Spielberg dirigiu três sequelas: Indiana Jones e o Templo Perdido (1984), Indiana Jones e a Grande Cruzada (1989) e Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal (2008).