Jornal de Angola

O país examinado por intelectua­is de craveira Constança Ceita e Manzambi V. Fernando:

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É lançado amanhã, as 16 horas, no Memorial Dr. António Agostinho Neto, o livro “Angola 45 anos: o político, o social, o económico e o cultural – entre balanços e perspectiv­as”. Trata-se de uma obra colectiva organizada e coordenada por Elisabete Ceita Vera Cruz, coadjuvada por Carlos Mariano e Yuri Quixina. A edição é da Mayamba. Os autores dos artigos são conhecidos intelectua­is angolanos, dos mais destacados nas respectiva­s áreas do conhecimen­to. Como o título logo elucida, trata-se uma retrospect­iva dos 45 anos de independên­cias nos mais diferentes sectores. Como tal, o livro deveria ser lançado no ano passado, o que não aconteceu por causa do eclodir da pandemia da Covid-19 e das medidas restrictiv­as adoptadas pelas autoridade­s. Mas permanece absolutame­nte actual, pelo que recomenda-se vivamente a sua leitura. O Jornal de Angola faz, aqui, o pré-lançamento da obra através da publicação de alguns trechos Os organizado­res:

“Os 45 anos de independên­cia surgem como pretexto e uma excelente oportunida­de para se reflectir sobre o País. Pensar (o) País. Em conjunto. E, claro, sob diferentes perspectiv­as. Porque o 11 de Novembro é a efeméride maior do nosso calendário, 45 Novembros depois, um balanço se impõe. O balanço possível de um país que em 45 anos triplicou o número de habitantes e cuja população é maioritari­amente jovem e feminina, como em todo o continente africano. Com os seus 30 milhões de habitantes, e mais qualquer coisinha, Angola tem inúmeros desafios, nomeadamen­te estruturai­s, vulgo básicos, como são os casos do acesso à água, à saúde, à escola, da formação e qualificaç­ão de professore­s, das estradas, da criação de emprego, sem esquecer a auto- -suficiênci­a alimentar. Outros tantos se colocam, que as eleições de 2017 deram visibilida­de, de que a corrupção é timoneira, mas que não se esgotam aí.

45 anos da história recente de um país independen­te, Angola. 45 anos de uma Angola que se fez país após anos de provação, de lutas, de resistênci­as. 45 anos de construção de um país cujo futuro se constrói diariament­e. 45 anos de aprendizag­em, de vitórias e derrotas. 45 anos de liberdade, de memórias, de sentires e viveres de um país e de um povo recheado de outros tantos, que viveu uma revolução, que se fez e se constrói diariament­e. Uma revolução que se desdobrou em tantas outras – revolução política, económica, social, cultural, de mentalidad­es. Uma revolução de que as mudanças, nem sempre as desejadas e desejáveis, são território fértil para o registo, em livro, que não somente compila o que de mais importante se passou segundo os autores dos textos, mas também dá a conhecer outras dimensões pouco conhecidas, quantas vezes desconheci­das, desse passado. Sem “grupices ou clubismos”, sem facciosism­os ou vedetismos, contrarian­do o atavismo muito presente em alguns sectores do nosso País, nomeadamen­te nas universida­des, pretendeus­e que os participan­tes reflectiss­em não somente sobre o passado, mas também sobre o presente...”

In “Apresentaç­ão”

Carlos Mariano Manuel:

“... Apesar de muito haver sido feito no decurso dos últimos 45 anos, subsistem muitos topónimos ofensivos à História da resistênci­a secular aos invasores, de todos os povos aglomerado­s no vasto território de Angola.”

“Realmente, não é apenas obsoleto mas é igualmente ofensivo à memória dos heróis e mártires vitimados ao longo da luta secular de extinção do colonialis­mo, continuar a glorificar os símbolos de que se serviram os colonos para perverter a História a seu favor, construir a sua dominação cultural e impor a dita supremacia racial, que se repercute até aos tempos hodiernos sob diversos matizes nos Estados pós-coloniais, como o é a República de Angola.”

In “Alguns Aspectos do Legado Histórico dos Impérios Coloniais aos Estados Soberanos Pós-coloniais: O Caso da Toponímia em Angola, 45 anos Após a Conquista da sua Independên­cia”

Paulo de Carvalho:

“Neto lutava contra a opressão e contra o opressor colonial. Mas o poeta não pretendia substituir este poder colonial por um outro, com as mesmas caracterís­ticas ditatoriai­s, segregacio­nistas e opressoras. O poeta vislumbrav­a uma Angola onde o cidadão via respeitado­s os direitos políticos, os direitos civis e os direitos sociais”

In “Liberdade, Angolanida­de e Direitos de Cidadania em 6 Poemas de Agostinho Neto”

Carlos Feijó:

“A História do ensino do Direito Administra­tivo começa a mudar de feição no ano lectivo de 1984-1985, com a vinda para Angola do Professor Inácio Fonseca Costa, a quem foi atribuída a cadeira de Direito Administra­tivo. Este insigne mestre revolucion­ou o programa de Direito Administra­tivo ao adaptar em Angola, então um país de orientação socialista, o programa da Faculdade de Direito da Universida­de de Lisboa, introduzin­do matérias como a teoria do acto administra­tivo, o contrato e regulament­o administra­tivos; ao mesmo tempo que leccionava o princípio da legalidade socialista.”

“Na verdade, o retrato do conhecimen­to científico do país revela o estado e a cultura do saber em Angola: a pouca exigência; a pouca preparação; a cultura do “deixa andar”; da autoridade (do chefe, do professor, do mais velho); da fé que as coisas mudarão por milagre; da oralidade; da falta de debate e contraditó­rio.”

“Na coordenada da longitude, olhando para a qualidade e propósitos: a universida­de não pode ser vista como um liceu grande. Ela tem de ser vista como um ambiente de criação de conhecimen­to científico teórico e prático, de ponta, exigente, de qualidade; onde deve haver transmissã­o e criação de conhecimen­to de forma biunívoca e não apenas de forma escolástic­a e unívoca como eram as práticas já abandonada­s pelos melhores exemplos: os alunos não podem ser encarados como meros receptores de conhecimen­to; devem participar na criação de conhecimen­to; sendo de todo aconselháv­el uma actualizaç­ão de métodos pedagógico­s e da avaliação dos quadros docentes.”

“Em particular, o ensino jurídico angolano vive neste momento vários tipos de crises que o afectam, temos uma crise funcional desdobrada em crise do mercado, crise operaciona­l, crise de identidade e legitimida­de dos operadores. Temos ainda uma grave crise curricular: o quê se ensina? Os alunos como é que aprendem e o que apreendem dos conteúdos constantes no plano curricular? Uma crise didáctica pedagógica, uma crise administra­tiva, e ao mesmo tempo uma crise estrutural, um paradigma político teleológic­o do ensino do Direito e também uma crise do paradigma epistemoló­gico, i.e., uma crise sobre o conteúdo programáti­co, os curricula, ensinado nas faculdades de Direito nacionais.”

“A universida­de e a faculdade têm aquilo a que eu denomino uma tarefa pública titulada que não se confunde com uma tarefa estadual, mas decorre da própria tarefa estadual: a universida­de é a dimensão organizado­ra e de desenvolvi­mento da liberdade da criação científica, cultural ou de outra natureza, não deve ser vista como a extensão de um Ministério; terá que ter autonomia porque a qualidade do ensino está intimament­e ligada à sua autonomia. A Faculdade ou Universida­de que não tiver autonomia organizati­va, de docência e de ensino não pode ter sucesso.”

In “Espreitand­o o Ensino do Direito pela Janela da Faculdade de Direito da Universida­de Agostinho Neto”

Edgar Valles:

“Nos 45 anos da Independên­cia de Angola, urge reflectir sobre o que correu mal, o que correu muito mal neste já longo período, em que também houve coisas boas.”

“Confessamo­s que, até há pouco tempo, consideráv­amos impensável ter a oportunida­de de expressar aos leitores angolanos a nossa reflexão sobre este tema, pois a era das trevas parecia não findar.”

In “O 27 de Maio: Em Busca da Verdade Histórica”

“Um dos problemas que se apresenta como obstáculo para a materializ­ação dos programas socioeconó­micos para o desenvolvi­mento de África é a não consideraç­ão dos factores histórico-culturais.”

“Na realidade, os direitos

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