O rosto do mascarado não deve ser revelado
Segundo Jack Tchindje, na tradicão bantu a imagem do indivíduo sempre esteve relacionada com o sincretismo religioso tradicional, conhecido também como “animismo”. O antropólogo revelou que os indivíduos que se dedicam à execução de danças tradicionais acompanhadas de rituais e que se revestem de máscaras e indumentárias tradicionais, à semelhança dos conhecidos Bakamas de Cabinda, Cikumza da região leste, Cikumgu das Lundas Norte e Sul e Cihamzi da região centro e sul do país, obedecem a regras secretas que determinam que ao longo do seu sacerdócio não devem revelar os “seus rostos” às pessoas fora do referido sincretismo.
“Pode ser conhecido em outras vertentes, mas não como dançarino. A preparação e entrada para a indumentária é feita fora dos olhares de pessoas estranhas aos segredos e ao revestirse da máscara o indivíduo desassocia-se espiritualmente do mundo terreno e incorpora o mundo espiritual”, referiu, acrescentando que ao longo da exibição de danças ou a execução de rituais é tido simbolicamente como um indivíduo morto, ascendendo à dimensão espiritual.
Objectos alvo de adoração
O antropólogo contou ainda que em algumas famílias de ambundos, quando nascem, os bebés gingongo são revestidos de amuletos com imagens simbolizando os “santos protectores” das crianças e da família. Explicou que, segundo a tradição, os santos da família podem trazer bênção (sorte) ou maldição (azar) e para evitar as maldições constrói-se um santuário conhecido por Kapela, ou mais vulgarmente “Santo ya Kazola”, que em português significa “santos de casa ou de família”, onde são colocadas as figuras com as imagens dos amuletos dos gingongo, que passam a ser veneradas de acordo com a tradição. “O ritual da kapela existe antes da chegada dos portugueses em Angola, e é uma prática de cultuação aos espíritos dos ancestrais e outras divindades que actuam no campo do sincretismo nas religiões tradicionais. “Já naquela época nas sanzalas ou cidades cada família tinha uma kapela, que por norma era colocada embaixo da cama ou atrás das casas”, disse.
Jack Tchindje revelou que em algumas zonas da província de Cabinda, quando um membro da família está acometido de alguma doença, são feitas figuras com a imagem do problema, que serve para rezas até a cura. Em caso da mordida por um animal, como serpente ou um outro animal, cria-se uma figura com a imagem do animal com a finalidade de se exercer as preces para cura.
No caso de conflitos entre duas pessoas, para resolução do caso cria-se uma figura denominada “tampa proverbial”, com a imagem do problema, que serve como elemento de comunicação entre os contendores. Para se reatar a relação de um casal separado é esculpida a figura “tampa proverbial” com a imagem de uma caixa fechada, que é colocada na roda de uma sentada familiar, onde é decifrada a razão do problema, fazendo-se entender que “não se descobre o que um sente, sem que o outro se manifeste”.