As Gingas estremecem Show do Mês
As Gingas do Maculusso abrilhantaram na semana passada o Show do Mês Live Hospitality, para gáudio dos inúmeros fãs de todas as gerações e dos amantes da música angolana espalhados por toda Angola e pelo Mundo. Rosa Roque, a mentora e dinamizadora da banda, foi alvo de uma estrondosa e merecidíssima homenagem em palco
O Rei da Música Angolana Elias dya Kimuezo não quis ficar de parte e, num gesto pleno de simbolismo, como que a passar o testemunho para uma geração mais nova, cantou a sua canção “Ressurreição” com Gersy, Paula e Josina. Foi também notável o regresso ao palco de Daniela Pegado, depois da sua estreia no Show Piô. Desta vez ela apareceu com a nova Classe de Crianças da Professora Rosa Roque, proporcionando recuos nostálgicos de memória no público mais adulto. Canções das Gingas na idade infantil, como “Mangonha” e “Roda de Aço” na voz das crianças de hoje tiveram o condão de estabelecer um fio de continuidade geracional de que tanto a nossa cultura precisa. Jojó Gouveia abalou os alicerces emocionais da Professora Rosa Roque, como ela própria o confessou a este jornal, ao interpretar “Minha Terra, Minha Infância”. Houve ainda uma espécie de carnaval fora de época quando “Dizanda” foi executada com a presença de uma ala do campeoníssimo União Mundo da Ilha.
Salú Gonçalves teve a companhia de Tony Sofrimento e Maneco Vieira Dias num painel complementado pela Professora Rosa Roque. Tony Sofrimento, mais uma vez, demonstrou que não é um homem apenas do basquetebol. Maneco Vieira Dias, dentre outros pontos, destacou a relação que As Gingas sempre tiveram com o Ballet Kilandukilo. Para quem não sabia, os dois grupos nasceram no Maculusso. (“Nós, os do Makulusu”, diria certamente a propósito o escritor Luandino Vieira...).
Kappa D reproduziu o que Carlitos Chiemba fez no baixo, assim como a dupla de guitarristas William Kito e Sankara o fizeram com as criações de Betinho Feijó; e Benny pegou nas harmonias de Don Lanterna no teclados. Jack bebeu do próprio Lito Graça, que, em alguns temas, trocou a dikanza pela bateria, assim como Alexandre pôs-se nas vestes de Chalana Dantas na percussão. Todos eles executaram o que o Semba Masters produziu para As Gingas. O trio de coristas Raquel Lisboa, Neide da Luz e Sultrana não resistiu ao apelo da rítmica e também dançou. A secção de sopros com Lázaro, Magnio, Chinguma, Luís Vasco e Rigoberto, assim como a das cordas com Du Porto, Augusto
e Paulo não tiveram o trabalho facilitado.
Nicinha Rocha, Reginaldo Silva e Ismael Mateus estiveram na linha da frente dos entusiastas. Nicinha Rocha já actuou no Show do Mês como cantora. Aliás, ela é contemporânea das Gingas do Maculusso e, tal como estas, fez parte do movimento da canção infantil dinamizado pela Rádio Nacional de Angola. Os jornalistas Reginaldo Silva e Ismael Mateus são habitués na plateia do Show do Mês, remontando a sua relação com As Gingas e a Professora Rosa Roque ao tempo em que ambos eram funcionários da RNA, quando quase tudo em matéria de música infantil tinha como ponto de partida os estúdios da Rádio-mãe.
A ausência de Patrícia Faria, a par de Gersy Pegado a mais mediática das ex-integrantes da Gingas, suscitou comprensíveis interrogações do público, que se adensaram pela falta de uma explicação oficial. O Jornal de Angola durante e após o concerto procurou obter um pronunciamento das partes mas não obteve sucesso. Também não se fizeram presentes Maria João, que há alguns anos se retirou dos palcos por razões religiosas, e Celma Miguel, que participou no reencontro da banda no Live do Kubico da TPA em Agosto do ano passado.
Um pouco de história
As Gingas surgiram como um grupo infantil em 1982. Com muito sucesso, fizeram a transposição para uma formação juvenil, que, de certa forma, revolucionou a música angolana, com enfoque para o Semba. Elas são o exemplo de uma “girl band” bem mwangolê. Têm as seguintes obras discográficas: “Mbanza Luanda”, “Malanje, Natureza e Ritmos”, “Xiyame”, “Muenhu” e “Luachimo”.
Rosa Roque, Prémio Nacional da Cultura e Artes em 2020, dinamizadora e agitadora cultural, literalmente a Mãe das Gingas, é autora de um livro que aborda o percurso da banda. Paralelamente, mas sempre conectada com as meninas, hoje senhoras do Maculusso, Rosa Roque desenvolveu o projecto “Avilupa Kuimbila”, de que resultaram as obras discográficas “Ndolo”, “Estrelas Dispersas”, “Pérola Azul” e “Brincadeira Azul”, todas dedicadas à canção infantil. Realizou o projecto Restauro Musical, dedicado ao resgate de clássicos e ao encontro de gerações da música angolana.
Há sim muitas estrelas dispersas. Trabalhei num punhado de projectos envolvendo centenas de crianças, que, por razões que não interessa aqui explanar, foram sendo interrompidos. Com isso muitos potenciais artistas tiveram um desvio antecipado de rota, mas felizmente beberam o sentido do multifacetismo, da alegria, da disciplina e da busca do sucesso. Foi particularmente prazeroso ver ressurgir o Jojó Gouveia na senda musical, já maduro. Vê-lo no Live das Gingas naquela cançãozinha foi... ah foi impiedoso!
Teremos mais Gingas do Maculusso?
As Gingas são indissociáveis da música Rosa Roque. Gostaria que a sociedade lhes retribuísse por isso, sempre, dentro ou fora dos palcos. Adquiram uma colectânea das Gingas e têlas-ão para sempre com as suas lindas vozes. Enquanto profissionais no activo, vamos experimentando conforme a importância da circunstância, desde o Live TPA, passando pela ZAP. Registo uma harmonia e entrega crescentes. O impacto da última performance foi enorme, arrebatador. Então vamos ver, ainda temos compromissos assumidos com o público que ama as Gingas for ever.
Depois de tanto tempo aceitou o convite da Nova Energia. Que avaliação faz do Show do Mês?
Não se proporcionou antes, talvez porque não foi falado profundamente ou simplesmente porque o Yuri Simão deve ter-me chateado. E porque cada coisa tem o seu tempo, o tempo foi este e não podia ser melhor, quanto mais não seja por termos muitos de nós sobrevivido a esta terrível pandemia que tanta gente amiga e conhecida levou. Mais uma desavença entre Nova Energia e Rosa Roque seria um verdadeiro desastre cultural, porque como sabe nem sempre há união e colaboração entre artistas ou entre estes e promotores. Portanto seria muito mau. A Nova Energia tem uma força, uma energia, um comprometimento profundo com a música angolana de raiz sobretudo. Deu visibilidade, dignidade e arquivo de qualidade a todos os bons artistas que estavam praticamente no anonimato. Eles merecem o nosso respeito e apoio. Estarei pois eternamente grata a toda a equipa e ao Yuri Simão pelo momento tão feliz que me proporcionaram.