Jornal de Angola

MPLA: ampla escola de resiliênci­a

- António Quino |*

Os históricos nacionalis­tas angolanos Viriato Clemente da Cruz e António Agostinho Neto inaugurara­m, na Angola idealizada pelos movimentos independen­tistas, as múltiplas candidatur­as num processo electivo que conduziria ao cargo de presidente do MPLA na sua primeira Conferênci­a Nacional, no longínquo Dezembro de 1962

Em Junho de 1962, António Agostinho Neto, eleito presidente de honra do MPLA meses antes, parte clandestin­amente de Portugal para Marrocos e, de lá, em Julho, para Léopoldvil­le (Kinshasa), onde o MPLA tinha a sua sede exterior. Chegou e impôs-se, naturalmen­te, como sendo aquele por quem se espera, para liderar a luta pela realização do programa maior do MPLA: a independên­cia imediata e completa.

Perante fortes divergênci­as entre dois importante­s pilares do movimento, Viriato da Cruz e Agostinho Neto, em Dezembro de 1962, na então Léopoldvil­le, acontece a Primeira Conferênci­a Nacional do MPLA. Os quadros reuniram-se a fim de, entre outros fins, definir os princípios de orientação da política de luta anti-colonial e das políticas de alianças, não só entre os movimentos nacionalis­tas, como também as alianças exteriores. Também iriam eleger o futuro presidente do MPLA.

Concorrera­m duas listas. Uma liderada por Viriato da Cruz e outra por António Agostinho Neto. A disputa foi renhida, tendo ambos exercitado a liberdade política e o pluralismo de ideias. Nesse despique, o finado Edmundo Rocha, histórico militante do MPLA, investigad­or, nacionalis­ta e médico angolano, numa entrevista que me concedeu em Maio de 2011, lembrou que Agostinho Neto tinha algumas vantagens sobre Viriato da Cruz: Neto era o Presidente de honra do MPLA, era médico, poeta e negro.

Uma parte importante dos quadros apoiou Agostinho Neto, como Lúcio Lara, reverendo Domingos da Silva, Manuel Lima, Mário Pinto de Andrade, Aníbal de Melo, Deolinda Rodrigues, Desidério Costa e “Iko” Carreira. Alinharam com Viriato da Cruz muitos daqueles que com ele militaram em Luanda, como o Matias Miguéis, João Bernardo Domingos, George Manteya Freitas, José Miguel e António Alexandre.

De concreto, entre Julho e Dezembro 1962, Agostinho Neto afirma-se e sai eleito democratic­amente da Primeira Conferênci­a Nacional do MPLA como líder incontesta­do. Claro que ficou vincada a cisão entre o então Comité Director saído da Primeira Conferênci­a Nacional, liderada pelo poeta presidente, e a Assembleia Nacional Soberana, criação do ideólogo do movimento.

Com a primeira Conferênci­a Nacional do MPLA, de 1962, a história serviu-nos a mesa dois factos. Por um lado, a evidência da pioneira democracia interna no seio de um movimento político tão multiplame­nte unido; diverso em ideias e unificado nos ideais. Por outro, a sua natureza de transforma­r as suas crises internas em pilares de betão armado, blindagem para o seu fortalecim­ento.

O MPLA deve continuar a congratula­r-se pelas distintas experiênci­as na transição de liderança, nomeadamen­te por Mário Pinto de Andrade abrir caminho para as múltiplas candidatur­as (Viriato da Cruz e Agostinho Neto), por morte do presidente em exercício (ascensão de José Eduardo do Santos, presidente emérito do partido), e a interrupçã­o de mandato por vontade do candidato eleito por maioria absoluta (ascensão do presidente João Lourenço). Em todos esses momentos de transição, o MPLA soube sempre vincar a sua marcha triunfante com as novas lideranças. Assim está a ser, hoje, com o presidente João Lourenço.

A inauguraçã­o entre nós, pelo MPLA, de múltiplas candidatur­as para o cargo de presidente e a promoção dos princípios democrátic­os universais estão devidament­e salvaguard­ados nos Estatutos do MPLA.

No seu Artº 11, os Estatutos defendem a liberdade de candidatur­as a qualquer órgão individual ou colegial representa­tivo, a todos os níveis da estrutura do MPLA, o que verificamo­s com o exemplo apresentad­o por Viriato da Cruz e Agostinho Neto.

De igual modo, referente às regras de democracia interna, está determinad­o a prática da liberdade de debates, de expressão de ideias e de apresentaç­ão de propostas nas estruturas que constituem a base sobre a qual se assenta a democracia no seio do MPLA. Ou seja, Viriato da Cruz e Agostinho Neto primaram pela liberdade de discussão e aceitação do pluralismo de opiniões no MPLA.

Também, os Estatutos do MPLA defendem o respeito aos princípios da democracia interna e a colaboraçã­o na defesa e na consolidaç­ão da sua unidade de acção e da coesão interna, bem como a contribuiç­ão militante do reforço da unidade e da coesão de todo o povo angolano, de Cabinda ao Cunene e do mar ao leste, como garantia fundamenta­l da unidade nacional.

São princípios e valores que desafiam organizaçõ­es políticas como o MPLA a evitarem a polarizaçã­o afectiva, a respeitare­m e a considerar­em a divergênci­a de opiniões, por mais díspares que elas sejam, como união de vozes dialogante­s, e não monólogo.

O VIII Congresso Ordinário é, também, uma resposta a esse desafio, pois pugna por uma Angola mais democrátic­a, desenvolvi­da e inclusiva, traduzindo o Programa Mínimo do MPLA. Embandeira­r vitórias, obstáculos e desafios, assumir o mel e o fel só demonstra o quanto o MPLA se temperou.

Por Angola e pelos angolanos é o que sempre conduziu o MPLA nos seus programas e acções; para resolver os problemas do povo continua a ser seu foco. E o presidente João Lourenço tem sabido encarnar a materializ­ação desta aspiração do povo angolano.

* António Quino é professor e director do Departamen­to de Informação e Propaganda do Comité Central do MPLA

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